Alerta: setores do governo querem transformar Taquari em deserto
Enquanto o Ministério do Meio Ambiente decide incluir a recuperação do Rio Taquari, cujo assoreamento de décadas inundou permanente mais de 1 milhão de hectares no Pantanal, com recursos da conversão de multas administrativas aplicadas pelo Ibama, há uma forte tendência de alguns setores governamentais – federais e estaduais – proporem a transformação da área alegada em uma reserva. Em síntese, preservar um lugar hoje sem vida.
A criação de um parque ou outra modalidade de unidade de conservação na área de influência do Taquari é uma antiga proposta de organizações não governamentais, rechaçada por entidades ligadas aos produtores rurais do Pantanal. Órgãos públicos, como o Imasul, defendem essa ideia e querem indenizar os pantaneiros pelas suas terras com dinheiro das multas aplicadas pelo Ibama e agora convertidas em serviços ambientais.
Corumbá em alerta
Com essa medida, uma extensa área hoje alagada, que era produtiva e composta de rica fauna e flora, se tornará um deserto de água. A inundação permanente acabou com a vegetação, expulsou os animais e o homem – grandes produtores e centenas de nativos das colônias - e reduziu drasticamente o estoque pesqueiro. A teoria dos governantes poderá agravar o desastre ambiental, com risco de as águas avançarem para outras áreas no Pantanal.
"O pantaneiro não é o responsável pelo assoreamento do Taquari.
Ele é vítima de um programa chamado 'Plante que o João
garante', nos anos 70, que expandiu a agricultura sem controle
das matas ciliares do rio"
(governador Reinaldo Azambuja)
Em Corumbá começa uma mobilização do setor produtivo e alguns defensores da recuperação do Taquari para impedir que essa ideia do setor público chegue ao ministro do Meio Ambiente, José Sarney Filho. A prefeitura do município também se articula e deve criar uma coordenação para acompanhar e intervir nesse processo, além de levar ao governador Reinaldo Azambuja a preocupação com uma proposta desastrosa.
Intervenção é viável
Salvar o Taquari, que foi vítima do desmatamento sem controle na sua borda no planalto – região norte de Mato Grosso do Sul -, a partir da década de 1970, acelerando seu processo natural de assoreamento, é viável e está mais do que provado por orientação técnica. A Embrapa Pantanal avalizou as intervenções e suas recomendações serviram de base para fundamentar os projetos executivos aprovados pelo governo federal.
No encontro no Refúgio Caiman, há duas semanas, o presidente da República Michel Temer ressuscitou o comitê interministerial do Taquari, sob a coordenação do Planalto, e incluiu a recuperação do rio em terceiro na escala de prioridades para receber recursos da conversão de multas em serviços públicos, cujo montante chega a R$ 4,6 bilhões. Há dez anos, quando foi elaborado o plano de recuperação do Taquari, o investimento não chegava a R$ 60 milhões.
Prioridade do governo
Para intervir no Taquari, basta vontade política, simplesmente. As intervenções ambientais estão definidas pelo comitê interministerial, não há mais o que estudar ou discutir. A participação do Estado deve ocorrer no sentido de aprimorar e contribuir para a efetivação das ações que contemplam o plano de recuperação e preservação do importante rio pantaneiro, permitindo assim que o edital para o projeto estruturante se efetive em 2018.
O presidente da República deu sua palavra em relação ao Taquari, portanto é preciso aproveitar o que já foi definido como intervenções viáveis e acelerar a execução, deixando de lado ideias estapafúrdias, que só atrapalham. O governo federal, como esses recursos disponíveis, vai intervir inicialmente na recuperação florestal dos rios São Francisco e Paranaíba. O Taquari vem na sequencia e o papel do Estado é intermediar soluções.
Evitar a judicialização
Há mais de dois anos, o Ministério do Meio Ambiente (MMA) vem trabalhando na elaboração da proposta de alteração do decreto presidencial 6.514/2008, que dispõe sobre infrações e sanções administrativas ao meio ambiente, no sentido de converter as multas em serviços ambientais. O novo texto prevê um desconto de até 60% para infratores que decidam pagar as multas devidas e destina-se, sobretudo, a grandes devedores, como siderúrgicas.
Entre as principais empresas infratoras, de acordo com informações do Ibama, estão seis siderúrgicas, duas companhias de saneamento, uma petroleira, uma mineradora, uma companhia ferroviária, uma madeireira, uma agropecuária e uma de produtos alimentícios. Duas delas, a Petrobrás e Companhia de Saneamento do Paraná (Sanepar), já firmaram protocolos de intenções da conversão de seus passivos.
Como funcionará
“Hoje, a União arrecada apenas 5% do valor das multas aplicadas. Quem paga são os pequenos infratores, enquanto muitos dos grandes recorrem à judicialização para evitar o pagamento”, afirmou Sarney Filho.
O valor será depositado em conta garantidora, em banco público, para custear os serviços de recuperação ambiental previstos na conversão. Esses serviços serão executados por instituições públicas e privadas sem fins lucrativos, cujo projeto de recuperação tenha sido selecionado pelo Ibama ou pelo ICMBio, em chamamento público.
As estimativas da equipe técnica do Ibama apontam valores da ordem de R$ 4,6 bilhões passíveis de serem convertidos em serviços ambientais em prazo relativamente curto, computadas as multas já aplicadas. Segundo Sarney Filho, o MMA está fazendo um levantamento de infratores interessados em aderir à conversão, assim como das entidades interessadas na execução dos projetos. www.lugares.eco.br