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Comportamento

No salão de beleza, ela entra muda e sai calada porque todos estão no celular

Paula Maciulevicius | 11/03/2016 06:12
Elizete dizendo em libras: "oi". Nas mãos, o celular com aplicativo que faz a tradução para sinais.
Elizete dizendo em libras: "oi". Nas mãos, o celular com aplicativo que faz a tradução para sinais.

Elizete tem 30 anos, assim que acaba de responder a idade, tenta explicar por sinais que em breve faz aniversário. Quando abril chegar, ela completa 31. Sorridente, por natureza ou talvez como quem quer dizer um olá que seja compreendido em qualquer linguagem, ela entra muda e sai calada do salão de beleza onde trabalha como manicure. Surda e muda desde bebê, em consequência da meningite, a comunicação não seria um problema se ao invés de ficarem no celular, clientes e colegas olhassem nos olhos.

"É difícil não falar com ninguém. Você faz as unhas e pronto", conta, em frases curtas, Elizete Nascimento Pereira Rodrigues. Da profissão de manicure ela diz gostar, de trabalhar no salão na área central, também. Há 2 anos e 7 meses que Elizete chegou ali, por indicação da irmã da dona, que criou junto dos demais funcionários, uma comunicação própria, por gestos. 

"Se é triste não conversar? Triste não. É normal, já acostumei. Está tudo bem", diz. "Eu fico sozinha, todo mundo no celular e eu aqui", completa. Ao ler as palavras que ela escreve no celular, observo ao redor. Apesar de ser considerado o antro da fofoca, o salão de beleza perdeu até isso. São poucas as conversas pessoais, enquanto os dedos revezam entre o alicate e o teclado. De clientes a colegas, todos passam boa parte do tempo entretidos em mexer no celular.

A comunicação trava não por ela ser surda e muda e sim porque ninguém deixa o celular.
A comunicação trava não por ela ser surda e muda e sim porque ninguém deixa o celular.

Elizete também tem um que divide com Diego, com quem é casada e tem um filho de 7 anos. Mas ela diz que pouco usa. A conversa mesmo acontece em casa com o marido e em libras, porque ele também é deficiente auditivo. "As pessoas falam mais no celular que pessoalmente, não olha", completa.

Para a conversa acontecer, a recepcionista do salão nos leva até Elizete e explica, entre gestos que não são libras, que a gente gostaria de falar com ela. Por mensagens digitadas no celular, pergunto se desta forma seria possível entrevistá-la. Tímida, Elizete responde que sim, mas que escreve "mais ou menos bem". A manicure tem o segundo grau completo e apesar de estar ali há quase três anos, nunca houve quem chegasse a conversar com ela em libras. "Ninguém, não sabem", explica.

Quando os clientes chegam ao salão, são orientados pela dona ou atendentes que Elizete não ouve e nem fala, mas entende por sinais e que qualquer dificuldade, pode chamar algum funcionário. É só com sorriso que ela cumprimenta e se despede e passa boa parte do tempo atenta às unhas que está para fazer. Quando questionada, Elizete mostra que não é quieta com as limitações que têm. "Ela fala tudo e é muito sincera. Se não gostou no cabelo, ela vai falar. Aí é que está, quieta ela não é e é muito verdadeira também", brinca a dona Lígia Freitas.

Apesar de não falar, Elizete é super aberta e simpática e mostra que gostaria de trocar, nem que fosse sorrisos e gestos, com as clientes. Mas mais uma vez é impedida de conversar, porque como o olhar é a única forma de chamar atenção de quem está diante dela, a cabeça baixa de olho na tela não dá chance nenhuma à Elizete.

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Essa foi uma sugestão de pauta da leitora e juíza, Katy Braun. 

Elizete acompanha em libras as minhas perguntas e mostra que gostaria de conversar, olhando nos olhos.
Elizete acompanha em libras as minhas perguntas e mostra que gostaria de conversar, olhando nos olhos.
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