Mesmo longe, venezuelanos temem guerra e dizem não ver futuro no país
Vivendo de lavar vidros, imigrantes relatam medo pela família e descrença em mudanças na Venezuela

No cruzamento da Mato Grosso com a 14 de Julho, no Centro de Campo Grande, o som dos carros se mistura ao barulho dos baldes batendo no asfalto e aos panos que limpam os para-brisas entre um semáforo e outro. Sob o sol forte, um grupo de venezuelanos lava vidros e conta como tenta recomeçar a vida longe do país que deixou para trás. Eles fugiram da crise e agora acompanham com apreensão as notícias sobre a possível intervenção dos Estados Unidos na Venezuela, em meio à escalada de tensão contra o regime de Nicolás Maduro.
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Venezuelanos que vivem em Campo Grande, Mato Grosso do Sul, acompanham com apreensão as tensões políticas em seu país natal, especialmente diante da possível intervenção dos Estados Unidos no regime de Nicolás Maduro. Mesmo trabalhando como lavadores de para-brisas nas ruas da capital, eles consideram a vida no Brasil melhor que na Venezuela. Os imigrantes relatam que, apesar das dificuldades enfrentadas no Brasil, não pretendem retornar ao país de origem, mesmo com uma eventual queda de Maduro. Eles mantêm contato com familiares que permaneceram na Venezuela através de redes sociais e expressam preocupação com a situação de violência e instabilidade econômica que persiste no país.
Mesmo distantes, dizem que o medo continua, não pelo futuro deles, mas pelos familiares que ficaram. Andrea Gonzales, de 28 anos, vive há dois anos no Brasil e deixou os pais e as duas filhas em Caracas. “Tenho medo por eles, claro. Lá sempre tem confusão, gente contra a polícia. Mas não quero voltar. Mesmo se o Maduro cair, não volto. Lá não há futuro, não há trabalho”, diz.

A poucos metros dela, Osmar García Hernández, de 31 anos, limpa os vidros com calma, quase como quem medita. Está em Campo Grande há quatro anos e hoje vive em situação de rua, dormindo onde consegue, entre amigos e calçadas. Mesmo assim, ele acredita que está melhor aqui do que lá.
“Lá é pior. Aqui eu consigo me virar”, diz, com firmeza. Osmar deixou a mãe na Venezuela e conta que pensa nela todos os dias. “Tenho fé em Deus que nada vai acontecer com ela. Assim como eu aprendi a sobreviver aqui, ela também sabe se virar lá.”
Apesar de acompanhar a tensão política, diz que não teme uma guerra, mas sente medo pela vida que a mãe leva em meio à instabilidade. E não acredita que a queda de Maduro vá mudar alguma coisa. “O problema não é só o presidente. Sai Maduro, entra outro e tudo continua igual. O país não muda porque o povo não muda”, afirma.

Osmar fala da Venezuela com uma mistura de dor e resignação. Lembra do passado com carinho, mas sem esperança de reviver o que foi. “A Venezuela já foi boa, rica, nos anos 80 e 90. Hoje é só violência. Todo mundo quer dar um jeito, mas ninguém muda nada. Eu não volto pra isso, só se mudar de verdade.”
Entre um vidro e outro, ele solta uma reflexão que o resume: “Não volto, não vou morrer por causa de presidente nenhum. O único que morreu por nós foi Deus. O presidente não vai morrer por mim.”
Ao lado deles, Aníbal Gomes, de 29 anos, chegou há três meses com a esposa e ainda tenta se adaptar. “Vim por causa da economia. Lá não dá pra nada. Aqui é difícil, mas dá pra seguir”, conta. Mesmo com a apreensão, ele mantém a esperança de que os outros perderam. “Se o Maduro cair, eu volto no mesmo dia. Só não volto agora porque o país está sem direção. Mas se mudar de verdade, quero estar lá de novo.”

Enquanto o sinal abre, os três se apressam para o próximo carro. De longe, acompanham pelas redes sociais e por ligações rápidas o que acontece em casa. A cada nova manchete sobre o conflito, equilibram a fé e a descrença de quem ainda carrega o país dentro do peito, mas já não sonha em voltar.
“Eu continuo aqui, lavando vidro, orando pela minha mãe e tentando viver”, diz Osmar. “Voltar pra lá, do jeito que está, não dá mais.”
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