Carinho com quem partiu gera renda há décadas a zeladores, em cemitério
De bom humor, autônomos garantem de R$ 1 a 1,6 mil por mês e contam situações inusitadas no trabalho
O carinho com os parentes que já partiram deste mundo gera renda o ano inteiro para dezenas de zeladores nos cemitérios públicos da Capital. Tem gente que, mais do que visitar os jazigos, paga mensalidade para autônomos cuidarem dos locais, que guardam a memória dos falecidos. E é assim, com muita dedicação e bom humor, que os zeladores garantem renda mensal, que varia de R$ 1 a R$ 1,6 mil.
Entre os zeladores do Cemitério Santo Antônio, Mauro dos Santos, de 61 anos, brinca quando perguntam seu nome.
“O sobrenome é dos Santos, porque do diabo ninguém quer ser”, brinca, ao falar com a reportagem neste domingo (31), às vésperas do Dia de Finados, que será celebrado na terça-feira (2).
É sempre assim, bem humorado, que ele trabalha e conversa com os familiares que chegam ao local, há 30 anos, no cemitério mais antigo da Capital.
“Aqui tem cerca de 22 autônomos que atuam como zeladores. Faço outros serviços, mas tiro daqui a maior parte da renda. O cliente desse jazigo me paga R$ 80 por mês”, contou Mauro, ao referir-se ao túmulo que limpou com receita caseira, incrivelmente poderosa para remover a ferrugem.
“É um preparado de limão e detergente. É só esfregar que fica limpinho”.
Não é do dia para noite que se faz uma renda dessa como zelador no cemitério. Cláudia Medeiros, de 41 anos, faz o mesmo trabalho há 15 anos e conta como ganha a única renda, hoje em dia.
“Tive oportunidade de prestar o serviço para uma família e aí fui conseguindo cada vez mais clientes. Cada família faz um tipo de acordo. Uma, por exemplo, me paga R$ 420 por ano. Eles pagam de acordo com as condições de cada um, a gente negocia”, explica.
Trabalhar em meio a lembrança dos mortos é algo que assusta algumas pessoas e gera até situações inusitadas.
Por outro lado, pela alegria e tranquilidade dos zeladores dá para ver que o serviço é tranquilo e pode ser melhor que trabalhar com os vivos.
“Muitas pessoas no ponto de ônibus me veem saindo do cemitério e quando eu entro no ônibus se afastam. Na primeira semana de trabalho, me deparei com o túmulo aberto e fiquei encucada. Fiquei uma semana sem comer direito. Hoje, eu durmo em cima dos túmulos”, brinca.
Grata as famílias a quem presta o serviço, Cláudia lembra que o importante é gostar do que está fazendo. “Amo esse serviço. Quando a gente faz o que ama, a profissão é gratificante”, diz.
Trabalho infantil - Às vésperas do feriado, os zeladores autônomos acabam tendo uma espécie de concorrência, que é considerada ilegal.
É o período com maior incidência de trabalho infantil, pois muitas crianças e adolescentes vão aos cemitérios para oferecer aos visitantes o serviço de limpeza das lápides e túmulos, além de venderem produtos, como flores e velas, segundo a prefeitura.
A partir deste domingo (31), a SAS (Secretaria Municipal de Assistência Social) realiza ações de enfrentamento ao trabalho infantil nos três cemitérios públicos da Capital. Até terça-feira (2), as equipes entregam panfletos e explicam aos visitantes os perigos a que estão expostas as crianças e adolescentes em situação de trabalho infantil.
Menores de 18 anos são proibidos de trabalhar, exceto em casos de aprendiz, a partir dos 14 anos. Até os 13 anos é totalmente proibido qualquer tipo de trabalho. Denúncias podem ser feitas por telefone pelo Disque 100, ou em Conselhos Tutelares e unidades da SAS.