Apreensão em MS expõe símbolos do "traficante-pastor" que quer "Israel" no RJ
Joias apreendidas em Campo Grande revelam referências bíblicas e militares ligadas ao poder de Peixão
Descrito por pesquisadores como um “traficante-pastor”, Peixão teve parte de sua ideologia revelada em Mato Grosso do Sul, onde joias com referências ao Estado de Israel e a figuras bíblicas foram apreendidas em Campo Grande, na última segunda-feira (8). As peças, trazidas pela família do líder do Terceiro Comando Puro, facção carioca, na rota usada para alcançar a Bolívia, expõem a mistura de fé, guerra e poder que sustenta o comando do Complexo de Israel, no Rio de Janeiro.
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Segundo o pesquisador Bruno Paes Manso, do Núcleo de Estudos da Violência da USP (Universidade de São Paulo), Peixão é descrito como um “traficante-pastor”, por unir o comando do crime organizado a um discurso religioso fundamentalista. Mesmo com mais de 70 anotações criminais, ele nunca foi preso e se tornou um dos traficantes mais poderosos e procurados do Rio de Janeiro.
Ele assumiu o controle de cinco comunidades da Zona Norte carioca e rebatizou a região como "Complexo de Israel", formada por Vigário Geral, Parada de Lucas, Cidade Alta, Cinco Bocas e Pica-Pau. Nessas áreas, impôs um domínio sustentado pela combinação de armas, culto religioso, intimidação e simbologia bíblica.
Entre os criminosos, Álvaro Malaquias é chamado de Mano Arão, em referência a Arão, irmão de Moisés. Dentro da facção, o grupo passou a ser conhecido como “Tropa do Arão”, reforçando a ideia de um exército de cunho religioso.

Segundo Bruno Paes Manso, o próprio Peixão já declarou, em áudios de WhatsApp, que se enxerga como um traficante escolhido por Deus para representar interesses divinos na Terra. Ele afirma acreditar que recebeu, em sonhos, a missão de restaurar o “reino de Israel” no Rio de Janeiro.
Religião como forma de terror e poder - De acordo com o pesquisador, Peixão transformou a religião em instrumento direto de poder territorial. Ele promove cultos para seus homens, usa pichações com salmos nos muros e dissemina a ideia de uma batalha espiritual permanente entre o bem e o mal.
Essa leitura fundamentalista da fé também embasa a perseguição a religiões de matriz africana. Terreiros foram destruídos, moradores relataram proibição do uso de branco, de terços, de imagens de santos e até controle sobre o som das missas nas ruas.
Para o pesquisador, figuras como Peixão surgem em contextos onde o Estado perde força, e líderes violentos passam a ser vistos como fiadores de uma ordem imposta pelo medo. Nesse cenário, o “traficante-pastor” se vende como alguém disposto a ir para a guerra para garantir sua própria versão de ordem.

O que significam as joias apreendidas na Capital do Mato Grosso do Sul - As joias encontradas com a família de Peixão em Campo Grande não são apenas itens de luxo ou ostentação. Cada símbolo carrega parte da ideologia que sustenta seu poder.
O medalhão com a inscrição “Israel Defense Force” faz referência direta às Forças de Defesa de Israel, reconhecidas mundialmente pelo poder militar. Ao adotar esse símbolo, Peixão se associa à imagem de um exército em guerra permanente.
Outro símbolo identificado é a Estrela de Davi, um dos principais emblemas do judaísmo e do Estado de Israel desde 1948. A tradição aponta que o símbolo era usado nos escudos do exército do rei Davi. A estrela também ficou historicamente marcada pela perseguição aos judeus durante a Segunda Guerra Mundial, quando foi imposta pelos nazistas como forma de identificação.
Também aparece a expressão “varão de guerra”, retirada do livro do Êxodo, da Bíblia, usada para designar um homem poderoso, vencedor de batalhas e defensor de seu povo. Dentro da lógica do grupo, o termo reforça a ideia de que os integrantes atuam em uma guerra espiritual.

Os pingentes ligados a Arão reforçam ainda mais a narrativa messiânica. Ao se associar a uma figura central da Bíblia, Peixão constrói a imagem de um líder escolhido, não apenas um chefe do tráfico, mas alguém que se apresenta como representante de uma missão divina.
Prisão - A tentativa de saída do país seguia uma rota estratégica por Mato Grosso do Sul. A esposa, três filhos e um sobrinho de Álvaro Malaquias Santa Rosa saíram do Rio de Janeiro de avião até Campo Grande e, daqui, seguiram pela BR-262 com destino a Corumbá, na fronteira com a Bolívia. A interceptação ocorreu ainda na Capital, por volta do meio-dia de segunda-feira (8), após alerta da Polícia Civil do Rio de Janeiro à Polícia Rodoviária Federal.
Peixão não estava nos veículos, mas com os familiares os policiais encontraram malas com diversas joias personalizadas, medalhões e relógios. O sobrinho afirmou ser o dono dos objetos, mas ele e a esposa do traficante foram presos em flagrante por suspeita de lavagem de dinheiro e vínculo com organização criminosa. Após depoimento, acabaram liberados.
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