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Capital

Aposentado há 1 mês, mestre de obras morre após Samu negar socorro

Lidiane Kober | 21/03/2014 18:25
José foi velado hoje em igreja evangélica, localizada no Bairro Tiradentes (Foto: Marcos Ermínio)
José foi velado hoje em igreja evangélica, localizada no Bairro Tiradentes (Foto: Marcos Ermínio)

Duas semanas após um pai denunciar recusa de atendimento do Samu (Serviço de Atendimento Médico de Urgência) ao filho de 8 anos, uma segunda família campo-grandense vive este mesmo drama. Ontem, enquanto cantava hinos de louvores com a mulher, José Gonçalves Moreira, de 56 anos, começou a passar mal e, depois de esperar 3,5 horas pelo socorro, morreu na Upa (Unidade de Pronto-Atendimento) do Bairro Universitário e da Avenida Guaicurus.

Segundo a filha de José, a microempresária Deyse Tassili Aguiar, de 31 anos, o drama começou por volta das 19h10 de quinta-feira (20). “Minha mãe ligou desesperada, falando que meu pai desmaiou”, contou. Imediatamente, ela acionou o Samu para socorrer o pai, em sítio, próximo a assentamento situado no Distrito de Anhanduí, a 55 quilômetros de Campo Grande.

Pouco tempo depois, Deyse voltou a acionar o serviço para informar providência melhor. “Para agilizar o atendimento, conseguimos carona até o posto militar de Anhanduí, liguei para o Samu e disse que iríamos esperá-los no local, que é de acesso mais fácil”, relatou.

Após esperar mais de uma hora pelo atendimento e de ouvir por telefone o desespero da mãe, a microempresária voltou a acionar o Samu para questionar os motivos da demora. “Foi quando eles me informaram que não tinha ocorrência nenhuma em meu nome e que não teria ambulância disponível para socorrer o meu pai”, disse.

A informação indignou Deyse. “Custava ter me dito desde a primeira ligação que não tinha ambulância? Se soubesse desde o princípio, a gente teria dado um jeito de ajudar o meu pai”, frisou. Para piorar a situação, a atendente passou a ligação para um médico orientar a família. “Neste momento de desespero, ele não teve a mínima consideração e foi extremamente grosseiro, então, para evitar confusão, desliguei na cara dele”, acrescentou.

Diante da negativa do Samu, segundo a filha de José, um policial militar se sensibilizou com o drama e se ofereceu para conduzir a vítima até à Upa. “Naquele momento, meu pai ainda respirava”, garantiu. Mas, às 22h36, ao chegar à unidade de saúde, ele já não vivia mais. “Não coloco a culpa da morte do meu pai no Samu, acredito que, quando é a hora da gente não tem jeito, só queria mais dignidade ao meu pai nesta hora”, comentou Deyse.

Versão do Samu – Coordenador suplente do Samu, André Barros atribuiu a demora à falta de ambulância para socorrer José. “Todas as nossas viaturas estavam em atendimento, inclusive a unidade de Anhanduí. Damos prioridades aos estados mais graves, mas não tem como largar uma vítima que já está no carro na rua”, alegou.

Segundo ele, o primeiro contato de Deyse ocorreu às 19h24. “A família cometeu um erro de acionar o socorro de outro local, por isso, não conseguimos verificar ao certo as condições de saúde do paciente”, comentou. Para Barros, outro erro foi ligar novamente para mudar o endereço do atendimento. “Entendemos que eles estavam em deslocamento e nos concentramos em procurar um hospital”, completou.

O coordenador do Samu informou ainda que a vítima já estava em estado terminal por causa de patologia grave. De acordo com a filha de José, o pai tratava de uma infecção no intestino. “O médico dele disse que a doença não foi a causa da morte”, afirmou Deyse. Ainda segundo ela, o diagnóstico do óbito só sairá em cinco dias.

Sobre o Samu, Barros relatou que, das 19 ambulâncias, 13 estão em condições de uso para atender em torno de 1,5 mil chamados diários. “Entre as ligações, também tem trote e orientações médicas”, ponderou. Ele admite que a equipe é insuficiente. “Por isso, a nova gestão da prefeitura já decretou prioridade número 1 aprimorar o atendimento”, emendou.

Recém-aposentado – José morreu após enfrentar uma peregrinação por auxílio doença. “Depois de pelejarmos muito, esse foi o primeiro mês que ele recebeu o benefício”, afirmou Deyse. “Antes de ficar doente, ele sempre trabalhou muito como mestre de obras em Campo Grande”, acrescentou.

A filha contou ainda que o pai sempre viveu com alegria e disposição. “Era um homem trabalhador, honesto, bom pai e bom esposo”, disse. Segundo ela, na hora que começou a passar mal, ele conversava com a mulher. “Ele sentia fortes dores nas pernas e minha mãe estava o massageando e, juntos, eles cantavam hinos de louvor”, relatou.

Agora, os filhos vão trazer a mãe do sítio para morar com eles na cidade. José deixou cinco filhos, dois em Campo Grande, dois em São Paulo e um em Curitiba, além de sete netos.

Ainda sobre o futuro, Deyse avisou que lutará por Justiça. “Vou registrar Boletim de Ocorrência e abrir processo contra o Samu”, declarou. “Saúde não é brincadeira, uma vida se perdeu e, em meio a essa dor, recebi atendimento péssimo”, finalizou. José foi velado nesta sexta-feira (21), em igreja evangélica, localizada no Bairro Tiradentes.

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