Com redução de jornada ameaçando economia, surge "PEC do Salário em Dobro"
Setor produtivo reage à PEC contra "6x1" e deputado desafia governo a repassar impostos da CLT ao trabalhador
A “PEC para o fim da jornada 6x1” e 36 horas semanais de trabalho, da deputada federal Erika Hilton (PSOL-SP), já tem uma “concorrente” na Câmara dos Deputados. Desde segunda-feira (11), o deputado de MS, Marcos Pollon (PL) está buscando assinaturas para propor a “PEC dos Trabalhadores”, também chamada de "PEC do Salário em Dobro".
RESUMO
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A deputada Erika Hilton (PSOL-SP) busca retomar a discussão sobre a redução da jornada de trabalho para 36 horas semanais, enquanto o deputado Marcos Pollon (PL) propõe a "PEC do Salário em Dobro", que repassaria aos trabalhadores os impostos e encargos sobre a contratação de empregados. Setores como indústria, comércio e serviços temem impactos negativos, como aumento de custos e perda de produtividade. A PEC de Erika se baseia em estudos internacionais que apontam para aumento da produtividade e bem-estar dos trabalhadores com a redução da jornada, enquanto Pollon argumenta que a "PEC do Salário em Dobro" promoveria uma legislação trabalhista mais justa e beneficiaria tanto empregadores quanto empregados. A discussão sobre a redução da jornada de trabalho segue em debate, com diferentes visões sobre os impactos econômicos e sociais da medida.
A parlamentar tenta, na verdade, destravar a tramitação de uma PEC já existente do deputado Reginaldo Lopes (PT-MG) de 2019, defendendo a qualidade de vida dos empregados. Prevendo prejuízos para a economia, Pollon decidiu propor, então, que os valores dos impostos e encargos públicos sobre a contratação de empregados sejam repassados ao trabalhador.
A preocupação das entidades que representam os setores de indústria, comércio e serviços é o impacto da redução de jornada no volume e nos custos de produção. Para a FCDL-MS (Federação das Câmaras de Dirigentes Lojistas de Mato Grosso do Sul), a mudança é um “risco para a estabilidade financeira das empresas”.
A proposta é “estapafúrdia” na avaliação da Abrasel (Associação Brasileira de Bares e Restaurantes). A ACICG (Associação Comercial e Industrial de Campo Grande) alerta para “uma redução significativa na produção, aumento dos preços e, consequentemente, inflação” caso a jornada seja reduzida e afirma que “o tema de extrema complexidade tem sido discutido de forma superficial, sem a devida consideração das consequências profundas que poderá trazer para a economia e o setor empresarial”.
Argumentos da PEC pelo fim da escala 6x1
Após a cópia do texto da PEC 221/2019 que diz “duração do trabalho normal não superior a oito horas diárias e trinta e seis horas semanais”, a deputada Erika complementa: “com jornada de trabalho de quatro dias por semana”. A conta não fecha, pois 36 horas com 8 por dia teriam que ser feitas em 4 dias e meio.
O texto da deputada, que já tem 171 assinaturas entre os 513 deputados, finaliza com o trecho da PEC 221: "[...], facultada a compensação de horários e a redução de jornada, mediante acordo ou convenção coletiva de trabalho".
Propondo entrar em uma discussão sobre o viés econômico da PEC, a justificativa de Erika diz: “As disputas pelo tempo de trabalho que precisam sempre ser atravessadas pelas dimensões do impacto econômico dessas decisões”.
Em seguida, a deputada cita uma afirmação da economista do Cesit (Centro de Estudos Sindicais e Economia do Trabalho) da Unicamp, Marilane Teixeira, prevendo que, com mais tempo livre, os trabalhadores vão “aproveitar melhor o tempo, inclusive consumindo mais” e por isso a “atividade econômica também melhorará”.
A afirmação é retirada de um texto em formato de reportagem publicado no site da CUT (Central Única dos Trabalhadores), conforme a justificativa.
A afirmação da economista brasileira é baseada em “experiências internacionais” de que reduzir a jornada, ao invés de aumentar custos, aumenta a produtividade. “As pessoas trabalham mais felizes, mais satisfeitas e o que se faz em 44 horas, se faz em 40 horas. O que se faz em cinco dias, se faz em quatro”, diz a pesquisadora no texto da CUT.
“A economista Marilane Teixeira, da Unicamp, entende que com a adoção da redução da jornada de trabalho sem redução dos salários, como consequência teríamos o impulsionamento da economia brasileira e a redução de desigualdades, à medida que o aumento do consumo demandaria maior produção de serviços, resultando em mais contratações”, diz a justificativa da deputada.
A deputada afirma, ainda, que um experimento de redução de jornada no Reino Unido resultou em aumento médio de 35% na receita das empresas e a taxa de rotatividade dos empregados reduziu 57%.
Já no Brasil, o programa piloto de implementação de jornada de 4 dias é doReconnect Happiness at Work em parceria com a 4 Day Week Global e Boston College, que teve início em setembro de 2023. "Cerca de 22 empresas com até 250 colaboradores aderiram à iniciativa", conforme a deputada.
Neste caso brasileiro, os resultados positivos elencados pela deputada não abrangem a questão do impacto econômico. Apesar disso, Erika defende a redução de jornada sem diminuição de salários.
Entenda por que o setor produtivo é contra
O argumento com referências de experiências de redução de jornada de trabalho internacionais não convence os setores produtivos, que explicam por que são contra a medida.
A presidente da FCDLMS (Federação das Câmaras de Dirigentes Lojistas de Mato Grosso do Sul), Inês Santiago, critica a proposta e faz previsões de prejuízos para empresas e trabalhadores.
“O que gera emprego é o desenvolvimento econômico impulsionado por políticas públicas favoráveis, não é a redução da jornada de trabalho, como quer a PEC. A mudança vai gerar custos adicionais e impactar até mesmo na produção. Com isso, o empregador teria que contratar mais trabalhadores, onerando a sua folha, para dar conta da mesma demanda diária e, consequentemente, terá que fazer cortes em outras áreas da empresa”, comenta Inês.
Presidente executivo da Abrasel, Paulo Solmucci Júnior classificou a ideia como “estapafúrdia” e prevê que a medida eleve os preços de produtos e serviços em 15%, caso seja implementada.
A ACICG destaca que a mudança pode impactar a arrecadação governamental e que nos países em que a jornada de trabalho de quatro dias ocorre, a modalidade é, em grande parte, adotada por startups e empresas de TI e, nessas localidades, o descanso semanal não é remunerado.
“Aplicar essa lógica em setores tradicionais, como a indústria, supermercados, farmácias, entre outros, é impraticável e poderia causar grandes disrupções, levando a problemas como a perda de eficiência, dificuldades em atender aos consumidores e potenciais aumentos de custos operacionais”, argumenta a ACCIG, além de lembrar que a produtividade da força de trabalho no Brasil é inferior à média global, especialmente quando comparada aos países que adotaram a semana de trabalho reduzida.
Para a associação, as leis não deveriam “engessar” o setor, mas “flexibilizar e melhorar a relação entre empregador e colaborador, proporcionando um ganha-ganha para ambos os lados”.
Opinião dos deputados
Além de Pollon, Beto Pereira (PSDB), Luiz Ovando (PP) e Rodolfo Nogueira (PL) não assinaram o texto para a nova PEC de Erika.
Vander Loubet (PT) admite que ainda tem que ser feita uma ampla discussão sobre os impactos econômicos da PEC, mas argumenta que “o mundo todo está discutindo isso”.
“É natural essa reclamação [dos setores econômicos], até porque ainda é uma PEC. Vai ter que tramitar nas comissões, o que estamos colhendo agora são assinaturas, vai ter espaço para diálogo e entendimento. É momento de se debater, é legítimo o direito dos trabalhadores. Ninguém tem ainda um modelo pronto, vamos estar debatendo e discutindo nas comissões e no plenário”, diz Vander.
A deputada Camila Jara (PT) cita resultados positivos relacionados ao engajamento, produtividade e bem-estar dos empregados da mesma pesquisa evidenciada por Erika na justificativa da PEC.
“Essa é uma defesa histórica do PT e a verdade é que o nosso País está bem atrasado nesse debate”, diz Camila.
Nas conclusões, a publicação da Reconnect Happiness at Work & Human Sustainability em parceria com a EAESP (Escola de Administração de Empresas de São Paulo) da FGV (Fundação Getúlio Vargas) e outras organizações, diz que “em termos financeiros, a análise dos dados de receita e lucro mostrou uma tendência positiva, embora seja necessário reconhecer que esses resultados não podem ser atribuídos exclusivamente à semana de 4 dias”.
O programa piloto explica que a melhora no desempenho financeiro pode ser influenciada por múltiplos fatores e, portanto, “deve ser interpretada com cautela”. “Diante dessas conclusões, 46,2% das empresas optaram por manter a redução horária no mesmo formato, enquanto outras preferem estender o piloto ou ajustar o modelo conforme suas necessidades específicas”, revela a única publicação de experimento citada como base da justificativa do projeto.
O deputado Dagoberto Nogueira (PSDB) é a favor da derrubada da jornada de 6 dias de trabalho e apenas um de folga, mas não a favor de 4 de trabalho e 3 de descanso. Ele espera que os parlamentares cheguem a um meio termo com “uma compensação para o lado empresarial”.
“Eles precisam diminuir os encargos sociais. Diminuindo os encargos sociais, esse empregador pode contratar mais empregados, ou seja, essa proporção de 6x1 aumenta o número de trabalhadores e melhora também a qualidade de vida desses trabalhadores. Então é uma PEC que pode ajudar tanto os trabalhadores, quanto os empresários”, diz Dagoberto.
O deputado Geraldo Resende (PSDB) assinou a lista de apoio para que a PEC seja apresentada, pois acredita que o tema tem que ser discutido, ouvindo a sociedade e setores envolvidos, mas ainda não teve acesso ao texto, porque está retornando de uma missão oficial na Europa, segundo sua assessoria.
“PEC do Salário em Dobro”
Em resposta à articulação para fazer ressurgir a discussão sobre redução na jornada e para evidenciar os impactos, Pollon propõe a “PEC dos Trabalhadores”, que assegura o repasse integral, sem deduções, dos valores arrecadados pelo Estado em impostos e encargos públicos sobre a contratação de empregados pelo regime da CLT (Consolidação das Leis do Trabalho), destinados diretamente aos trabalhadores, visando a melhoria de sua condição social.
"Desafio os populistas de plantão, que assinaram pela tramitação dessa PEC a assinarem outra PEC, essa de minha autoria, que visa zerar o imposto da CLT e assim valorizar o rendimento do trabalhador. A ‘PEC do salário em dobro’, proposta nossa e que estou colhendo as 171 assinaturas também", diz Pollon.
O deputado justifica que o objetivo da PEC é promover uma legislação trabalhista mais justa e focada no bem-estar social, beneficiando tanto empregadores quanto empregados.
"É uma iniciativa que reforça o compromisso do Estado com a transparência e a responsabilidade no uso dos recursos públicos, voltando-se para o fortalecimento dos direitos e da proteção social dos trabalhadores", diz a justificativa do texto base da PEC.
O deputado Luiz Ovando (PP) acredita que a PEC representa uma "armadilha" para o mercado de trabalho, podendo resultar em desemprego, corte de salários e maior dependência dos trabalhadores em relação ao governo. "Isso forçaria uma jornada de quatro dias por semana sem nenhuma preocupação com as consequências", disse o parlamentar.
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