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Meio Ambiente

Há 4 décadas, Nereu Rios planta árvores como um sonhador preocupado com a água

"No braço", ele faz trabalho de formiguinha mantendo viveiro e espalhando sementes nativas em expedições

Por Cassia Modena | 21/09/2024 08:22
Plantando árvore em uma de suas expedições, Nereu Rios faz o que o move e move o mundo (Fotos: Divulgação)
Plantando árvore em uma de suas expedições, Nereu Rios faz o que o move e move o mundo (Fotos: Divulgação)

Nereu Rios carrega no sobrenome o que tem profunda conexão com aquilo que acredita: reflorestar o mundo é plantar água e pode nos salvar. É também um trabalho de formiguinha que ele faz há mais de quatro décadas em Mato Grosso do Sul e rodando o Brasil.

Nascido em Dourados, mas morando em Campo Grande, tem 66 anos. Hoje se divide entre “cuidar de árvores como bebês” no viveiro Florescer do Cerrado, educação ambiental para crianças, e aventuras de 7 mil quilômetros país afora plantando mudas e trocando sementes nativas. Fora isso, ainda coordena trabalhos de ressocialização de presos no Estado.

Em tempos de desmatamento recorde e queimadas criminosas que fazem milhões de hectares verdes virarem cinzas, sente-se ainda mais entregue à santidade que é fazer brotar em vez de derrubar e botar fogo. “Sou um abençoado pelas árvores”, diz.

Aprendeu muito do que sabe nas expedições que começaram nos anos 1980. Encontrou sertanejos que tratam bem a terra e indígenas que transmitiram o que cada planta precisa. "Plantar não é só colocar lá e deixar, tem que conduzir. Cada espécie tem um manejo diferente. Tem que fazer calda bordalesa para não adoecerem e regar conforme pede a espécie", diz.

Nereu entrega sementes de ipê a morador de Mato Grosso (Foto: Divulgação)
Nereu entrega sementes de ipê a morador de Mato Grosso (Foto: Divulgação)

Voltando a falar de rios, explica de forma simples a relação entre águas e árvores: "digo para as crianças: os nossos cílios não protegem nossos olhos? Do mesmo jeito, as matas ciliares têm árvores que protegem os rios". Berços d'água no Cerrado secando como nunca e assoreando, são respostas à falta delas e "a um lucro que é para poucos", completa.

Virando monocultura - Ninguém patrocina as expedições que Nereu faz ao lado da esposa. Esse trabalho é voluntário, "feito no braço", segundo ele.

Nessas aventuras, pegam sementes de manduvi diretamente do Pantanal de Mato Grosso do Sul e plantam aos pés da Cachoeira do Rosário, em Pirenópolis (GO), por exemplo. Este ano, o casal vai passar pela Bahia, Tocantins, Minas Gerais e Mato Grosso, deixando mudas como as de ipês roxos. e depois voltar para casa.

No caminho, nem tudo é troca e plantio. Também se decepcionam ao verem mudanças.

"Algumas sementes estão em 'extinção' em alguns locais. Onde a cada ano a gente coletava, hoje está virando monocultura", conta.

Ele cita o sumiço de peroba-cetim e árvore "orelha-de-elefante". "Você não acha. Há em poucos viveiros nativos mantidos por ONGs", continua.

No próprio Estado, compara como era e como está o Córrego Laranja Doce e o entorno, em Dourados.

"Era uma área cheia de peroba (uma madeira nobre), com águas caudalosas e cheias de peixes. Virou rede de esgoto". Nereu sabe porque viveu a infância na cidade. "Assistimos abraçados derrubarem uma espécie que levou 30 anos para produzir", lembra.

"Em oito minutos se acaba com uma árvore que levou décadas para ganhar altura e dar frutos", se indigna.

Fé nas árvores - Mas se alguém assim não acreditar que tem jeito, quem vai acreditar? Apelidos como ecochato e o negacionismo climático não pegam. Nereu prefere ser "sonhador que acredita que as árvores vão salvar o mundo”, insiste.

Campo Grande News - Conteúdo de Verdade
Nereu no viveiro Florescer do Cerrado, que fica em Campo Grande
Nereu no viveiro Florescer do Cerrado, que fica em Campo Grande

Nem faz ideia de quantas árvores já plantou, cuidou ou doou. A certeza é que já fez mais do que uma pessoa sozinha pensa que é possível.

Só no Parque das Nações Indígenas plantou mais de 50 mil árvores em 1998 e depois voltou para criar um corredor de ipês-brancos, num trabalho com estudantes de uma escola de Campo Grande. Já no viveiro Florescer do Cerrado, tem hoje entre 10 e 15 mil mudas. De resto, o melhor é perder a conta mesmo.

Nereu também abraçou o viveiro da concessionária de água da Capital, que produz para reflorestar as margens dos córregos que abastecem a cidade. Faz doações para quem o procura. Cobra ações de manejo para as árvores existentes. Cobra políticas de proteção aos recursos naturais e punições bem mais rigorosas.

Mesmo que a coisa só piore, ele está convicto. "Eu quero morrer acreditando que é possível. Vou plantando água, condomínio de pássaros. Quero morrer plantando muda".

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