Após ação de "terrorista de MS", STF decidirá se corte de cabelo fere religião
Questionamento partiu de membro do Estado Islâmico preso em Campo Grande; decisão terá efeito em todo Brasil

O STF (Supremo Tribunal Federal) vai analisar se a imposição do corte de cabelo e barba a presos viola o direito à liberdade de crença e religião, garantido pela Constituição Federal. O caso chega à Corte por meio do RE (Recurso Extraordinário), com repercussão geral reconhecida pelo plenário virtual, ou seja, a decisão que será tomada servirá como orientação para todos os tribunais do país em casos semelhantes.
RESUMO
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O Supremo Tribunal Federal analisará se a imposição do corte de cabelo e barba a detentos viola o direito à liberdade religiosa. O caso teve origem em ação civil pública movida pela Defensoria Pública da União em favor de presos muçulmanos da Penitenciária Federal de Campo Grande. A discussão envolve Leonid El Kadre de Melo, condenado por terrorismo em 2016, e questiona a Portaria 1.191/2008 do Ministério da Justiça. O ministro Edson Fachin destacou que a decisão terá repercussão geral, servindo como orientação para todos os tribunais do país em casos similares.
A controvérsia teve origem em uma ação civil pública movida pela DPU (Defensoria Pública da União) para assegurar que detentos da Penitenciária Federal de Campo Grande que professam a fé islâmica possam manter barba e cabelo em conformidade com seus costumes religiosos. O processo cita que a recusa dos presos em aparar barba e cabelo, conforme previsto nas regras prisionais, tem levado a punições disciplinares, e sustenta que tais expressões físicas representam também parte da identidade dos internos.
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O caso envolve diretamente Leonid El Kadre de Melo, preso em 2016 durante a Operação Hashtag, deflagrada pela Polícia Federal às vésperas dos Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro. Melo foi acusado de liderar um grupo que buscava formar um braço brasileiro do grupo terrorista Estado Islâmico no Iraque e no Levante, com objetivo de praticar atos de terrorismo.
Ele foi condenado por promover e realizar atos preparatórios de terrorismo e por associação criminosa à pena de 15 anos, 10 meses e 5 dias de reclusão no presídio federal de Campo Grande. Outros seis réus receberam penas de 6 anos e 3 meses, e um foi condenado a 5 anos e 6 meses; todos, exceto Melo, já deixaram o sistema prisional.
Na ação, a DPU contesta a exigência prevista na Portaria 1.191/2008 do Ministério da Justiça, que regulamenta o processo de higienização pessoal do preso, incluindo corte de cabelo com máquina no padrão “pente 2” e raspagem da barba. A defesa argumenta que, embora nem todos os muçulmanos mantenham barba longa, há interpretações religiosas que consideram a prática uma obrigação, e que a proibição fere o artigo 5º da Constituição, que vedam a privação de direitos por motivo de crença religiosa e proíbem penas cruéis ou degradantes.
Anteriormente, o TRF-3 (Tribunal Regional Federal da 3ª Região) rejeitou o pedido da DPU, amparando-se em parecer da Fambras (Federação Nacional das Associações Muçulmanas do Brasil), segundo o qual a manutenção da barba não é obrigatória na religião islâmica, mas uma faculdade do fiel. A corte entendeu que a norma busca preservar disciplina, ordem, segurança, isonomia e higiene no ambiente prisional, e que esses valores devem ser ponderados com o direito à liberdade religiosa.
No STF, o relator, ministro Edson Fachin, destacou que a discussão ultrapassa o interesse individual dos presos de Campo Grande, alcançando relevância social e jurídica por afetar a execução penal em todo o país. Fachin afirmou que será necessário avaliar se a do Ministério da Justiça está em conformidade com a Constituição, especialmente diante do potencial conflito entre liberdade religiosa e exigências de segurança e higiene carcerária.
Ainda não há data para o julgamento de mérito. Quando for apreciado, o STF definirá tese com efeito vinculante, estabelecendo se a imposição do corte de cabelo e barba em presídios federais e estaduais configura violação à liberdade de crença e aos direitos fundamentais dos presos, ou se prevalecem as regras internas de disciplina e segurança.