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Capital

Concorrência privada e sobrecarga fazem médicos sumirem dos postos

Com debandada e descontrole sobre plantões, escalas de postos nunca fecham

Anahi Zurutuza | 17/04/2017 18:10
Recepção da UPA do Coronel Antonino lotada nesta segunda-feira; conforme a Sesau, havia 11 médicos escalados para atenderem no local (Foto: Alcides Neto)
Recepção da UPA do Coronel Antonino lotada nesta segunda-feira; conforme a Sesau, havia 11 médicos escalados para atenderem no local (Foto: Alcides Neto)

Apesar das convocações dos aprovados no último concurso e o pagamento de gratificações para estimular que médicos façam plantões nas unidades 24 horas durante o dia e nos fins de semana, as escalas dos postos de saúde não fecham. O problema é crônico e diante das várias explicações, fica difícil enxergar a solução. Mais recentemente, a debandada de 136 profissionais nos últimos três meses só complicou a situação.

O secretário municipal de saúde pública, Marcelo Vilela, explica que os médicos não precisam justificar os pedidos de demissão, que os motivos são diversos e particulares, mas principalmente têm relação com um movimento natural do início do ano. “Muitos deles passam nas provas de residência. Aí não conseguem mais conciliar os horários ou vão trabalhar fora daqui”.

Já o presidente do Sinmed (Sindicato dos Médicos de Mato Grosso do Sul), Flavio Freitas Barbosa, que é funcionário da rede pública, garante que o problema é muito maior. Ele afirma que falta estímulo financeiro e estrutura de trabalho. Desta forma, fica difícil a prefeitura concorrer com os hospitais particulares.

“Estamos há três anos sem receber 1 real de aumento, neste início de ano faltava remédio nos postos de saúde, material básico. As condições de trabalho são degradantes. O plantonista não recebe alimentação, não tem local para repouso e banho. O profissional não sente mais vontade de ficar”, afirma.

Um médico concursado recebe hoje do município R$ 2.516,72 para 12 horas por semana de trabalho, conforme a Sesau (Secretaria Municipal de Saúde Pública). Pelos plantões, a prefeitura paga R$ 830,56 para cada 12 horas trabalhadas em dias úteis pela manhã ou à tarde, R$ 913,60 para quem cumpre plantão no período noturno e R$ 996,11 para os escalados aos fins de semana e feriados. A remuneração dos plantões dos pediatras é diferente.

Flavio Barbosa cita a inauguração do Hospital da Cassems, em outubro do ano passado, e de inúmeras clínicas particulares na Capital, que absorvem a mão de obra. “A Cassems paga R$ 1,5 mil no plantão de 12 horas, R$ 1,8 mil se for aos fins de semana, a diferença é gritante. O salário-base também está muito defasado, a Fenam [Federação Nacional dos Médicos] recomenda salário de R$ 13,8 mil por 20 horas trabalhadas”.

O presidente do Sinmed defende a categoria, afirmando que a razão para médicos desistirem de um emprego com a estabilidade de um concurso é a sobrecarga de trabalho. “Dizem que ganhamos bem, que tem médico ganhando até R$ 20 mil. Tem mesmo, mas para isso, ele faz 18 plantões no mês. Significa que dos 30 dias do mês, 18 noites ele passa fora de casa. Se ele não tiver condições mínimas de trabalho, ele não vai ficar. Os colegas que estão pedindo para sair, estão exaustos”.

Descontrole – Há outros elementos para dificultar a conta que nunca fecha. O CMS (Conselho Municipal de Saúde) e o MPE (Ministério Público Estadual) recebem com frequência denúncias de que médicos não aparecem ou “desaparecem” no meio dos plantões.

Uma auditoria nas folhas de pontos, que são manuais, e pagamentos dos plantões está sendo feita, desde novembro do ano passado, a pedido do conselho. O MPE também tem investigações em aberto e processos na Justiça contra a prefeitura.

Sebastião Junior, presidente do conselho, afirma que falta organização. “Já constatamos situações de abandono de plantão e de médicos que atendem até certo limite de pacientes e deixam o restante esperando na recepção pelo próximo plantonista”, disse sem detalhes os casos.

Ele afirma que o conselho montou uma força-tarefa que nesta semana vai iniciar fiscalizações “surpresa” nos postos de saúde.

Para o presidente do conselho, a prefeitura precisa reorganizar o sistema. “Tem médico demais em alguns postos e de menos nos outros. É preciso fazer remanejamentos, as escalas têm de ser melhor planejadas e vamos cobrar isso”.

Na UPA do Coronel Antonino, sem lugar para esperar, paciente aguardavam do lado de fora na tarde de hoje (Foto: Alcides Neto)
Na UPA do Coronel Antonino, sem lugar para esperar, paciente aguardavam do lado de fora na tarde de hoje (Foto: Alcides Neto)
UPA do bairro Universitário ficou vazia neste domingo, porque pacientes foram dispensados; faltava médico (Foto: Alcides Neto/Arquivo)
UPA do bairro Universitário ficou vazia neste domingo, porque pacientes foram dispensados; faltava médico (Foto: Alcides Neto/Arquivo)

População – Enquanto isso, quem padece é a população. Na manhã de ontem, pacientes estavam sendo dispensados da UPA (Unidade de Pronto Atendimento) do bairro Universitário – no sul de Campo Grande – porque no local só havia um médico de plantão. A situação revoltou pessoas que tentaram atendimento no local.

A Sesau tem hoje 1.055 médicos, sendo que 677 possuem uma carga horária fixa e também realizam plantões eventuais. Outros 675 concursados ou convocados têm vínculo somente plantonistas.

Para tentar amenizar o problema, a secretaria tem convocado médicos aprovados no último concurso. Foram ao todo, 105 chamados. “Poderemos chamar até 146. Estamos limitados também ao limite prudencial da lei de responsabilidade fiscal”, explicou o secretário Marcelo Vilela.

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