Professora viu alunos na miséria, reagiu e virou mãezona ao realizar um sonho
A dor não foi a do parto. Mas a de ver os alunos apertados em um cômodo num barraco ao fundo da casa demolida. Alexandra Nazário da Cruz, 31 anos, não tinha filhos até então. Professora na escola municipal Maria Tereza Rodrigues, no bairro Santa Emília, em Campo Grande, ela se tornou mãe postiça ali, há um mês, ao ver a situação pela qual as crianças passavam.
Henrique e Eric, de 9 anos, são gêmeos e alunos dela. Eles, mais quatro irmãos e a mãe tiveram de sair e ver a casa onde moravam ser demolida por ordem judicial. Por dois dias se apertaram em um cômodo de tábua,o único teto na região.
Alexandra foi além do papel de professora. Ao estranhar a ausência incomum dos alunos na escola, decidiu ir procurá-los em casa. "Eu sabia que eles não eram de faltar e resolvi ir até lá. Quando cheguei, vi a casa destruída e eles encolhidos comendo arroz cru. Naquela situação, o que eu senti, foi de levá-los para minha casa".
E foi isso que ela fez. Por um mês, não só abrigou os meninos na própria casa onde mora com o marido, como também arregaçou as mangas e bateu de porta em porta, na tentativa de conseguir uma casa dos programas do governo federal.
"Foi uma luta árdua e difícil em alguns momentos. Achei que eu não ia conseguir pelos obstáculos, mas pedia a direção de Deus", conta.
Durante o dia, os meninos estudavam e no outro período ficavam com a mãe, até que Alexandra terminasse o expediente e pudesse cuidá-los em casa, que ganhou ares de criança.
As palavras de Alexandra falam por si só e demonstram o amor pela profissão. "Eu tenho pra mim que a escola está muito além de transmitir conhecimento. A gente tem que procurar zelar pelo bem estar de cada um. Ali dentro nós somos como segunda mãe".
E não é para menos, as crianças são sorriso de orelha a orelha, mas também agora eles têm motivos para isso. Na última quinta-feira, finalmente a casa saiu. A assistência social da Emha (Agência Municipal de Habitação) procurou a família oferecendo um lar no bairro Dom Antônio Barbosa.
A alegria dela era mais do que ter missão cumprida, era o sentimento de ter dado aos filhos o que tanto sonhavam.
"Deu tudo certo e foi um presente de Dia das Mães. Eu fico feliz pelos meninos estarem em casa, no lugar deles, na casa deles. Pra mim não tem preço poder fazer parte dessa conquista", diz.
Mãe durante um mês por amor, comoção e carinho, ela resume como serão os próximos capítulos desta história. "E vou continuar sendo. Agora o final de semana eles vem passar comigo. Eles sentem demais a minha falta, a mãe deles disse. E eu também sinto deles". A frase dita emociona não só pela data, mas por ver que a atenção de uma professora deu um lar à uma família.
Na casa dos meninos, Alexandra agora é a irmã que dona Rose já não tinha contato há muito tempo. Ainda com camas, colchões e móveis para fora da casa, no fogão, o feijão que estava cozinhando cheirava tão bem, dando à nova casa o jeito de lar.
Os meninos não sabiam para onde iam de tanta felicidade. De minuto em minuto chamavam a equipe do Lado B para mostrar onde seria o quarto.
Dona Rose, mãe das crianças é Rosimeire Bezerra da Silva, 32 anos, recicladora. E sentiu na pele o desespero de não ter um teto para morar. "Eu não sabia para onde ia, até que a Alexandra tomou a história para si", conta.
A mãe, assim como os filhos, era sorriso que quase não cabia no rosto. "Nunca esperava que uma professora ia ter a força e a coragem que ela teve". Os olhos brilhavam a cada vez que ela mostrava os cômodos da casa modesta, mas agora própria, da família.
"Vem almoçar conosco no domingo, é só avisar antes que eu ponho mais água no feijão", diz à equipe de repórter e fotógrafo. O convite simples de alguém que recorda de todos os dias das mães que viveu. "Todos para mim foram especiais, sempre são né. Mas este foi uma benção de Deus. Não teria presente melhor. Eu sempre fui assim, feliz. Mas agora a felicidade está completa".
Para Dona Rose, o gesto da professora é realmente coisa de mãe. "Ela foi um anjo de Deus para mim. Já faz parte da minha casa, ela veio para tampar o vazio, o que faltava", compara.
Neste domingo, Alexandra vai passar a data fora da cidade, mas com o coração lá no Dom Antônio Barbosa, onde estão, com a ajuda dela, os filhos que ela pode escolher.