Sefaz revê edital da Lotesul, corrige falhas e pede arquivamento no TCE
Apesar de admitir "fragilidades", secretaria preservou modelo escolhido para exploração da loteria estadual
A Sefaz (Secretaria de Estado de Fazenda de Mato Grosso do Sul) apresentou ao TCE-MS (Tribunal de Contas de Mato Grosso do Sul) nesta sexta-feira (26) uma resposta detalhada às denúncias e às fragilidades apontadas no Pregão Eletrônico destinado à contratação da plataforma tecnológica que deverá operar a Loteria Estadual, a Lotesul.
RESUMO
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A Secretaria de Estado de Fazenda de Mato Grosso do Sul apresentou ao Tribunal de Contas uma resposta às denúncias sobre o Pregão Eletrônico da Loteria Estadual. A pasta confirmou a anulação da fase externa do certame e revisou o Estudo Técnico Preliminar e o Termo de Referência. Entre as principais correções, a Sefaz defendeu o modelo de gestão centralizada da Lotesul, justificou as exigências técnicas de 15 milhões de transações anuais e detalhou a Prova de Conceito. A secretaria solicitou o arquivamento das denúncias e do processo de controle prévio, alegando que as adequações necessárias foram realizadas.
No documento, assinado pelo secretário Flávio César Mendes de Oliveira, a pasta confirmou a anulação da fase externa do certame e apresentou a revisão do ETP (Estudo Técnico Preliminar) e do TR (Termo de Referência), medidas adotadas em atendimento às recomendações da Corte de Contas.
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A manifestação da Sefaz foi uma reação às conclusões de auditoria do TCE, que havia identificado cláusulas restritivas à competitividade e desproporcionais em relação ao objeto licitado. Entre os problemas destacados anteriormente estavam exigências técnicas consideradas excessivas e sem justificativa, além do risco de criação de um monopólio privado por até 35 anos. As denúncias partiram de três frentes distintas: Jamil Name Filho, atualmente preso pela operação Omertà; a empresa Criativa Technology Ltda., ligada ao ex-deputado estadual Roberto Razuk, e ainda uma denúncia anônima, todas acolhidas pelo tribunal para análise.
Na resposta, a secretaria explicou que a anulação da fase externa do pregão, formalizada em 22 de setembro de 2025 no Diário Oficial, foi necessária justamente para corrigir inconsistências nos documentos de planejamento e refazer os estudos que embasaram a licitação.
O governo também apresentou esclarecimentos sobre pontos específicos que haviam sido alvo de críticas do TCE. Em relação à estimativa de receitas, questionada pela auditoria por não utilizar dados históricos nacionais nem se limitar à modalidade de apostas de quota fixa, a Sefaz explicou que as projeções foram elaboradas a partir de comparativos internacionais com países como Itália, Portugal, Espanha e França, utilizando a relação entre consumo e PIB, além de projeções oficiais do crescimento estadual.
A secretaria ressaltou que o mercado lotérico brasileiro em âmbito estadual ainda é recente e não dispõe de séries históricas consolidadas, razão pela qual foi necessário adotar parâmetros de outros mercados regulados. Também destacou que eventuais distorções de arrecadação não trariam prejuízo ao erário, já que os riscos foram alocados integralmente ao contratado na matriz de riscos elaborada no ETP.
Outro ponto defendido pela secretaria foi o modelo de gestão centralizada da Lotesul. A auditoria havia apontado fragilidade na justificativa sobre a interdependência entre a contratação da plataforma tecnológica e a delegação da operação lotérica.
A Sefaz respondeu que a estrutura foi concebida em duas camadas distintas. A primeira, de gestão, é pública e ficará sob responsabilidade da Lotesul/SEFAZ, concentrando as funções de fiscalização em tempo real, auditoria, prevenção à lavagem de dinheiro, aplicação de políticas de jogo responsável, integração de meios de pagamento e rastreabilidade das transações. A segunda camada, de execução, será operada por agentes privados credenciados, que somente poderão atuar integrados ao sistema público, sem autonomia tecnológica própria.
Para justificar esse modelo, a secretaria fez comparações à prática da Caixa Econômica Federal, que centraliza a gestão dos serviços lotéricos e subordina seus operadores a regras técnicas e regulatórias definidas pelo ente estatal. Na avaliação da Sefaz, fragmentar essa estrutura em múltiplos sistemas privados fragilizaria a fiscalização, aumentaria custos, abriria espaço para riscos de ocultação de informações e comprometeria a conformidade com a legislação.
A exigência de comprovação de 15 milhões de transações anuais e capacidade de processar 40 TPS (Transações por Segundo), considerada desproporcional pela auditoria, também foi defendida pela secretaria. O governo afirmou que os parâmetros foram estabelecidos como requisitos mínimos de segurança operacional, para garantir que o sistema suportasse grandes volumes desde o início da operação. Para fundamentar os números, foram apresentados dados empíricos da Lottopar, a loteria do Estado do Paraná, que registrou mais de 54 milhões de transações em apenas sete meses de 2025.
Mesmo ajustado proporcionalmente à população de Mato Grosso do Sul, o volume equivale ao exigido no edital, demonstrando que o critério é conservador e adequado. A secretaria destacou ainda que a previsão de 40 TPS foi fixada abaixo do pico já observado no Paraná, que chegou a 108 TPS em eventos de grande repercussão, como finais de campeonatos esportivos. A argumentação é de que falhas de dimensionamento poderiam provocar frustração em apostadores e gerar uma onda de ações judiciais contra o Estado, com impactos financeiros relevantes.
Outro ponto revisado foi a POC (Prova de Conceito), cujo detalhamento havia sido considerado insuficiente pelo TCE. A secretaria informou que o Termo de Referência foi corrigido, passando a descrever de forma precisa os objetivos, os critérios e o roteiro de avaliação dessa etapa. A POC será obrigatória para a empresa declarada vencedora, que deverá demonstrar na prática a aderência de sua solução tecnológica às exigências do edital. O teste será conduzido por uma comissão mista composta por representantes da Sefaz e da Secretaria de Transformação Digital, e todos os custos ficarão a cargo da licitante. Segundo a secretaria, o detalhamento da prova foi necessário para reforçar a transparência do processo e evitar a contratação de soluções inexequíveis.
Ao longo de sua manifestação, a Sefaz também destacou que o modelo escolhido para Mato Grosso do Sul não foi uma inovação isolada, mas segue práticas já adotadas por outros estados. Citou como exemplo a experiência do Paraná, cujo processo licitatório foi validado pelo Judiciário e por órgãos de controle, e ressaltou que o edital local também permite a formação de consórcios, o que amplia a participação de empresas de diferentes portes e assegura isonomia.
Com as correções adotadas, a secretaria solicitou ao TCE o arquivamento das denúncias e do processo de controle prévio, alegando perda de objeto. Na avaliação do governo, não houve ilícito no certame, mas apenas a necessidade de ajustes administrativos que já foram realizados.
“Requeremos que essa Corte de Contas decida pelo arquivamento dos presentes autos de denúncia, ante a ausência de ilícito, e que em sede de Controle Prévio seja determinado o arquivamento dos autos devido à perda do objeto”, afirmou o secretário Flávio César Mendes de Oliveira no ofício encaminhado ao tribunal.
Com a alegação encaminhada, o governo busca encerrar um embate jurídico e político que envolve cifras milionárias e interesses de grupos distintos, ao mesmo tempo em que preserva a modelagem escolhida para a exploração da loteria estadual. A decisão agora segue para o TCE, que deverá avaliar se as adequações apresentadas são suficientes para arquivar as denúncias e permitir a retomada do processo licitatório.