Quanto tempo dura a indignação em Campo Grande
O Lado B foi criado só para falar só de coisas boas, mas abri uma exceção por conta de uma curiosidade. Depois das últimas manifestações pela revolta com o assassinato de dois jovens em Campo Grande, resolvi investigar quanto tempo dura a indignação após uma tragédia.
No caso da menina Rayane, morta no dia 28 de fevereiro, no bairro Tarsila do Amaral, a revolta na cidade durou uma semana e meia, contabiliza a mãe Lilian Lucia de Amorim. Aos 6 anos, ela foi atropelada de propósito pelo traficante Magno Henrique Martin, quando ele tentava escapar da Polícia.
Logo depois da morte, pessoas procuraram a família para se solidarizar, pensaram em manifestações, falaram sobre a violência urbana e criticaram a Polícia, mas tudo se acalmou quando o assassino foi preso e a imprensa também diminuiu a cobertura sobre o assunto. “As pessoas esqueceram. Só quem é da família não consegue tirar a dor do coração e os pensamentos da cabeça”, lamenta a mãe que ainda espera pelo julgamento de Magno.
É efêmero, vem como um trovão e logo as pessoas voltam à rotina para só lembrar da violência quando um novo caso ocorre. Foi assim em maio, quando mais uma vez a cidade se levantou, mas contra Richard Ildivan Gomide Lima, 21 anos.
Embriagado, ele atropelou e matou Davi Del Vale, 31 anos, na madrugada, quando o segurança deixava o serviço no bar Miça e seguia para casa na avenida Afonso Pena.
“Um mês depois já tinha caído no esquecimento. Só espero que os juízes não tenham esquecido”, diz a viúva, Laís Mariane. O culpado está preso até hoje, o que para a família serve de “anestésico”. Mas a falta de uma mobilização permanente incomoda.
“É assim, acontece, depois passa e logo em seguida vem outro caso. Agora está todo mundo batendo em outra tecla, a dos meninos mortos”, comenta Laís sobre Breno e Leonardo, assassinados na última quinta-feira por assaltantes.
Para ela, a única forma de evitar os dramas é refletir todos os dias sobre o poder que um ato irresponsável tem de transformar a vida de famílias inteiras.
Mas Laís diz entender o motivo da indignação ter vida curta. “As pessoas nunca acham que vai acontecer com elas. Comigo foi assim. Quando deu 5 horas e meu marido não chegava, até pensei que poderia ser um assalto, mas nunca imaginei que ele estivesse morto”.
João Márcio Escobar, pai de segurança Jefferson Bruno Escobar, o Brunão, conseguiu manter os protestos depois do assassinato do filho por quase um ano, com manifestações mensais. Depois, a adesão começou a cair, passou a ser cada vez mais difícil mobilizar e agora só a família acompanha o caso.
O crime “durou mais” porque envolvia um rapaz rico da cidade, que chegou a ser preso, mas hoje está livre, a espera de julgamento, diz o pai de Brunão. “Meu filho morreu apanhando. As pessoas até lamentam, mas daí todo mundo volta a rotina e esquece. Não tem solução”.
Mesmo com um recorde em protestos, João reclama que de nada serviram, porque o responsável, Cristiano Luna, continua solto. “Não surtiu efeito no Judiciário. É uma derrota de todo mundo”.
Depois do crime - em março de 2011, ele criou uma fundação, ainda realizou alguns debates sobre a violência e novamente veio a decepção. “Pedi apoio de um parlamentar que vive falando da violência no programa de TV dele, mas ele não ajudou. Mesmo assim, trouxe por conta própria a deputada Keiko Ota, de São Paulo, para discutir a criminalidade aqui”, comenta.
Ele cobra a revisão do Código Penal e chama a atenção do eleitor. "É só nas eleições que a gente tem a chance de escolher pessoas comprometidas com o combate à violência", justifica.
Na sexta-feira, quando soube da morte de Leonardo e Breno, o pai de Brunão resolveu pesquisar no Campo Grande News e descobriu que de janeiro até agora 12 pessoas foram assassinadas em Campo Grande. “Assim, a gente vai desanimando”, conclui.