ACOMPANHE-NOS     Campo Grande News no Facebook Campo Grande News no X Campo Grande News no Instagram
NOVEMBRO, QUARTA  27    CAMPO GRANDE 26º

Comportamento

Para vida além das grades, Natiela conquistou o 1° diploma na prisão

Nesta quinta-feira (14), Natiela foi a 1ª interna a concluir Ensino Superior dentro da unidade prisional

Por Thailla Torres | 15/12/2023 08:55
Natiela Aparecida Souza Fernandes, de 36 anos, formou-se em Tecnólogo em Serviços Jurídicos Cartorários e Notariais. (Foto: Marcos Maluf)
Natiela Aparecida Souza Fernandes, de 36 anos, formou-se em Tecnólogo em Serviços Jurídicos Cartorários e Notariais. (Foto: Marcos Maluf)

Pode ser na cela da penitenciária ou na biblioteca, Natiela Aparecida Souza Fernandes, de 36 anos, não abandona os livros. Está disposta a ser um orgulho para a filha adolescente e a ter uma nova vida longe das grades.

Nas palavras das amigas da prisão e dos agentes penitenciários, Natiela tem uma disposição formidável para aprender. Há 7 anos, descobriu como transformar o tempo ocioso em conhecimento e mudar a própria trajetória. Hoje, ela está formada, comemorando nas mãos o 1º diploma de Ensino Superior.

“Dedico esse diploma à minha família e à minha filha. O sonho dela era me ver formar. Para mim, esse diploma é a oportunidade de mostrar a ela que o estudo muda tudo e, que apesar dos meus erros cometidos, é importante erguer a cabeça e seguir em frente”, diz Natiela.

“Através da educação, nossas portas são abertas para um futuro melhor, pois nossas vidas vão além das grades”, diz Natiela.
“Através da educação, nossas portas são abertas para um futuro melhor, pois nossas vidas vão além das grades”, diz Natiela.

Nesta quinta-feira (14), Natiela foi a primeira interna do Estabelecimento Penal Feminino “Irmã Irma Zorzi” a concluir o ensino superior na unidade. Além dela, o estabelecimento penal realizou a formatura de 13 mulheres que concluíram o Ensino Fundamental e outras 11 do Ensino Médio. Ao todo, 43 concluíram os estudos, mas 18 não estão mais na unidade, seja por progressão de regime ou transferência. Este ano, o presídio teve 102 internas matriculadas.

“Nunca tivemos tantos formandos”, celebrou Mari Jane Boleti Carrilho, que há 11 anos está à frente da unidade prisional como diretora. “Só temos que agradecer. Eu costumo dizer que todo ano esse é um momento especial, porque mostra uma dedicação e um conhecimento que ninguém vai tirar delas. É o resultado de fazer e fazer bem feito”, conclui a diretora.

Além da diretora, a cerimônia contou com a presença de autoridades e colaboradores da Segurança Pública, Educação e universidades. Todos acompanharam a chegada das formandas e o recebimento dos canudos.

Nos olhos de cada uma, as lágrimas tinham tradução. “É uma vitória, uma conquista”, diz Natiela. “Através da educação, nossas portas são abertas para um futuro melhor, pois nossas vidas vão além das grades”.

“Nunca tivemos tantos formandos”, celebrou Mari Jane Boleti Carrilho (de blusa branca), que há 11 anos está à frente da unidade prisional como diretora. (Foto: Marcos Maluf)
“Nunca tivemos tantos formandos”, celebrou Mari Jane Boleti Carrilho (de blusa branca), que há 11 anos está à frente da unidade prisional como diretora. (Foto: Marcos Maluf)

Natural de Amambai, região Sul do Estado, Natiela está presa há 7 anos e responde por tráfico de drogas. Quando chegou à unidade, decidiu retomar os estudos no Ensino Fundamental, cursou o Ensino Médio e o ensino superior Tecnólogo em Serviços Jurídicos Cartorários e Notariais.

O que motivou o retorno aos estudos foi a leitura. “Eu gosto de ler. Meu sonho era fazer fisioterapia, mas aqui dentro comecei a me interessar pelos livros jurídicos, principalmente pela área cartorária, então lutei por fazer esse curso na unidade”.

O curso foi concluído em menos de três anos de forma EAD (Educação a Distância). Natiela conciliava o trabalho na limpeza com as horas de estudo. “Não faltei um aula”.

O sonho de ter um curso superior fez até as dificuldades virarem um detalhe. “No começo foi difícil, a ausência de professor é o maior desafio, mas meus tutores foram perfeitos e me ajudaram”.

Hoje, ela usa os estudos para incentivar a leitura dentro das celas. “É através dela que muitas mulheres têm procurado vaga na escola, porque quanto mais conhecimento, mais a vontade de estar em sala de aula é despertada. O estudo é a base de tudo”.

Agora, o novo sonho de Natiela está fora das grades. “Quero ficar livre e cursar direito. Ele desperta muito conhecimento e quero trabalhar na área dos direitos humanos”, afirma.

Precisei vir para esse lugar para cursar o Ensino Médio”.

Lucenir da Silva Saraiva, 32 anos, concluiu o Ensino Médio na prisão. (Foto: Marcos Maluf)
Lucenir da Silva Saraiva, 32 anos, concluiu o Ensino Médio na prisão. (Foto: Marcos Maluf)

A frase é de Lucenir da Silva Saraiva, 32 anos, que em meio às lágrimas comemorou ontem a conclusão do Ensino Médio e esteve entre as formandas.

Bastante emocionada, por muito tempo ela achou que não daria conta de concluir os estudos. “Eu nunca pensei que um dia fosse conseguir terminar o ensino médio por causa da minha vida financeira, eu dependia muito da minha mãe e ela não tinha condições de me ajudar, eu precisei vir para esse lugar para cursar o ensino médio”.

Natural do Acre, Lucenir está presa há 3 anos e também responde por tráfico de drogas. Mãe de três filhos, ela dedica o tempo em sala de aula à mãe. “Hoje, eu penso em fazer Tecnologia e agradeço a oportunidade que tive nesse lugar. Nunca perdi um dia de aula e nunca pensei em desistir”, finaliza.

O curso de Natiela foi gratuito e oferecido de forma inédita por meio de parceria entre a Agepen, Conselho Nacional de Justiça (CNJ), a Kroton e a Fundação Pitágoras/Cogna. No estado, as primeiras beneficiadas são as reeducandas do Irma Zorzi, com cursos tecnológicos, oferecidos totalmente na modalidade à distância.

Já as internas que concluíram o Ensino Fundamental e Médio contaram com extensões escolares da rede estadual de ensino, sistema EJA (Educação de Jovens e Adultos). Na capital, a escola responsável é a Escola Estadual Regina Anffe Nunes Betine.

O estabelecimento penal realizou a formatura de 13 mulheres que concluíram o Ensino Fundamental e outras 11 do Ensino Médio. (Foto: Marcos Maluf)
O estabelecimento penal realizou a formatura de 13 mulheres que concluíram o Ensino Fundamental e outras 11 do Ensino Médio. (Foto: Marcos Maluf)

Acompanhe o Lado B no Instagram @ladobcgoficial, Facebook e Twitter. Tem pauta para sugerir? Mande nas redes sociais ou no Direto das Ruas através do WhatsApp (67) 99669-9563 (chame aqui).

Receba as principais notícias do Estado pelo Whats. Clique aqui para entrar na lista VIP do Campo Grande News.

Nos siga no Google Notícias