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Os filhos do falecido devem dividir a herança com a madrasta?

Por Valnice de Oliveira (*) | 01/07/2025 13:30

Passados cinco anos do falecimento de Teresa, inventário encerrado, bens já partilhados entre os seus três filhos, Pedro, o viúvo, já dono de um considerável patrimônio, casa-se em segundas núpcias com Verônica. O casamento de Pedro e Verônica, que durou 27 anos, tendo o fim com o falecimento de Pedro, foi sob o regime da comunhão parcial de bens.

Pergunta-se: será que esse considerável patrimônio de Pedro, que já possuía antes mesmo de se casar com Verônica, deverá ser partilhado entre os seus filhos e a viúva? Os enteados terão que dividir a herança deixada pelo pai com a madrasta?

Para responder a essa pergunta, será preciso percorrer um pouco sobre o direito sucessório e suas regras.

Pois bem. Há uma ordem de chamada dos herdeiros, a “ordem da vocação hereditária”, que está descrita nos artigos 1.829 ao 1.844 do Código Civil.

Em primeiro lugar, são chamados para receberem a herança do(a) falecido(a), os seus descendentes (os filhos, ou netos, ou bisnetos), juntamente com o(a) viúvo(a). Quer dizer, a herança será dividida entre descendentes e viúvo(a). No entanto, se o regime de bens do casamento do(a) viúvo(a) com o(a) falecido(a) for o da comunhão universal de bens ou for o da separação obrigatória de bens ou for o da comunhão parcial de bens e, sendo este, o(a) falecido(a) não era proprietário de bens adquiridos antes do casamento, o(a) viúvo(a) não será chamado(a) para herdar, a herança ficará somente com os descendentes (Código Civil, 1.829, I).

Portanto, são três as situações que, se existirem, não darão ao(a) viúvo(a) o direito de herdar junto com os filhos do(a) falecido(a): 1. Se o regime de bens do casamento tiver sido o da comunhão universal de bens; 2. Se o regime de bens do casamento tiver sido o da separação obrigatória de bens; 3. Se o regime de bens do casamento tiver sido o da comunhão parcial de bens e o(a) falecido(a) não era proprietário de bens, quando do casamento.

Em segundo lugar, não havendo quaisquer descendentes, no entanto havendo ascendentes, estes é que serão chamados para receberem a herança (primeiramente os pais, na falta desses, os avós), juntamente com o(a) viúvo(a), ou seja, a herança será dividida entre ascendentes e o(a) viúvo(a). Nessa situação, não importa o regime de bens do casamento, não há qualquer exceção, o(a) viúvo(a) sempre será chamado(a), para herdar junto com os ascendentes do(a) falecido(a) (Código Civil, 1.829, II).

Em terceiro lugar, não havendo quaisquer descendentes, nem ascendentes, será chamado apenas o(a) viúvo(a). A herança ficará toda para o(a) viúvo(a) e não importa qual tenha sido o regime de bens do casamento (Código Civil, 1.829, III).

Por último, não deixando a pessoa falecida nem descendentes, nem ascendentes, nem esposo(a)/companheiro(a), serão chamados para receberem a herança, os colaterais (irmãos, sobrinhos ou tios) (Código Civil, 1.829, IV).

Agora, voltemos à pergunta: os filhos do falecido devem dividir a herança com a madrasta? Logicamente que a pergunta também poderia ser: os filhos da falecida devem dividir a herança com o padrasto?

E a resposta é: depende. Porque o direito não é uma ciência exata. Tem regras e exceções às regras, e exceções às regras das regras...

No exemplo de hoje, Verônica foi casada com Pedro sob o regime da comunhão parcial de bens, e Pedro já tinha bens antes do casamento (que são os chamados bens particulares). Nessa situação e somente nessa situação, Verônica tem direito à herança de Pedro, todo o patrimônio que ele já possuía antes do casamento será dividido em partes iguais entre ela e seus enteados, ou seja, um quarto para cada um.

Não seria assim, se o casamento de Verônica com o Pedro tivesse sido sob o regime da comunhão universal de bens ou sob o regime da separação obrigatória de bens ou se casada no regime da comunhão parcial de bens, Pedro não tivesse bens particulares (bens adquiridos antes do casamento) (Código Civil, 1.829, I).

Muito importante esclarecer que, no exemplo dado, o casamento de Pedro e Verônica só pode ser no regime da comunhão parcial de bens, porque foi feito o inventário da Tereza (primeira esposa de Pedro) e partilhada a sua herança com os filhos. Porque, caso o inventário de Teresa não houvesse sido feito e partilhados os bens, Pedro e Verônica não poderiam se casar no regime da comunhão parcial de bens, teriam que se casar obrigatoriamente no regime da separação de bens e, consequentemente, Verônica não herdaria junto com os enteados a herança deixada por Pedro (Código Civil, 1.523, I e 1.641, I)

Conhecer e ter domínio sobre todas as regras e exceções do direito sucessório evita grandes prejuízos de ordem financeira, econômica, patrimonial, e por que não dizer, de ordem emocional. Caso precise tratar dessas coisas da vida, procure por um(a) advogado(a) especialista em direito sucessório.

Ficou curioso(a) para saber porque no regime da comunhão universal de bens, o(a) viúvo(a) não tem direito à herança do(a) falecido(a)? Assunto para um próximo artigo.

(*) Valnice de Oliveira, advogada especialista em direito de família e sucessões

 

Os artigos publicados com assinatura não traduzem necessariamente a opinião do portal. A publicação tem como propósito estimular o debate e provocar a reflexão sobre os problemas brasileiros.

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