Porto seco é justificativa usada para aumentar perímetro urbano
A justificativa para ampliar em 136,85 hectares o perímetro urbano de Campo Grande foi baseada no desenvolvimento que o Terminal Intermodal, o chamado Porto Seco, deve trazer para a região sul da Capital – próximo à área do lixão do bairro Dom Antônio Barbosa. O aumento gerou polêmica e críticas.
A alegação é do vereador Carlos Augusto Borges (PSB), conhecido como Carlão, autor da emenda de aumento do perímetro urbano à Lei Complementar nº 205, de autoria do Poder Executivo, que foi aprovada pela Câmara em 26 de outubro.
“Aquela área vai gerar cerca de 400 empregos e atrair moradias. Aquele pedaço de terra estava descupado, sem uso, e por ser cosiderado perímetro rural não poderia ser utilizado futuramente pela Prefeitura para construção de lotes de residenciais, escolas, postos de saúde, por exemplo”, diz. O Terminal está aguardando a autorização da Receita Federal para os trâmites legais no despacho de produtos.
Segundo ele, o pedido de incluir a área ao perímetro urbano, como também os dados de desenvolvimento, foram passados pelo prefeito Nelson Trad Filho (PMDB). A emenda foi feita a projeto original encaminhado pelo Executivo à Câmara.
O vereador avalia que a área já estava “no meio urbano, cercada de bairro” e que a oficialização do terreno como urbano é fundamental para o desenvolvimento da cidade.
“O município não pode parar por conta de um triângulo de terra parado no meio da região urbana”, diz.
Sobre a propriedade da área, o vereador informou que o terreno fica ao lado do porto seco e que a maior parte é da Prefeitura de Campo Grande. No entanto, ele diz que não tem dados para afirmar se toda a área é pública ou existe parte particular.
A reportagem entrou em contato com a Planurb e a assessoria de imprensa da Prefeitura para descobrir no nome de quem está a área, mas não obteve resposta.
Sem necessidade - Para quem acompanha a questão, o aumento do perímetro urbano é totalmente desnecessário considerando a área já existente na cidade. O vice-presidente da Federação Nacional dos Arquitetos e Urbanistas, Ângelo Arruda, afirma que a cidade tem espaço para abrigar cinco vezes o número atual de habitantes nos 35.766 mil hectares que já possui. De acordo com o IBGE, o município tem 806 mil habitantes e considerando a conta de Ângelo, comportaria até 4 milhões .
“A cidade tem que crescer dentro do espaço vazio urbano que já existe e não criar mais perímetro em uma região afastada, sem infraestrutura”, diz.
Além do fator desnecessário, o arquiteto lembra que a ocupação urbana da área representa gastos com a demanda de investimentos em asfalto, saneamento básico, linha de ônibus e acesso a serviços básicos como saúde e educação.
“Do ponto de vista de planejamento, de organização de uma cidade, não existe benefício nenhum nesse aumento de perímetro”, avalia.
Uma das especulações sobre o benefício da área é a valorização do terreno e o “aquecimento” do mercado imobiliário. A área sendo considerada urbana passa a ser avaliada por metro quadrado e não mais por hectare, o que de acordo com o setor imobiliário é responsável por aumentar o valor de venda.
Irregular – Além disso, a alteração não poderia ter sido feita sem que houvesse antes uma revisão do Plano Diretor do Município, afirmam os críticos. O Conselho Municipal de Desenvolvimento Urbano (CMDU) afirma que só teve acesso ao projeto original, sem a emenda, e que aprovação do aumento da área "é totalmente irregular".
"Se o Conselho tivesse sido consultado nós teríamos alertado que a emenda era irregular de acordo com a lei, mas nem fomos consultado", diz o membro do CMDU e presidente do Secovi, Marcos Augusto Netto. O Conselho precisa aprovar o projeto antes de ser encaminhado para Câmara.
O arquiteto Ângelo ainda frisa que o projeto não poderia ter sido aprovado pela Câmara sem ao menos ter entrado em discussão ou ser aberto para opinião pública.
“Essa questão é pública, diz respeito a todos, e não poderia ter sido aprovada sem ser levada para consulta da sociedade. Além disso, o projeto publicado está quase criptografado e para quem não é da área é praticamente impossível entender o que foi feito e, assim, o projeto passa despercebido”, ressalta.
No entanto, o vereador Carlão afirma que o Conselho teve acesso a todo conteúdo do projeto e, além disso, o texto foi aprovado pela Câmara e sancionado pelo prefeito. “Foi aprovado por quem cabia, então, quem discordar que entre com as providências para questionar a ação”, afirmou.
Reunião entre Sindicato, Instituto de Arquitetos e OAB-MS (Ordem dos Advogados do Brasil) irá acontecer ainda nesta manhã para discutir a questão. Ângelo diz que o objetivo é acionar o Ministério Público para que questione a Prefeitura sobre a irregularidade da mudança na lei e motivos e benefícios para a alteração.