Homem recorre à Justiça para não ser preso por plantar maconha em casa
Aos 44 anos, ele alega sofrer dores crônicas há 20 anos e admite o cultivo aqui na Capital para medicamentos
Produtor rural de 44 anos, morador de Campo Grande, recorreu à Justiça para garantir habeas corpus preventivo para que ele não seja preso pelo cultivo de maconha em casa, inclusive, com produção na ativa atualmente. Ele alega sofrer de dores crônicas, insônia e que a maconha medicinal foi o tratamento que trouxe alívio para o problema que perdura cerca de 20 anos.
A ação foi protocolada no dia 20 de julho e, no mérito, o produtor, residente no bairro Santa Fé, pediu que seja expedido salvo conduto para o cultivo de 15 plantas de cannabis, com floração mensal e que essa produção não se enquadre nas penalidades previstas na Lei 11.343/2006 que trata das políticas públicas sobre drogas.
Ontem (21), o juiz da 1ª Vara Criminal de Campo Grande, Roberto Ferreira Filho indeferiu o pedido, sem análise do mérito, além de se manifestar incompetente para julgamento da ação.
A ação – O pedido de habeas corpus preventivo foi protocolado contra o comandante da PMMS (Polícia Militar de Mato Grosso do Sul, delegado-chefe da PCMS (Polícia Civil) e comandante da Guarda Municipal de Campo Grande.
O advogado Diogo Pontes Maciel recorreu à Justiça Estadual com base em decisão tomada pela 3ª Seção do STJ (Superior Tribunal de Justiça), já que não se trata de pedido de importação, o que justificaria a competência da esfera federal.
Na inicial, Maciel diz que o produtor rural sofreu acidente de carro aos 17 anos, sofrendo múltiplas fraturas no quadril e na perna direita, ficando hospitalizado por 4 meses e sem andar por cerca de 1 ano.
Desde então, segundo alegação do produtor, sofre dores crônicas, o que pirou aos 24 anos, quando foi diagnosticado com espondilite (tipo de artrite). Chegou a dormir sentado por dois anos e dependeria da família para o sustento.
O produtor rural fazia uso de anti-inflamatórios e analgésicos, sem surtir efeito. Procurou na internet tratamentos alternativos e encontrou artigo sobre o médico curitibano Renan Abdalla, que prescreveu medicamentos à base de THC (tetrahidrocanabinol) e CBD (canabidiol), com uso de 2 a 5 gotas por 2 vezes ao dia.
As importações de produtos derivados de Cannabis, como o canabidiol, continuam autorizadas de acordo com a RDC (Resolução da Diretoria Colegiada) 335/2020, mediante análise e controle da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária).
Segundo a ação, o produtor rural obteve autorização da Anvisa para importação da cannabis para fins medicinais, válida até março de 2023. Porém, alega que se trata de remédios de alto custo e não teria condições de arcar com os produtos.
Recorreu ao Município e Estado, em março e abril deste ano, respectivamente, para que o poder público arcasse com a despesa, mas teve os pedidos negados. O valor não está textualmente na ação, mas é citado custo médio de R$ 2,8 mil de medicamentos a base de cannabis.
Em maio, depois de três dias de curso de cultivo e extração do óleo da cannabis, passou a fabricar a medicação por conta própria, “obtendo ótimos resultados que, inclusive, lhe permitem agora trabalhar’. Ainda assim, os ganhos seriam insuficientes para fazer a compra do produto importado, sem comprometer suas necessidades pessoais.
Com receio de ser enquadrado na legislação pena, que prevê prisão pelo tráfico de drogas, entrou com a ação judicial, recorrendo à Constituição Federal, que determinar a saúde como direito de todos e dever do Estado. O salvo conduto garantiria o aval para cultivo da Cannabis Sativa “para fins de cultivar, processar, administrar, manipular, produzir e portar o óleo extraído a afim de que seja dado continuidade ao seu tratamento médico”.
O advogado cita decisões deferidas no Distrito Federal e no Rio de Janeiro para embasar o pedido, além dos laudos médicos que atestam a diagnóstico de dores crônicas e espondilite.
Na decisão divulgada ontem, o juiz da 1ª Vara Criminal juiz Roberto Ferreiro Filho recorreu a entendimento da 5ª turma do STJ (Superior Tribunal de Justiça) que havia decidido pela incompetência da Justiça Criminal nesses casos.
Sem analisar o mérito, o magistrado explicou que a autorização da Anvisa já seria suficiente para retirar o caso do âmbito penal. “Sendo uma decisão que demanda uma análise técnica e profunda sobre o tema, não caberia ao Juízo Criminal, na estreita análise do habeas corpus (...), deliberar de forma adequada.
Ferreira Filho diz que o pedido deveria ser encaminhado à autoridade sanitária novamente e, em caso de demora, ser levado à Justiça Cível. Por isso, ao mesmo tempo, declarou incompetência do Juízo e indeferiu a inicial.
À reportagem, o advogado Diogo Pontes disse que somente iria se manifestar depois de ler o teor integral da decisão.