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Capivara Criminal

"Alvo vivo" do PCC, Felipe saiu da prisão para retirar balão gástrico

Piloto, que transportou para a morte líderes da facção, é implicado em ação contra chefe do tráfico em MS

Marta Ferreira | 25/04/2021 07:45
Felipe de Moraes quando foi preso, em maio de 2018. Nessa época, já usava balão intragástrico, que deveria ter sido trocado no mesmo ano, mas não foi. (Foto: Mais Goiás)
Felipe de Moraes quando foi preso, em maio de 2018. Nessa época, já usava balão intragástrico, que deveria ter sido trocado no mesmo ano, mas não foi. (Foto: Mais Goiás)

Daqui uns dias, na metade de maio, faria três anos que o piloto Felipe de Morais, de 34 anos, estava “morando” em cela da penitenciária federal de segurança máxima de Campo Grande. Mas há uma semana, depois de alegadas tentativas de suicídio e greve de fome no período passado na prisão, ele conseguiu autorização da Justiça para sair.

Quarenta e quatro quilos mais magro do que quando entrou, agora está livre. Ou melhor, não tanto. Foi quase que direto para o hospital, fazer cirurgia de emergência, além de ser considerado traidor da facção criminosa PCC.

Ou seja, neste momento se recupera de uma cirurgia, além der alvo vivo na lista da máfia acostumada a eliminar seus detratores.

 Conhecido durante muito tempo como “Piloto do PCC”, condição negada por ele e sua defesa, Felipe foi quem transportou para a morte, de helicóptero, outros dois sentenciados pela facção, as lideranças "Gegê do Mangue e Paca", sob suspeita de desviar recursos do “partido” criminoso.

PIloto desde os 22, Felipe aparece no comando de helicóptero. (Foto: Reprodução da internet)
PIloto desde os 22, Felipe aparece no comando de helicóptero. (Foto: Reprodução da internet)

As execuções brutais ocorreram em fevereiro de 2018, no Ceará. Preso em Goiás, em maio do mesmo ano, o piloto chegou a dar entrevista à TV Record falando do temor de ser assassinado.

Você tem medo de morrer?”, indaga a repórter. “Muito”, responde o preso.

De lá para cá, a defesa, a cargo da mãe advogada, tentou inúmeras vezes tirar Felipe da penitenciária federal em Campo Grande.

Com a liberdade conseguida, os dois vão ter de, literalmente, “sumir no mapa”. Não dão entrevista, porque é tudo sigiloso, por questão de segurança.

E agora ? – A investigação jornalística da coluna mostra que a questão de saúde era relativamente simples, embora exigisse solução rápida. Felipe usava desde 2017 balão intragástrico, dispositivo colocado no estômago no tratamento contra obesidade.

O material venceu em novembro de 2018. Segundo a  Capivara Criminal descobriu, acabou se rompendo no tempo de cácere. O homem, com 94 quilos quando chegou na penitenciária, saiu de lá com 54. Agora, estaria perto dos 60 quilos.

Corria o risco o balão rompido atingir órgãos, provocando ruptura ou infecção fatal. Diante disso, o Tribunal de Justiça do Ceará, responsável pelo mandado de prisão em vigor contra o preso, o liberou na sexta-feira (16). Foram validados assim, termos do acordo de colaboração com  as autoridades.

Na quinta-feira (22), foi feita tomografia para identificar onde estava o balão no sistema digestivo. Na sexta-feira (23), foi submetido a cirurgia. Já recebeu alta. Não sabe onde fez a operação, nem para onde foi levado.

Felipe de Morais, de piloto milionário aos 30 anos, depois de começar aos 22 os voos para o crime,  passa a ser protegido pelo estado.

Colaborador – Para isso, fez delação premiada no Ceará, que durante mais de ano foi negada,  a despeito de a defesa do preso insistir na previsão de responder em liberdade pelas acusações, em troca das informações reveladas.

As autoridades só admitiram quando foi feita a operação “Rei do Crime”, em setembro do ano passado, revelando esquema bilionário de lavagem do dinheiro para o PCC.

Com a ajuda das informações dadas por Felipe, a persecução investigatória localizou José Carlos Gonçalves, o “Alemão”, acusado de lavar dinheiro do crime organizado, a serviço da sintonia final do PCC, como é chamada a diretoria da organização surgida nos presídios.

"Alemão" foi indicado como dono do helicóptero vermelho e preto usado para o assassinado dos desafetos. A investigação da Polícia Federal sustenta, ainda, que ele mantinha vínculo direto com Marco Williams Herbas Camacho, o "Marcola", de 53 anos, chefe da facção, isolado há anos em presídio do interior de São Paulo, mas ainda assim tido como cérebro na "irmandade" do crime.

Daí vem a explicação do quanto o piloto, e a mãe por consequência, são arquivos vivos. Eles estão em "lugar incerto e não sabido", dessa vez com autorização judicial. Todo o tempo, a alegação  de Felipe foi de ter feito o tal “voo da morte” sob ameaça de líderes faccionados.

Morto em 2017, "Jeffinho" foi quem contratou Felipe de Moraes, segundo piloto, para atuar em grupo acusado de tráfico em MS. (Foto: Reprodução das redes sociais)
Morto em 2017, "Jeffinho" foi quem contratou Felipe de Moraes, segundo piloto, para atuar em grupo acusado de tráfico em MS. (Foto: Reprodução das redes sociais)

E o que MS tem com isso? – Felipe tem relação com Mato Grosso do Sul não apenas por ter sido transferido para Campo Grande quando foi preso em 2018 por participação nas mortes e “Gegê do Mangue” e “Paca”. Também é acusado de atuar transportando drogas, dinheiro, e fazendo “táxi aéreo” para os passeios da quadrilha de tráfico de drogas liderada pelo subtenente da Polícia Militar Silvio Cesar Molina Azevedo, 48 anos, com sede em Mundo Novo.

A cidade é vizinha ao Paraná, corredor do tráfico no Brasil, e limítrofe ao Paraguai, fornecedor de drogas. O PCC trava guerra para dominar o crime organizado nessa região.

A organização, segundo a Polícia Federal, abarcava toda a família de Sílvio Molina, além de outros comandados. São duas dezenas de réus, a maioria presos, em consequência da operação "Laços de Família", feita em junho de 2018.

Sílvio está no presídio federal de Mossoró (RN). A mulher e a filha, que chegaram a ficar presas, foram inocentadas e soltas.

Felipe também fez colaboração premiada nesse caso, conseguindo o alvará de soltura da Justiça Federal em Mato Grosso do Sul. Nas declarações feitas em acordo registrado pela Polícia Federal, afirmou ter sido contratado para atender a família de Silvio Molina por meio do filho do subtenente, Jefferson Henrique Piovezan Molina Azevedo, o “Jeffinho”, executado no Centro de Mundo Novo em junho de 2017. O jovem tinha 25 anos. O crime não tem culpado oficial até hoje.

 “Turquinho” ou “Turcão” foram nomes relevados por Felipe em sua delação premiada como a pessoa que seria suspeita da execução de “Jeffinho”.  Detalhes da apuração desse assassinato nunca forma revelados pelas autoridades.

Os processos derivados da "Laços de Família" seguem em andamento na Justiça Federal. Já foram feitas tentativas até no STF (Supremo Tribuna Federal) para liberar o policial militar, sem êxito.

A vida de ostentação da família sempre chamou atenção, com fotos de carros, viagens e festas caras, sendo um ponto de partida para o inquérito policial. Foram apreendidos bens avaliados em mais de R$ 60 milhões.

O homem apontado como chefe do esquema que usava o mesmo piloto que as lideranças do PCC ainda recebe salário normalmente da Polícia Militar. São R$ 10,1 mil brutos. Sua defesa alega não haver provas de sua atuação à margem da lei.

Filha de Silvio Molina posa ao lado de Ferrari no dia do casamento. (Foto: Reprodução das redes sociais)
Filha de Silvio Molina posa ao lado de Ferrari no dia do casamento. (Foto: Reprodução das redes sociais)

(*) Marta Ferreira, que assina a coluna “Capivara Criminal”, é jornalista formada pela UFMS (Universidade Federal de Mato Grosso do Sul), chefe de reportagem no Campo Grande News. Esse espaço semanal divulga informações sobre investigações criminais, seus personagens principais, e seu andamento na Justiça.

Participe: Se você tem alguma sugestão de história a ser contada, mande para o e-mail marta.ferreira@news.com.br. Você também pode entrar em contato pelo WhatsApp, no Canal Direto das Ruas, no número  67 99669-9563.

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