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Corrupção e a democracia

Por Isaac Roitman (*) | 14/09/2016 10:38

O título desse artigo foi tema de reflexão nas Conversas da Comissão de Justiça e Paz da Arquidiocese de Brasília, que são realizadas todas as primeiras segundas-feiras do mês no auditório Dom José Freire Falcão da Cúria Metropolitana de Brasília a poucos metros da Catedral, concebida pelo grande brasileiro Oscar Niemeyer. O evento contou com a participação de dois palestrantes: Melillo Dinis do Nacimento, advogado, doutor em Direito e especialista no tema e Mauro Almeida Noleto, mestre em direito, professor universitário e ex-Secretário de Estado de Transparência e Controle do Distrito Federal.

No evento, pelas falas dos palestrantes e durante amplo debate, ficou evidente que em uma verdadeira democracia as instituições públicas devem contribuir para o bem comum, para a coletividade. Quando os recursos públicos são desviados e passam a servir interesses excludentes de indivíduos ou de grupos, tem-se a corrupção, o que se constitui em uma grande ameaça à democracia. Ficou também claro que o tema tem relevância nacional e planetária e que a corrupção é uma realidade nos regimes autoritários e nas democracias.

Como apontou Mauro, a corrupção no Brasil é antiga. Já no século XVI os funcionários coloniais exportavam por conta própria especiarias, tabaco, metais e peças preciosas. Seguiu-se a traficância dos escravos, a manipulação dos contratos para obras públicas, a corrupção eleitoral do Império, o voto de cabresto da República, o “rouba mas faz”, escândalos financeiros, o “esquema PC” e tantos outros que produzem o “mar de lama”, expressão repetida durante o evento. Graças à abrangência, à instantaneidade e a liberdade dos meios de comunicação, torna-se hoje mais difícil, senão impossível, ocultar os fatos da sociedade que parece não estar disposta a aceitar a corrupção.

Melillo destacou que a corrupção passou a fazer parte do nosso cotidiano e desenvolveu o tema através de vários aforismas. Entre eles: “O poder corrompe e o poder absoluto corrompe absolutamente.” (Lord Acton); “A democracia é a pior forma de governo, exceto todas as outras que têm sido tentadas de tempo em tempo. (Winston Churchill); “O direito penal não consegue enfrentar a corrupção”. (Raúl Zaffaroni); “Para grandes males, grandes remédios. (José Saramago); “Na política brasileira, todos são corruptos, exceto quem não é.” (Mellilo Dinis do Nascimento). O manejo do poder e dos recursos se constituem como tentações que exige um papel de vigilância da sociedade civil. A corrupção é uma grande ameaça para a democracia brasileira. Embora sempre presente na nossa história, ela talvez jamais tenha assumido uma dimensão tão extensa e profunda. Se não conseguimos superá-la no passado temos a oportunidade de superá-la no presente para proteger o nosso futuro.

Pessoalmente penso que a corrupção é uma doença da alma como as doenças definidas como os sete pecados capitais: luxúria, gula, avareza, ira, soberba, vaidade e preguiça. Como todas as doenças ela não acomete a todos. Muitas pessoas não susceptíveis a ela, outras não. A corrupção é uma doença incurável. Ela deve ser combatida por exemplo como foi combatida a paralisia infantil que é também incurável. Nesse caso ela foi eliminada pela prevenção, através do desenvolvimento de uma vacina.

A vacina para a corrupção é a educação. Uma educação de qualidade para todos os brasileiros. Ela além de proporcionar a alfabetização das letras e dos números e preparar para uma profissão digna, deverá exercitar o pensamento e a crítica argumentada e principalmente introduzir e consolidar as virtudes como a solidariedade e a ética. Devemos cumprir a nossa missão geracional e preparar uma nova geração onde a corrupção seja um fenômeno do passado. Nesse futuro não tão remoto teremos conquistado a utopia de uma verdadeira justiça social, onde cada brasileiro tenha a oportunidade de ser feliz. Nesse contexto é pertinente lembrar o pensamento de Anísio Teixeira: “Só existirá democracia no Brasil no dia em que se montar no país a máquina que prepara as democracias. Essa máquina é a escola pública.”

(*) Isaac Roitman é doutor em Microbiologia, professor emérito da Universidade de Brasília, coordenador do Núcleo de Estudos do Futuro, presidente do Comitê Editorial da Revista Darcy/UnB e membro tiular de Academia Brasileira de Ciências

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