Fim de lixão fecha comércios, deixa catadores na miséria e sem renda
Cerca de um terço dos 429 catadores estão desempregados
“Antes era dificuldade, mas agora é fome”. Assim, o catador de materiais recicláveis que trabalhava no lixão, Jeferson Osmar define sua situação financeira. Ele, sua esposa, sogra e cunhado tiravam a renda da família de lá e estão sem trabalho desde o fechamento do local, em fevereiro deste ano. Com seis crianças entre dois meses e 13 anos, Jeferson conta que a situação não está pior, porque tem recebido ajuda dos pais e cunhadas.
“Eu, minha esposa e nossos cinco filhos morávamos numa casa no Cophavilla e tivemos que entregar porque não tinha como pagar as contas. Sou catador há 18 anos, minha sogra é há 25, só sabemos fazer isso. Por mais que procure, não acha porque achar emprego tá muito difícil”, diz.
Depois do fechamento do lixão em fevereiro deste ano, cerca de um terço dos 429 trabalhadores estão desempregados. Os catadores que moravam no bairro Dom Antônio Barbosa, ao lado do lixão, sustentavam o comércio local. Lojas de roupa, farmácia e mercearias também sobreviviam com a renda daquelas famílias.
Porém, com o fechamento várias famílias foram transferidas pela prefeitura para outros bairros. Outros continuam lá, mas não têm dinheiro nem para as despesas básicas. Com isso, comerciantes se viram obrigados a fechar as portas e procurar outra forma de trabalho.
Com data marcada para abaixar as portas, a proprietária da mercearia Oliveira, diz que desde o fechamento do lixão, as vendas estão despencando. “Vou tentar vender os produtos que estão aqui, mas se eu não conseguir, terei que levar tudo pra minha casa, entregar o espaço e procurar um emprego”.
A comerciante lembra que antes, ela vendia de R$ 900 a R$ 1.000 em um domingo, mas que agora este valor não chega nem a R$300. “Não consigo sustentar a água e luz daqui e da minha casa, fora as contas e outras despesas. Dia 10, que é o dia que vence o aluguel daqui, vou entregar o imóvel”.
Para que moradores conseguissem ter renda até encontrar um novo emprego, Jeferson conta que a prefeitura ofereceu auxílios, como o vale renda e o bolsa família, mas que se negou a aceitar, pois para ele "é revoltante aceitar essas esmolas".
Segundo o catador, antes não era preciso ajuda do governo para financiar uma moto ou ir no mercado comprar o que precisava ou tinha vontade. “Prefiro meu emprego de volta ao invés de um benefício social”.
Pai de cinco filhos e tendo um sobrinho em casa, ele conta que a família tirava do lixão mais do que a renda. “Se pra você um tênis tava velho e você jogava no lixo e eu encontrava e via que estava em bom estado, pegava pra mim ou alguém da família. Assim conseguia vestir e calçar todos”.
Após o fechamento do aterro, a Solurb, que é a concessionária responsável pela gestão da Limpeza Urbana e o Manejo de Resíduos Sólidos, vagas em diversos setores da empresa, mas de acordo com Jeferson, as vagas não chegaram a 200 e o salário era muito abaixo do que eles tiravam do lixo.
“Eu não vou trabalhar numa empresa que tirou minha dignidade, minha independência financeira. Se hoje estou como estou é graças a eles”, se revolta.
É exatamente assim que a catadora Ana Fernandes, que agora trabalha no setor de capinagem da Solurb se sente. “Em uma semana tirava cerca de um salário mínimo no lixão, agora recebo isso em um mês todo de trabalho”. Empregada há cerca de dois meses, Ana conta que seu marido, que também tirava a renda da família como catador, trabalha agora em uma empresa de materiais recicláveis.
Rodrigo Leão também trabalhava no lixão e conta que há cerca de um mês conseguiu emprego como servente de pedreiro. Com seis pessoas em casa, sendo uma grávida, ele conta que estava sustentando a casa sozinha até quinze dias atrás.
“Tem duas semanas que meu irmão começou a trabalhar como varredor na Solurb. Minha irmã e cunhada estão paradas. Nós ainda estamos com uma renda, mas tem amigos meus que estão na miséria, que perderam tudo”.