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Capital

Em audiência, réus por decapitação negam participação no crime

Os depoimentos desta tarde foram marcados por contradições. Onze suspeitos são apontados como autores da morte de José Carlos, o “Coroa”, em novembro do ano passado

Geisy Garnes e Danielle Valentim | 08/05/2018 20:02
Réus foram ouvidos na tarde desta terça-feira no Tribunal do Júri (Foto: Danielle Valentim)
Réus foram ouvidos na tarde desta terça-feira no Tribunal do Júri (Foto: Danielle Valentim)

Foram ouvidos nesta terça-feira (8), onze dos envolvidos na morte de José Carlos Figueiredo, o
“Coroa” de 41 anos, decapitado após ser “julgado” pelo PCC (Primeiro Comando da Capital) em novembro do ano passado, em Campo Grande. O grupo presta depoimento ao juiz Aluízio Pereira dos Santos, da 2ª Vara do Tribunal do Júri na segundo audiência sobre o caso.

José Carlos e o filho, um adolescente de 16 anos, foram sequestrados pelos suspeitos no dia 18 de novembro do ano passado. Para a polícia, os réus relataram que vítima foi julgada e morta por ter negociado drogas com o Comando Vermelho e também ter agredido o filho de um dos integrantes da facção.

O adolescente de 15 anos, conhecido como Tio Patinhas, teria uma dívida de drogas com José Carlos e para “se livrar de ameaças” pediu ajuda do pai, Nilton Gauta Evangelista. A mãe do garoto também resolveu interferir na situação e pediu ajuda ao PCC.

No dia do crime, o adolescente ainda foi forçado a decapitar a vítima, para cumprir uma lei da facção: “Vida de paga com vida, sangue se paga com sangue”. Ele começou a decapitar José, que ainda estava vivo, mas não conseguiu concluir o crime. Conforme as investigações, Pamella Almeida Ribeiro, conhecida como Emonoma, “terminou o serviço”.

Os onze réus começaram a ser ouvidos às 17h30 no plenário do Tribunal do Júri e em depoimento do juiz, ao MPE (Ministério Público Estadual) e advogados de defesa, mudaram as versões apresentadas na delegacia durante as investigações sobre a execução e afirmaram não saber quem foi o autor da execução.

Respondem pelo crime: Kaio Batista de Oliveira, de 25 anos, Davyd Samuel Boaventura Salvador, de 19 anos, Nicolas Kelvin Soares Montalvão, o Gordão de 19 anos, Luan Loubet Barros, de 20 anos, Nilton Gauta Evangelista, o Pezão de 38 anos, Carolina Gonçalves de Matos, a Carol, de 37 anos, Cleia Ricarda Aveiro, a Paraguaia de 40 anos, Henrique Leandro da Silva Pelegrino, o Gordinho, de 25 anos, Denilson Bernardo de Arruda, vulgo Denis, de 24 anos, Thiago Pereira Peres, conhecido como “Sem Vulgo”, de 29 anos e Pamella Almeida Ribeiro, a Emonoma, de 29 anos.

O corpo de José foi encontrado no dia 28 de novembro (Foto: Paulo Francis)
O corpo de José foi encontrado no dia 28 de novembro (Foto: Paulo Francis)

Entenda o crime - Investigações da DEH (Delegacia Especializada de Repressão aos Crimes de Homicídio) apontaram ainda que Cleia Ricarda, a “Paraguaia”, era “sócia” de José Carlos e do filho em uma boca de fumo, mas assim que PCC descobriu que a vítima estava negociando drogas com o Comando Vermelho, a suspeita entregou a rotina do parceiro para poder ser absolvida pela facção.

Pamella, a “Emonoma”, tinha “posição de poder” dentro da facção e foi a responsável por toda a coordenação da execução, por arrumar as “cantoneiras” [casas em que as vítimas foram mantidas refém] e coordenar as equipes encarregadas do crime, tudo por telefone. Foi ela também, a autora da decapitação da vítima.

Segundo o MPE (Ministério Público Estadual), foram Kaio, Davyd Samuel e Nicolas, comandados por Cleia, sequestraram José Carlos e o filho dele no dia 18 de novembro e os levaram até uma residência no Jardim São Conrado. As vítima ficaram poucos minutos no local e foram levadas a um segundo endereço, no mesmo bairro.

A mando do PCC, pai e filho foram levados para uma terceira “cantoneira” na Vila Taveirópolis. Lá, José Carlos e o adolescente de 16 anos permaneceram por dois dias e ficaram aos “cuidados” de Carolina Gonçalves e Denilson Bernardo.

Ainda conforme o Ministério Público, Kaio, Thiago Pereira, e os adolescentes conhecidos como “Puro Ódio” e “Tio Patinhas”, ajudaram a manter a dupla em cárcere privado até o “julgamento” de José Carlos. Conforme as investigações, durante todo o tempo que esteve em poder da facções, a vítima foi agredida e torturada.

A ordem para a execução de “Coroa” foi dada no dia 22 de novembro, por Nilton Gauta Evangelista, o Pezão, pai de “Tio Patinhas” e interno da Penitenciária de Segurança Máxima de Campo Grande, onde cumpre pena pelo crime de latrocínio. O corpo de José foi encontrado no dia 23 de novembro, na região da Cachoeira do Ceuzinho. 

"Paraguaia" durante depoimento ao juiz (Foto: Danielle Valentim)
"Paraguaia" durante depoimento ao juiz (Foto: Danielle Valentim)
Viaturas da PM e dos bombeiros no local onde corpo de José foi achado (Foto: Paulo Francis)
Viaturas da PM e dos bombeiros no local onde corpo de José foi achado (Foto: Paulo Francis)

Depoimentos em audiência - Diante do juiz, Nilton negou ser o mandante do crime. Ele relatou que só foi “apontado” como autor da execução por causa do filho. “Essa acusação não existe, só chegaram até mim para me prender por causa do carro do meu filho que estava envolvido no crime. Não sei quem matou a vítima, eu não tenho envolvimento nenhum, meu único envolvimento é ser pai do menor, do tio patinhas”, disse.

Ele ainda afirmou que não conhecia a vítima e que não tinha contato com o filho há quatro anos. Já Kaio, conhecido como “Manaus”, alegou que “não sabia de nada”, mas tentou alertar José Carlos. “José tinha virado o assunto do bairro, sempre que estavamos no campinho, passava gente perguntando. E neste dia estávamos jogando bola quando vimos o José e fomos tirar satisfação. Porque ele tinha tentado matar uma criança, mas aí ele disse pra nós que tentou matar o Tio Patinhas e não a criança”, revelou.

Assim como ele, Nicolas relatou que tentou avisar a José que ele corria risco de vida e viu quando dois homens em um carro vermelho as vítimas. “Eles estavam armados e disseram que não era pra gente dizer nada. Então viramos as costas e voltamos para jogar bola, pois eu só estava naquele bairro passando um final de semana. Eu nem me importei pq na região todos já diziam que ele era má pessoa”.

Davyd lembrou que estava na casa usada pelos autores como primeira “cantoneira” e que viu as vítimas entrarem “por conta própria” na residência, com Kaio e Nicolas. Luan, assim como Davyd, confirmou que estava na primeira casa usada pelo grupo no dia do sequestro das vítimas e que as viu entrando no local. “Não sei se foram sequestrados depois. E só fiquei sabendo da morte uns 8 dias depois. Não sei quem torturou ou matou a vítima”, disse.

Já Carol confirmou participação no crime, mas negou ter visto os autores da execução. “Minha participação foi lavar o local, porque não sei quando foi morto e nem quem matou”. Ela alegou que a casa é um “fumódromo” e que o crime aconteceu no quintal da residência e que várias pessoas tiveram acesso ao local.

“Vi a vítima sendo colocada em um saco plástico. Eu vi que lavaram o sangue também”. A sétima pessoa a depor foi Cleia Ricarda Aveiro, a Paraguaia. Ela contou que por uma ligação confidencial, recebeu ordens para levar o filho de José até um clínica de reabilitação. Para isso, ela pegou um Fiat Palio emprestado e deixou o menino no local indicado, mas não sabia sobre o crime.

Na delegacia, “Paraguaia” afirmou que Kaio era “disciplina” do PCC e por isso teria decapitado “Coroa”, mas diante do juiz negou, alegou que na época tinha acabado de sofrer um aborto e não se lembrava do depoimento. “Eu nego o conteúdo do depoimento, mas a assinatura é minha. Só posso dizer que estava sob muita pressão”, disse.

Pamella também nega participação no crime, mas admite, assim como “Paraguaia” ter acompanhado o filho da vítima até a clínica de reabilitação depois que ele foi liberado do cativeiro.

“Na ligação me perguntaram se eu poderia levar um dependente químico até a recuperação. Como eu estava de condicional e não vi problema, então, resolvi ajudar. Desci do carro entrei no projeto e fiquei um tempão lá, conheci, me interessei, o tempo todo o menino me abraçou me agradeceu por ter levado ele lá. Para levar eu chamei uma Uber”, disse.

“Emonoma” confirmou que estava com Cleia no carro e identificou o autor da ligação como “Matheusinho”. “Quando eu estava nessa vida [mundo do crime] já tinha feito favores para o Matheusinho. E ele me achou por aplicativo novamente”, disse. O novo suspeito ouvido foi Henrique, que negou qualquer participação no crime.

Os réus foram denunciados por homicídio qualificado por motivo torpe e recurso que dificultou a defesa da vítima, cárcere privado, cárcere privado contra menores de 18 anos, ocultação de cádaver e organização criminosa. 

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