Maior cidade do interior, Dourados comemora 90 anos neste sábado
Emancipado em 1935, povoado começou a surgir ainda no século XIX como entreposto de carroças e carros de boi
Dourados, maior cidade do interior de Mato Grosso do Sul com quase 264 mil habitantes e de volta ao posto de segundo maior PIB estadual, comemora neste sábado (20), 90 anos de emancipação. De ponto de parada de viajantes de carroças e carros de boi no fim do século XIX, o antigo distrito de Ponta Porã se tornou polo comercial, educacional e de serviços de saúde para uma região com quase 1 milhão de habitantes.
RESUMO
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Em acelerada expansão imobiliária após décadas de ostracismo, Dourados ganhou quase 70 mil habitantes nos últimos 14 anos. Esse crescimento é atribuído principalmente ao aumento da oferta de emprego e da ampliação do perímetro urbano, que permitiu surgimento de dezenas de novos bairros nas zonas oeste, leste e sul.
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O papel de destaque como centro regional ganha força a partir de hoje. Às 9h, será inaugurado o Hospital Regional Olga Castoldi Parizotto. Localizada na margem da BR-463, na saída para Ponta Porã, a unidade começa a atender com 100 leitos e faz parte da estratégia do Governo do Estado para desafogar a demanda por atendimento especializado até então ofertado apenas na Capital.
Com estrutura moderna e acesso a atendimentos especializados por meio da Telessaúde, o Hospital Regional de Dourados passa a ser referência para quase 700 mil moradores da macrorregião que dependem do SUS (Sistema Único de Saúde). São milhares de pessoas que até então precisavam recorrer a hospitais de Campo Grande e até de outros estados para conseguir tratamento.
“Eu nasci aqui. Foi em Dourados que dei meus primeiros passos, que estudei, me formei, construí minha família, minha vida profissional e minha trajetória política. Tudo o que eu sou tem raiz nesta cidade. E hoje, quando Dourados completa 90 anos, Deus me concede a honra de estar prefeito. Isso toca profundamente o meu coração. Porque não é só um cargo — é a oportunidade de cuidar da cidade que eu amo”, afirmou o prefeito Marçal Filho (PSDB).
“Desde o primeiro dia da nossa gestão, eu tenho colocado o coração nesse desafio de governar a cidade que tanto amo, trabalhado para resgatar a autoestima da nossa gente, para devolver a esperança, para mostrar que Dourados não está condenada ao abandono. Falavam que Dourados não tinha mais jeito, mas Dourados tem jeito, sim, e tem um futuro bonito pela frente”, diz ele.
Marçal continua: “isso só acontece com trabalho sério, com respeito ao dinheiro público, com rigor nos gastos, com transparência, com pessoas comprometidas, e principalmente com amor pelas pessoas. Amor em acolher quem chega numa unidade de saúde fragilizado. Amor em receber nossas crianças nas escolas e nos centros de educação infantil. Amor em ouvir, em resolver, em estar presente. Eu sinto orgulho quando vejo uma mãe bem atendida, um idoso respeitado, uma criança sorrindo, uma família acreditando novamente no poder público. É por isso que eu estou aqui. É por isso que eu sigo firme”.
O prefeito aproveitou para mandar uma mensagem aos douradenses no dia do aniversário de 90 anos de Dourados: “eu renovo meu compromisso com cada morador: continuar trabalhando todos os dias, estando nas ruas, perto das pessoas, para transformar ainda mais a nossa cidade. Vamos construir uma Dourados mais humana, melhor cuidada, com saúde digna, educação de qualidade, infraestrutura que gera orgulho e serviços públicos que respeitam o cidadão. Esse é o meu compromisso. Esse é o meu presente para Dourados. Trabalhar sempre, cuidando com amor e construindo com trabalho. E assim seguiremos pelos próximos anos!”.
A presidente da Câmara de Vereadores, Liandra Brambilla (PSDB), também se manifestou sobre o aniversário da cidade. “Dourados é fruto da força de seu povo e da coragem de quem ajudou a construir esta terra. Na Câmara, temos trabalhado com seriedade para que cada projeto, cada ação e cada fiscalização contribuam para uma cidade mais justa, dinâmica e acolhedora. Nossa gestão à frente do Legislativo é guiada pelo respeito às pessoas e pelo compromisso de fortalecer políticas públicas que transformem vidas. Celebrar 90 anos é olhar para nossa história com orgulho e, ao mesmo tempo, planejar os próximos anos com responsabilidade e esperança”.
“Os 90 anos de emancipação de Dourados celebram também a força e dedicação de todos que ajudaram a construir essa história, em especial a classe comercial e empresarial. Em 2025, a Aced completou 80 anos, então desde o início da cidade estamos aqui, atuando ativamente no desenvolvimento desta terra abençoada, terra de oportunidades, de gente aguerrida e acolhedora. Parabéns à nossa cidade, nossa querida Dourados, e parabéns a você que constrói essa história de sucesso”, afirmou Everaldo Leite Dias, presidente da Associação Comercial e Empresarial de Dourados.
A história de Dourados
Para o historiador Carlos Magno Mieres Amarilha, a história da fundação do município é uma das mais extraordinárias do Brasil contemporâneo.
“Logo após a Guerra do Paraguai há lutas internas e externas, peleja pelo poder político, lutas pelas armas, embates fratricidas, conhecidos por ‘revoluções’, mas eram lutas pela conquista do poder entre os partidos políticos, luta a favor ou contra o poder econômico do monopólio da erva mate da ‘Companhia Matte Larangeira’. A sede, a vila, o povoado, foi denominado de ‘Patrimônio de Dourados ’, lugar de uma paragem, dos viajantes, dos carreteiros, das comitivas, um ponto de descanso. Mas o lugar transformou-se em um ponto de encontro, de evento cívico, de baile, de aquisições de remédios, da cachaça, do querosene, das compras em geral. Transformou-se em Distrito em 15 de junho de 1914 e em 20 de dezembro de 1935, em município”, narra.
Começo de tudo
Conforme estudos sobre a fundação do município de Dourados, tudo indica que foi no final do século XIX e início do século XX que começou a se efetivar uma população não indígena nos contornos do território que daria origem ao município de Dourados.
“As imediações da atual Praça Antônio João, na Avenida Marcelino Pires, centro de Dourados, no final do século XIX e início do século XX, era uma faixa de campo, entre mata, pasto e água abundante. Nesse lugar surge um pequeno povoado, um lugar de compras, de encontros sociais e culturais”, explica.
De acordo com os estudos sobre a fundação de Dourados, há indícios de que no início do século XX (1900-1914), no pequeno povoado do Patrimônio de Dourados (antes de ser reconhecida oficialmente em forma de lei, em 15/06/1914), na atual Avenida Marcelino Pires nas proximidades da Praça Antônio João, havia um pequeno comércio com farmácia (1903, família Torraca); em 1905 se instala no Patrimônio de Dourados uma sede da Companhia Matte Larangeira na região do Potreirito; uma escola do professor Manoel Santiago Oliveira em 1907; pensão de Januário de Araújo em 1909, casas comerciais, (Casa Saldanha que era filial de Ponta Porã, em 1914), a padaria da Dona Herondina Ferreira de Alencastro e os conhecidos “bolichos”.
O pequeno povoado chamado “Patrimônio de Dourados” virou ponto para comprar sal, querosene, cachaça, fumo, açúcar, linhas, agulhas, poncho, chapéu, munição, prego, enxada, foice, violão e tecido para confecção de roupas. Era o lugar em que se contratavam os onceiros (caçadores) para dar fim aos gigantes felinos que comiam os bezerros. Também ficavam ali os mecânicos de carretas, as parteiras e os peões para uma empreitada nos ervais e fazendas de criação de gado.
“O povoado (Patrimônio de Dourados) que se institui não tem muita importância significativa como residência fixa de um grande número de pessoas, mas sim como um ponto de encontro, dos bailes famosos que aconteciam de tempos em tempos, das festas religiosas, dos torneios esportivos, eventos como as corridas de cavalos, de cavalhadas, torneios de laçar argolas em cima dos cavalos, ou seja, o povoado nasceu de um ‘paradeiro’, por meio de pessoas que queriam se fixar no local, entre chacareiros, fazendeiros e agregados, comerciantes e comerciários, trabalhadores dos ervais, de criadores de gado, pessoas que buscavam um lugar para se estabelecer, para viver, para morar, criar família”, afirma o historiador.
No final do século XIX e início do século XX, o centro de Dourados também era paradeiro para viajantes oriundos de vários pontos com destino a Ponta Porã, Concepción, Bela Vista, Porto Murtinho, Nioaque, Aquidauana, Miranda, Entre Rios (atual Rio Brilhante), Caarapó, Juti, Campanário, Amambai, entre outros. “Assim, o paradeiro de Dourados vai-se constituindo em um lugar definitivo para alguns, aqueles que fixaram suas residências neste espaço”, conta o historiador.
A história revela que nos anos de 1920 aconteciam os torneios de futebol e de basquete feminino, muito influentes na cultura dos trabalhadores dos ervais, assim como a Semana Santa, as famosas quermesses de junho para comemorar os dias de Santo Antônio, São João e São Pedro.
No dia 8 de dezembro, tradicionalmente acontecia uma procissão nas ruas do povoado em comemoração à Virgem de Caacupé, padroeira do Paraguai. A partir de 1940, passou a ser Dia de Imaculada Conceição, padroeira de Dourados. Desde 1998, a imagem da Virgem de Caacupé fica na Praça Paraguaia.
“Muitos fazendeiros originários de outros estados e municípios mato-grossenses no início do século XX tomaram posse das terras devolutas, com registros de escrituras em Nioaque e, com isso, aumenta o número de fazendas e consequentemente de agregados e peões na região do povoado do Patrimônio de Dourados. Parte desses fazendeiros, por meio de suas militâncias políticas, serão os protagonistas na fundação oficial de Ponta Porã como município e da instituição do Distrito de Paz de Dourados tendo como sede o pequeno povoado” afirma Carlos Magno.

Povo Guarani
Carlos Magno Amarilha ressalta que o território do sul de Mato Grosso era ocupado pelos indígenas Guarani que viviam nesta região há muito tempo. “Entre as inúmeras populações que moravam nesta região, uma das que mais se destacam são os Guarani-Kaiowá, considerada uma comunidade muito populosa que ocupava um vasto espaço territorial. O município de Rio Brilhante teve até o nome de ‘Caiuás’, devido aos inúmeros indígenas Kaiowá que moravam nessa localidade”.
O escritor cita trecho do livro da escritora Ercília de Oliveira Pompeu (2014): “habitada a região pelos índios Caiuás e possuindo matas exuberantes, rios caudalosos, formando assim o que seria mais tarde, ou seja, nos dias atuais as divisas do Município de Dourados”. Nesse sentido, segundo ele, tudo indica que os Kaiowá da etnia Guarani são os primeiros habitantes do território onde seria fundada a cidade de Dourados.
Por que o nome Dourados?
Conforme as fontes estudadas por Carlos Magno, a origem do nome Dourados vem por meio dos comerciantes de Ponta Porã, que designavam os seus clientes como “os que moravam próximo do Dourado (atual Rio Dourados)” ou “os moradores do Amambai” (quem morava nas proximidades do Rio Amambai). “Ao anotarem em seus cadernos de fiados, mencionavam ‘fulano de tal, de Dourado’, fulano de tal, de ‘Amambai’”, explica.
Já o nome do Rio dos Dourados deu-se porque, naquela época, havia em abundância uma espécie conhecida como peixe Dourado, ou seja, um peixe de cor dourada, cor de ouro, brilhante, reluzente. “Daí o nome de Dourados, devido aos moradores nas proximidades do Rio Dourado”.
A efetivação do município
“Tudo indica que a cobrança de impostos aos moradores do Distrito de Dourados, publicada no Jornal Correio do Povo em janeiro de 1932, mobilizou seus militantes políticos em reivindicar um município autônomo e independente do poder de Ponta Porã. Foi nesse período que nasce a ideia de se emancipar de Ponta Porã”, afirma Carlos Magno.
Após as cobranças públicas dos impostos, os moradores de Dourados começam a participar da política partidária com o pensamento de constituir a Vila de Dourados em um centro político autônomo de Ponta Porã.
“As Leis nº 658 e nº 666 de 1914 e os decretos nº 401 e nº 402 de 1915 foram significativas no desenvolvimento do Patrimônio de Dourados e o crescimento populacional possibilitou a sua emancipação política em 20 de dezembro de 1935 e instalação como município independente e autônomo em 22 de janeiro de 1936. Ou seja, em uma cidade de fato, com prefeito e vereadores, com o nome definitivo de Dourados”, explica o historiador.
Segundo Carlos Magno, muitos coronéis da região apoiaram a emancipação. “Em 1934 aconteceu a Constituinte e os cargos de ‘intendentes’ passaram a ser chamados de ‘prefeitos’. O Decreto nº 30, de 20 de dezembro de 1935, criando o município de Dourados, foi assinado pelo governador Mário Corrêa, com apadrinhamento direto de Getúlio Vargas”.
Com a cidade emancipada, as terras pertencentes à Companhia Matte Larangeira foram destinadas à implantação da Cand (Colônia Agrícola Nacional de Dourados), até hoje um dos mais audaciosos projetos do Brasil para distribuição de terras a agricultores familiares.
“Não houve revolução armada, passeatas, ou qualquer movimento para conquistar a emancipação política do município, mas sim a atuação de lideranças nos bastidores políticos, articulações partidárias e insistência pela causa. Nesse período, Dourados era a ‘menina dos olhos do presidente’ Getúlio Vargas”, afirma Carlos Magno.
Segundo ele, milhares de cidadãos brasileiros saíram de sua terra natal para tentar a vida nas terras da Cand, colaborando com o desenvolvimento econômico e com a diversidade cultural.
“Quem morava em Dourados antes da implantação do Território Federal de Ponta Porã e da Cand nunca imaginou que a cidade iria crescer tanto de um dia para o outro e receber milhares de pessoas das mais diversas culturas”, diz o historiador.
Em pouco menos de 20 anos, a região remota e esquecida passou a apresentar significativa concentração populacional, propiciando, além do fortalecimento da pequena propriedade familiar, o crescimento na produção de cereais, abertura de estradas e construção de escolas. A Colônia Agrícola Nacional de Dourados tornou-se, nos anos 1950 e 1960, mola propulsora do desenvolvimento regional de Mato Grosso do Sul.
“Dourados passa por um momento de profundas transformações sociais, culturais e econômicas, as quais podem ser resumidas pelo desenvolvimento do setor estudantil universitário, imobiliário, agronegócio, entretenimento, polo de manutenção industrial e de serviços do setor sucroenergético e de prestadores de serviços. Esperamos que a história da fundação de Dourados possa ser reconhecida pelo valor que este município merece”, afirma Carlos Magno.
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