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Capital

Clandestino, bairro tem prazo para “virar” cidade ou ser demolido

Demolição só pode ocorrer após a imobiliária indenizar a todos que têm contrato

Aline dos Santos | 12/07/2016 13:24
Pelas ruas de terra, se espalham casa e conveniências.  (Foto: Marina Pacheco)
Pelas ruas de terra, se espalham casa e conveniências. (Foto: Marina Pacheco)
Para João, decisão judicial pode sensibilizar a prefeitura. "Pode ser bom", diz  (Foto: Marina Pacheco)
Para João, decisão judicial pode sensibilizar a prefeitura. "Pode ser bom", diz (Foto: Marina Pacheco)

Em 2017, quando completa duas décadas, o Portal da Lagoa pode ganhar o presente de “virar” cidade ou ser posto abaixo e voltar a ser pasto.

As possibilidades foram abertas por uma decisão judicial, que estabeleceu o limite de 31 de agosto do ano que vem para um desfecho do loteamento irregular, onde vivem entre 400 e 700 famílias. O primeiro número é fornecido pelo processo. O segundo foi informado por moradores. 

A decisão judicial circula de mão em mão pelo bairro, que fica na saída para Rochedinho, colado no São Caetano, a curta distância da avenida Tamandaré, mas é, oficialmente, zona rural de Campo Grande.

Pelas dez ruas onde o vento levanta a areia, sobrados se cruzam com imóveis em construção e igrejas e conveniências predominam na área comercial, as reações dos moradores vão da preocupação ao otimismo.

“Será que vão ter o dinheiro para pagar o que investi. O que o juiz vai decidir sobre isso”, questiona Luiza José Batista, 60 anos. Ela chegou ao loteamento em 2001, quando comprou terreno da Correta Empreendimentos Imobiliários. Atualmente, Luiza mora e é dona de uma conveniência no bairro. Ela e familiares têm 12 terrenos no local.

A Correta comercializou lotes de um condomínio, após promessa do município de que a área seria urbanizada. Contudo, a promessa nunca se efetivou e os moradores têm uma rotina sem CEP (Código de Endereçamento Postal), sem pagamento de IPTU (Imposto Predial Territorial Urbano) e sem documentação das casas.

Bairro fica na saída para Rochedinho. (Foto: Marina Pacheco)
Bairro fica na saída para Rochedinho. (Foto: Marina Pacheco)
“O carteiro não tem como entrar", explica Jesusa sobre a falta de CEP nos imóveis). (Foto: Marina Pacheco
“O carteiro não tem como entrar", explica Jesusa sobre a falta de CEP nos imóveis). (Foto: Marina Pacheco
Luiza está com a decisão nas mãos, mas teme que imobiliária não consiga pagar indenização. (Foto: Marina Pacheco)
Luiza está com a decisão nas mãos, mas teme que imobiliária não consiga pagar indenização. (Foto: Marina Pacheco)

As correspondências são entregues na associação de moradores do São Caetano, bairro vizinho, e distribuídas por uma pessoa que recebe R$ 10 por mês pelo serviço. “O carteiro não tem como entrar. Aqui é a rua Abadia Oliveira Lima, mas não tem número”, conta Jerusa Carvalho Côrrea, 54 anos, que aluga uma conveniência no bairro.

Para João Bezerra, 42 anos, vice-presidente da associação de moradores, a situação limite pode sensibilizar a prefeitura a ampliar o perímetro urbano de Campo Grande e regularizar a situação do Portal da Lagoa. “São 700 famílias, é maior que o São Caetano. Pode ser bom”, afirma.

O bairro, margeado por uma área de reserva ambiental, tem transporte coletivo, água encanada e energia elétrica.

Tudo ou nada – A ação civil pública para regularizar o loteamento foi proposta pelo MPE (Ministério Público Estadual) contra a imobiliária e tramita desde 2010 na Justiça. Na decisão do último dia 6 de julho, o juiz da 2ª Vara de Direitos Difusos, Coletivos e Individuais Homogêneos, David de Oliveira Gomes Filho, aponta a irregularidade do loteamento, “fraudando os compradores e criando um enorme problema para a Administração Municipal”.

O magistrado lembra que a promessa era morar em um condomínio fechado, servido de todos os serviços essenciais Contudo o sonho da casa própria esbarrou em um empreendimento precário, localizado em área rural e com ausência de serviços públicos.

Do pretenso condomínio, a reportagem constatou que só restaram duas colunas na entrada do bairro. A guarita foi demolida no último ano por ser ponto para uso de entorpecente.

Na entrada do bairro, restou somente colunas do que seria o residencial. (Foto: Marina Pacheco)
Na entrada do bairro, restou somente colunas do que seria o residencial. (Foto: Marina Pacheco)

De acordo com a decisão, o juiz deu prazo até agosto de 2017 para uma solução. Se o local for contemplado no plano de urbanização do município, caso os Poderes Executivo e Legislativo julguem adequado fazê-lo, a imobiliária terá prazo de três anos para criar o condomínio e entregar documentação dos imóveis.

“Caso não haja a afetação do imóvel como urbano até o último dia do mês de agosto de 2017, o cartório deverá notificar individualmente os moradores do Condomínio Portal da Lagoa no sentido de que o Poder Executivo e o Poder Legislativo decidiram por não incluir aquela área no plano diretor do Município e, em razão disto, suas propriedades serão avaliadas, indenizadas e após a indenização, serão demolidas para recompor a área ao estado anterior”, informa a decisão.

Dez milhões - Ao Campo Grande News, o magistrado salienta que a demolição só pode ocorrer após a imobiliária indenizar a todos que têm contrato e que, durante o prazo, foi aberta a possibilidade de a prefeitura e a Câmara incluir o bairro na área urbana.

A empresa foi condenada a pagar R$ 10 mil de indenização por danos morais por contrato. A Justiça também determinou a indisponibilidade de bens da imobiliária e quatro pessoas físicas até o valor de R$ 10 milhões.

A ação do Ministério Público ainda era contra a prefeitura de Campo Grande, mas, conforme a decisão, o município não foi negligente e notificou a imobiliária pelo loteamento irregular. A reportagem entrou em contato com a defesa da Correta, que informou que ainda não foi notificada da decisão.

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