Ex-ministro avalia que guerra de Trump com a China abre mercados para MS
Roberto Rodrigues avalia que investimento consolidaram a produtividade elevada o que aumenta chances de MS
Na avaliação do ex-ministro da Agricultura e professor da FGV Agro, Roberto Rodrigues, os fortes investimentos em inovação ao longo do desenvolvimento do agronegócio no estado de Mato Grosso do Sul consolidaram a produtividade elevada e hoje garantem margem para negociar com diferentes mercados, mesmo diante de um cenário global incerto e sujeito aos solavancos provocados pelo tarifaço imposto pelo presidente dos Estados Unidos.
RESUMO
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O ex-ministro da Agricultura, Roberto Rodrigues, avalia que a guerra comercial entre EUA e China pode abrir oportunidades para o agronegócio de Mato Grosso do Sul, que investiu em inovação e produtividade. Com tarifas impostas por Trump, a China retaliou, criando um cenário de incerteza global. Rodrigues vê potencial para novos acordos multilaterais, como o Mercosul-UE. Produtores locais, como André Dobashi, destacam a necessidade de repensar relações comerciais. A alta do dólar e a inovação no agro podem beneficiar exportações brasileiras, apesar de desafios como a alta da Selic e recursos limitados no Plano Safra.
Na quarta-feira, em novo cavalo de pau, Trump aumentou a taxa de importação dos produtos chineses para 125% e igualou as demais tarifas de outros 180 países em 10%, a mesma que já havia aplicado para o Brasil. Trump decretou uma pausa de 90 dias para que as tarifas anunciadas entrem em vigor. Com retaliação, a China elevou para 84% a tarifa para entrada dos produtos americanos em seu território.
Em entrevista ao Campo Grande News, Rodrigues comparou a decisão de Trump a uma “bagunça comercial global” que muda a geopolítica, o comércio e a economia mundial. Com isso, Rodrigues acredita em potencias novos acordos multilaterais, como o da União Europeia-Mercosul, que estavam parados por falta de interesse da Europa. Segundo ele, a disputa comercial entre Estados Unidos e China deverá refletir em vários mercados, como Ásia, Europa e Oriente Médio, podendo favorecer o Brasil, que ocupa uma posição estratégica no agronegócio no mundo.
Sob essa perspectiva, os produtores rurais sul-mato-grossense, que investem pesado na inovação garantindo elevada produtividade, têm margem para negociar nesse tabuleiro.
O entendimento do ex-ministro da Agricultura é de que o mundo deverá se reorganizar “para entrar no trem certo”. Dessa forma, Rodrigues avalia que na atual conjuntura, a palavra-chave é “negociação” com todos os países, exatamente o que Trump sinaliza ao aplicar nos mercados a teoria do caos.
“Já existem 50 países querendo negociar com ele. Tenho a convicção de que o lance dele é esse mesmo, o de negociar. Decidiu jogar água na fervura para depois buscar uma nova negociação. Então, precisamos ter muita paciência, competência e inteligência para negociar com ele e com o resto do mundo”, disse o ex-ministro que participou do XVIII Congresso Nacional Alasca, que discutiu a importância do seguro rural para proteção da agricultura, em Brasília.
Para o ex-ministro, o agronegócio brasileiro, salvo as exportações do suco de laranja, que eram isentas e passaram a ser taxadas, têm espaço para negociação, principalmente as regiões do Centro-Oeste, como Mato Grosso e Mato Grosso do Sul.
O produtor rural sul-mato-grossense de soja, milho e carne, André Dobashi, presidente da Comissão Nacional de Cereais, Fibras e Oleaginosas da Confederação Nacional da Agropecuária (CNA), observa os reflexos da guerra comercial com preocupação. “Os Estados Unidos ainda são a maior potência econômica do mundo. Isso posto, quando se inicia um processo extremado de demonstração de poder, todos os mercados se sentem acuados e precisam responder à altura, gerando incertezas e aumentando a insegurança na produção.”
Mesmo diante dessas incertezas, Dobashi descarta fazer qualquer mudança no seu modelo de negócio em decorrência do tarifaço de Trump. O entendimento é de que as tarifas aplicadas servem para entender e repensar as “nossas relações” com o resto do mundo. “O Brasil e China, por exemplo, já deveriam ter uma sistemática própria de comercialização, sem a indexação do mercado em Chicago.”
O produtor rural defendeu a Lei da Reciprocidade Comercial (Projeto de Lei 2.088/2023), que autoriza o governo brasileiro a adotar medidas comerciais contra países e blocos que imponham barreiras aos produtos nacionais no mercado global. De autoria da senadora Teresa Cristina (PP/MS), o texto, aprovado na Câmara dos Deputados e no Senado, recentemente, aguarda a sanção presidencial.
“O projeto é essencial diante da crescente adoção de medidas unilaterais e discriminatórias por países ou blocos econômicos, que prejudicam a competitividade e o acesso dos produtos brasileiros ao mercado internacional.” Na avaliação de Dobashi, o projeto não trata de retaliação, mas de um instrumento para que, no caso de os produtos brasileiros serem alvo de restrições desproporcionais, o Brasil possa reagir e adotar medidas equivalentes.
O coordenador de inteligência de mercado da consultoria Hedgepoint Global Markets, Luiz Fernando Gutierrez Roque, reforça que o Mato Grosso do Sul e outras regiões brasileiras produtoras de commodities devem ampliar as exportações para vários mercados, devendo abocanhar espaços dos Estados Unidos, que são concorrentes do Brasil no mercado de grãos.
“A demanda pelos produtos agrícolas americanos deve cair. Eles devem ficar menos competitivos no mercado internacional em razão das tarifas retaliatórias. A China é um exemplo. Olhando para esse lado, o Brasil pode ser beneficiado e aumentar a sua parcela em vários mercados, caso essas tarifas sejam mantidas”, disse Roque.
Impacto do dólar
O economista, especializado em commodities agrícolas e no mercado financeiro, chama a atenção ainda para o impacto positivo da alta do dólar no comércio exterior do agronegócio brasileiro, apesar de constantes oscilações do mercado acionário. A análise é de que, na prática, o real desvalorizado melhora a competividade do produto brasileiro e permite o ingresso de moeda estrangeira em território nacional, impactando positivamente a balança de pagamentos e outros indicadores econômicos.
“Essa guerra comercial mundial trará forte volatilidade aos mercados, mas um dólar mais forte é melhor para a exportação e também para o produtor brasileiro. A margem financeira do produtor melhora, assim como a exportação que, de alguma forma, traz mais divisas para o Brasil”.
Taxa de juros
Em outra frente, o ex-ministro da Agricultura avaliou o impacto da taxa Selic nos atuais 14,25% sobre o custo da produção agrícola e acrescentou que o juro representa, na atual conjuntura, um “sério problema” para o campo. Isso porque as perspectivas, para este ano, são de um Plano Safra abaixo das necessidades da demanda do mercado gerando problemas de liquidez no campo. O cenário projetado é de menos dinheiro do crédito rural oficial (com juro subsidiado), demanda crescente e juros maiores.
“Esse é um problema que independe do Trump. Provavelmente não haverá recursos suficientes no Plano Safra para todos os produtores, e isso trará dificuldades para o setor avançar no próximo ano”.
Inovação do Agro eleva PIB
O Mato Grosso do Sul deve liderar a taxa de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro este ano. Conforme previsões recentes da Tendências Consultoria, divulgadas antes do tarifaço dos EUA, o PIB do estado deve crescer 4,4% este ano, seguido por Mato Grosso (MT), com alta prevista de 3,7%. As projeções superam a média nacional das expectativas do mercado financeiro para o PIB nacional, que é de 1,97%.
Na avaliação de Roberto Rodrigues, Mato Grosso do Sul e Mato Grosso devem crescer acima da média nacional sob a influência positiva do agronegócio. “Existem vários trabalhos mostrando que o Centro-Oeste tem sido, de longe, a região que mais cresce em razão do agronegócio pautado em ciência e tecnologia, com produtividade forte e gestão moderna. A inovação chegou primeiro nessa região”.
Entretanto, conforme o professor da FGV, o vaivém da guerra comercial, travada por EUA e China, jogou os mercados na incerteza e recomenda ao Brasil um otimismo com cautela em função do cenário de imprevisibilidade geral. “Qualquer avaliação agora perdeu consistência”.