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Capital

Força-tarefa estuda desarquivar 15 investigações, entre elas "Caso Motel"

São crimes contra a vida que nunca tiveram mandantes e, em alguns casos, nem executores descobertos

Marta Ferreira | 04/11/2019 18:17
Murilo Alcalde e Eliane Ortiz foram encontrados assassinados em quarto de motel, mais de 14 anos atrás. (Foto: Reprodução internet)
Murilo Alcalde e Eliane Ortiz foram encontrados assassinados em quarto de motel, mais de 14 anos atrás. (Foto: Reprodução internet)

Criada em novembro de 2018, inicialmente para investigar três execuções com características semelhantes em Campo Grande, ocorridas em um período de seis meses, a força-tarefa sediada na Garras (Delegacia de Repressão a Roubo a Banco, Assaltos e Sequestros), com apoio do Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado), analisa pelo menos outros 15 crimes contra a vida e avalia pedir o desarquivamento desses casos, cujos mandantes nunca foram punidos. Em alguns casos, nem os executores.

Na lista apurada pelo Campo Grande News, chama atenção o duplo assassinato ocorrido em 21 de junho de 2005, no quarto de um motel em Campo Grande, episódio transformado, depois de mais de 14 anos, em um gigante ponto de interrogação da história policial de Mato Grosso do Sul: o “Caso Motel”.

As duas vítimas, a garota de programa Eliane Ortiz e o estudante Murilo Boarim Alcalde, ambos de 21 anos, foram encontradas mortas com sinais de asfixia. Dois policiais, um traficante e um quarto homem chegaram a ser apontados como executores, mas ninguém foi condenado.

O desfecho foi o arquivamento. Em 2014, houve anúncio de retomada, pelo MPMS (Ministério Público de Mato Grosso do Sul), porém nada de concreto foi levantado para culpar os responsáveis. O duplo homicídio chegou a ser tema de campanha contra a impunidade da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), mas segue insolúvel.

Especula-se a possibilidade de reabertura dessa investigação desde que a força-tarefa apresentou seus primeiros resultados efetivos no fim de setembro, com a Operação Omertà, que levou para a cadeia os empresários Jamil Name, 80 anos, e Jamil Name Filho, de 42, como chefes de organização criminosa dedicada ao assassinato de desafetos tanto nos negócios quanto na vida pessoal.

A reportagem confirmou essa intenção. O duplo homicídio teria ocorrido por ciúmes, mas a ligação com a milícia não foi esclarecida.

Equipes responsáveis pela investigação no condomínio de Jamil Name, preso como chefe de grupo de extermínio. (Foto: Henrique Kawaminami)
Equipes responsáveis pela investigação no condomínio de Jamil Name, preso como chefe de grupo de extermínio. (Foto: Henrique Kawaminami)

Delegado polêmico - Executado no dia 25 de junho 2013, aos 55 anos, o advogado e delegado aposentado Paulo Magalhães escreveu, por diversas vezes em artigos postados no site da organização Brasil Verdade, mantida por ele, que o “Caso Motel” teve apuração deficiente. A morte do policial também faz parte das execuções no radar da força-tarefa.

Em relação a esse homicídio, há um condenado, o ex-guarda civil José Moreira Freires, 46 anos, julgado pelo tribunal do júri em agosto do ano passado e sentenciado a 18 anos e meio de prisão. Outro acusado, o também ex-guarda Antonino Benites Cristaldo, 42 anos, foi inocentado, porém houve recurso e a determinação de novo julgamento pelo Tribunal de Justiça. A fase atual é de recursos.

Conforme divulgado durante o processo, Cristaldo, conhecido como Tony, fazia a “escolta” de Freires no dia do assassinato, cometido em frente à escola onde Magalhães buscava a filha, no fim de tarde. O pistoleiro, conforme a peça acusatória da promotoria, estava na garupa de motocicleta vermelha, pilotada por Rafael Leonardo dos Santos, 29 anos.

Surge aí vítima de crime com requintes de crueldade cujos culpados jamais apareceram, e que também pode voltar a ser tratado. No dia 20 de agosto de 2013, logo depois de ser determinada a prisão de Freires pela morte do delegado, confessada por ele espontaneamente, o corpo de Rafael Leonardo foi encontrado mutilado no lixão de Campo Grande. Estava sem braços e pernas.

Embora cite que ele foi morto por ser considerado o “mais fraco” entre os envolvidos na morte do delegado, e atribuir ao crime um “recado” a outros participantes, a investigação foi arquivada, em junho do ano passado, sob o argumento de não haver indícios suficientes para apontar responsáveis.

Carro do delegado aposentado Paulo Magalhães, no local da execução, em 2013.
Carro do delegado aposentado Paulo Magalhães, no local da execução, em 2013.

José Moreira Freires, o Zezinho, está foragido. Não é visto desde abril deste ano, depois da morte de Matheus Coutinho Xavier, 20 anos, assassinado no lugar do verdadeiro alvo, o pai, o capitão da Polícia Militar Paulo Roberto Xavier. Para o Gaeco e a Garras, integrava, junto com Juanil Miranda Lima, outro ex-guarda civil municipal, o núcleo ao qual cabia a tarefa de executar os inimigos da organização criminosa. Ao todo, são relacionados 4 núcleos, com participação de 15 agentes públicos de segurança.

Um dos inimigos eliminados, conforme desconfia a força-tarefa, era Andrey Galileu Cunha, executado em 23 de fevereiro de 2012, aos 31 anos, por dupla em motocicleta. Zezinho foi citado como suspeito dessa execução, é mais um inquérito sem solução no foco do Garras e do Gaeco.

O caso foi arquivado definitivamente pela 1ª Vara do Tribunal do Júri de Campo Grande em 17 de julho do ano passado, atendendo a pedido do MP, depois de a polícia civil encerrar os trabalhos sem indicar atiradores ou mandantes.

Na decisão em que o inquérito é posto na geladeira judicial, está escrito que durante as apurações pela DEH (Delegacia Especializada de Homicídios) foram identificadas duas linhas de apuração, sem elementos suficientes para denúncia. Uma das linhas citava Andrey, que havia sido preso por envolvimento com jogos de azar pela Polícia Federal, como alvo da família Name. Ele teria sido delator de uma operação contra a máfia dos jogos.

Sob análise – Entre os casos arquivados, esses são os mais rumorosos identificados pela reportagem em análise para uma nova investigação. Há, ainda, episódios mais antigos, um deles da década de 1980, já prescrito. Para todos os crimes, será feita análise sobre o prazo em que culpados não podem mais ser responsabilizados, conforme a lei brasileira. Além disso, um novo andamento vai depender de haver elementos fortes para convencer a Justiça de que é possível identificar acusados.

Em caso de homicídios, tanto para quem atira quanto para quem encomenda, o prazo máximo de prescrição é 20 anos, porém há mudanças da contagem dependendo da fase da peça processual ou investigatória. Em todos os arquivamentos, é anotada a possibilidade de retomada do andamento se houver justificativa.

Conforme levantado pela reportagem, a prioridade dos delegados e promotores é fazer as denúncias dos crimes para os quais foi criada a força-tarefa, em estágio mais avançado.

Quando houve a criação do grupo especial, a motivação foram as mortes do policial militar Ilson Martins Figueiredo, 62 anos, em junho do ano passado, de Orlando da Silva Fernandes, o “Bomba”, 41 anos, morto em outubro do ano passado e apontado como ex-chefe de segurança do traficante Jorge Rafaat, esse executado em 2015, além do homicídio do empresário Marcel Hernandes Colombo, o “Playboy da Mansão”, 31 anos, vítima de atiradores no dia 26 de outubro de 2018.

Neste ano, em abril, mais um assassinato foi acrescentado ao trabalho investigativo, o de Matheus Xavier. Há ainda, um quinto caso nessa listagem mais recente, o assassinato do empresário Cláudio Simeão, do ramo da mineração. Vítima aos de 48 anos, ele foi atingido quando saia de casa, em 15 de novembro do ano passado, no Jardim Bela Vista. O filho, de 22 anos, também foi ferido gravemente.

As apurações são comandadas por cinco delegados no Garras e cinco promotores no Gaeco. Ninguém quis dar entrevista. Na delegacia, a informação é de que tudo é sigiloso para proteger o trabalho e os responsáveis por ele. No Gaeco, a resposta sobre pedido de informação sobre a possibilidade de reabertura de casos arquivados é que “a investigação dos homicídios está a cargo dos respectivos inquéritos policiais que estão no GARRAS. Porém, nada impede que o MP/GAECO atue neles".

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