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Em Pauta

A beleza e as agruras do sal, desde a Polônia até o Pantanal

Por Mário Sérgio Lorenzetto (*) | 28/12/2024 08:20
Campo Grande News - Conteúdo de Verdade

O sal foi a primeira necessidade vital que virou mercadoria. Sem ele, só nos resta a morte. Todavia, está esparramado por milhares de locais, necessitando ser retirado pelos humanos. Há poucos locais onde está concentrado. Os primeiros humanos nada sabiam a respeito do sal, só não morriam por se alimentarem de animais, cuja carne tem a quantidade necessária para a nossa sobrevivência. E era assim no antigo Mato Grosso do Sul, comer carne não era apenas uma questão de preferência, era essencial para a vida. Indígenas, paraguaios e os primeiros paulistas e poconeanos, viviam quase exclusivamente do consumo de carne, tanto de vaca como de caça.


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A mais bela catedral de sal.

Estamos na catedral de sal em Wieliczka, perto de Cracóvia, na Polônia. É uma cidade comum, com o encanto da Europa Oriental. No centro de Wieliczka há um discreto edifício propriedade da mina. Uma vez dentro, te conduzem a um espaçoso vestíbulo e, através de uma portinha lateral, a uma longa escadaria de madeira que desce até onde alcança a vista. Centenas de degraus depois, entra em uma sala, a sessenta e quatro metros em baixo da terra. Ali, nos últimos setecentos anos escavaram uma cidade subterrânea inteira com inimagináveis trezentos quilômetros de túneis e mais de dois mil pequenas habitações e praças. É um lugar colossal e magnifico. No século XIX e em princípios do XX, a mina tinha estábulos, onde os cavalos viviam na escuridão e sem respirar ar fresco. A sala mais alta é do tamanho do Coliseu de Roma. Outra câmara maravilhosa é uma catedral, chamada “capela de Santa Kinga”, mede quase mil metros quadrados e tem belos auto-relevos de passagens bíblicas. Está a trezentos metros de profundidade. Toda feita de sal, desde as cenas da Última Ceia até a estátua de São Tomás, o incrédulo.


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Sal do Pantanal e sal da Vacaria.

Como é amplamente conhecido, as águas do Pantanal são salobras, isto é, tem elevada quantidade de sal, aproximando-se das águas do mar. Nos outros campos de criação de vacas tradicionais, conhecido como Vacaria, entre Jardim e Nova Andradina, não há sal. Quando os poconeanos começaram a chegar ao Pantanal do Mato Grosso do Sul, inexplicavelmente compravam sal de Corumbá. Era uma despesa obrigatória e quase única, ainda que existissem saleiros e a água contivesse boa quantidade de sal. É incompreensível. Por que compravam sal corumbaense se existia em algum lugar bem mais próximo. Já pelos lados da Vacaria, a aquisição de sal era uma obrigação e o grande fator limitante para o crescimento das populações de gado. Foi o sal o responsável pela diferença da quantidade de gado no Pantanal quando comparado com as boiadas dos campos da Vacaria.


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Da civilização, só quero o sal.

Ainda restam alguns poucos povos isolados da civilização, vários deles, na Amazônia. Quando em contato com os “civilizados”, aspiram tão somente pelo sal. A historia mais clara sobre o sonho do sal, todavia, não vem do Brasil, foi contada pelos russos. Por volta do ano 1.600, a igreja ortodoxa russa passou por uma série de mudanças. Muitos não as aceitaram. Criaram grupos populosos que foram chamados de “velhos crentes”. Eram centenas de milhares na Rússia e na Ucrânia. Os czares determinavam o pagamento de impostos para que eles continuassem com suas crenças. Fugiram para um “fim de mundo”, na fronteira da Rússia com a Mongólia, depois de trinta anos da Revolução bolchevique. Sobreviveram caçando e cultivando as poucas sementes que levaram. Quando as panelas se oxidaram, tiveram que fazer caçarolas com casca de árvores. Eles vestiam folhas e cascas de árvores. Em vez de crescer, suas colheitas diminuíram. Um verão, os animais selvagens comeram todas as cenouras que haviam plantado. Outro ano, nevou muito e nada foi colhido. A fome tomou conta da população. Mas eles não desistiam de sua fé. Em poucas décadas, o grupo retrocedeu milhares de anos. Algo parecido a um estado natural. Viviam na natureza e da natureza. Caçavam descalços, inclusive na neve. Não tinham armas, apenas armadilhas. Era uma vida duríssima. Até que em 1.981, um grupo de geólogos os descobriu quando sobrevoava o local com um helicóptero. O encontro foi dramático. Alguns nunca tinham visto outros humanos que não fosse do grupo. Apesar de carecer de tudo, pareceriam felizes e saudáveis. No principio, não quiseram ajuda alguma. Se negaram a aceitar tudo que viesse da “civilização”. Um dos mais antigos membros pediu sal aos geólogos. Comer sem sal foi o pior de viver longe da “civilização“, disse ele, “uma verdadeira tortura”, completou.

 

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