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Política

De semideus à vaia: pacote da corrupção espalha protesto e polêmica

Enquanto o MP denuncia o esvaziamento das propostas, políticos contra-atacam

Aline dos Santos, Alberto Dias e Mayara Bueno | 01/12/2016 13:20
Votação de projeto polêmico foi na madrugada de quarta-feira. (Foto: Luís Macedo/Câmara dos Deputados)
Votação de projeto polêmico foi na madrugada de quarta-feira. (Foto: Luís Macedo/Câmara dos Deputados)

Com 44.291 assinaturas coletadas em Mato Grosso do Sul, o pacote das “10 medidas contra a corrupção”, votado na madrugada de ontem (30 de novembro) pela Câmara Federal, repercute em críticas, indignação, protesto e polêmica.

A punição mais severa para corruptos foi proposta pelo MPF (Ministério Público Federal), endossada por 2,1 milhões de brasileiros, votada na calada da noite e esquartejada ao passar pelo crivo dos deputados federais. Enquanto o MP denuncia o esvaziamento das proposta, políticos contra-atacam que promotor quer ser tratado como “semideus” .

Para o presidente da OAB/MS (Ordem dos Advogados do Brasil), Mansour Elias Karmouche, o pacote anticorrupção ficou desfigurado do texto original e ainda deve sofrer alterações. Ele defende a criminalização do enriquecimento ilícito, medida que foi rejeitada pelos parlamentares. “Para combater a corrupção é preciso criminalizar o enriquecimento ilícito de agente público”, diz. Em contraponto, concorda com a criminalização do caixa 2, proposta mantida na votação.

Contudo, reclama que a OAB não foi consultada pelo Ministério Público sobre o pacote contra a corrupção. “ É uma proposta unilateral, que atinge a vida de um milhão de advogados registrados na Ordem”, afirma Karmouche.

A estratégia de votar na madrugada e em regime de urgência é criticada pelo senador Waldemir Moka (PMDB). “Colocaram em regime de urgência, sem passar pela análise das comissões, como a de Justiça”, diz o senador. Para Moka, o Senado, próxima parada do Projeto de Lei 4850/16, deveria elaborar um pacote anticorrupção que fosse consenso. “O texto que veio da Câmara não tem a menor chance do Senado aprovar”, assegura.

Já o senador Pedro Chaves dos Santos (PSC) pondera que o texto passará por profunda análise da CCJ e do Senado, que já rejeitou qualquer tipo de regime de urgência, fato que posterga a votação para o ano que vem, após fevereiro, ou seja, depois de terminado o recesso parlamentar. Ele aponta que o projeto sofrerá muitas modificações uma vez que a Câmara de Deputados alterou artigos importantes e suprimiu outros, fato que "pegou mal", embora concorde da importância de combater a corrupção de políticos, magistrados e empresários.   

Entre os que votaram favoráveis ao pacote está o deputado federal Geraldo Resende (PSDB/MS). “Votei a favor das que vieram, quase todos. Mas promotor e juiz não podem ser tratados como semideus. Precisam pagar por seus atos. Existe uma insatisfação popular sobre a atividade política, infelizmente. E vejo com muita apreensão”, afirma. 

Segundo o deputado Carlos Marun (PMDB-MS), que também votou favorável, o pleito em regime de urgência foi consequência da pressão imposta pelos movimentos populares. "A sociedade exigiu pressa e foi o que fizemos, para que as discussões se voltem ao crescimento do país, que é mais importante", avaliou. Quanto às modificações feitas pela Câmara ao projeto original, o parlamentar é enfático: "Não é nossa função aprovar tudo que o Ministério Público quer e me causa estranheza toda essa celeuma", finalizou.  

Comoção - O deputado Luiz Henrique Mandetta (DEM) avalia que a pressão popular é legítima, mas alerta sobre o perigo de uma comoção nacional. “É muito perigoso fazer sob comoção nacional. Existe excesso da promotoria, sim. Mas, precisaria de uma comissão para analisar especificamente este tema. Acho ótimo que a população esteja acompanhando. O que não pode é essa reação do Ministério Público. Precisam entender as regras”, diz Mandetta. O deputado foi contra a responsabilização de juízes e de membros do Ministério Público por crimes de abuso de autoridade e votou contra o projeto modificado na Câmara dos Deputados.

Seis deputados de MS votaram a favor de projeto polêmico.
Seis deputados de MS votaram a favor de projeto polêmico.

Em nota à imprensa, o deputado federal Vander Loubet (PT) aponta inverdades divulgadas sobre a votação do projeto, especialmente sobre o fim da operação Lava Jato. “As medidas aprovadas não prejudicam em nada o andamento e a continuidade das investigações”, diz”. Para ele, todos são iguais perante a lei, incluindo juízes e promotores. Vander é um dos investigados na Lava Jato.

A deputada Tereza Cristina (PSB) reclama da falta de discussão prévia sobre o projeto, incluindo as comissões, como a de Constituição e Justiça, que não opinaram. “Agora segue o trâmite normal, passando pelo senado que é a casa revisora até chegar ao texto definitivo”, disse, por meio da assessoria de imprensa.

Dos oitos parlamentares de Mato Grosso do Sul na Câmara Federal, seis participaram da votação, todos eles a favor das medidas propostas: Dagoberto Nogueira (PDT), Geraldo Resende (PSDB), Carlos Marun (PMDB), Tereza Cristina (PSB), Vander Loubet (PT) e José Orcírio Miranda dos Santos, o Zeca do PT.

Protesto no aeroporto – Na tarde desta quinta-feira, os parlamentares deverão ser recepcionados com vaia ao desembarcar no Aeroporto Internacional de Campo Grande. A previsão é reunir duas dezenas de pessoas, numa espécie de “esquenta” do protesto marcado para domingo, a partir das 16h, na Praça do Rádio.

Cinco grupos se mobilizam para protestar no aeroporto: Nas Ruas, Pátria Livre, Chega de Impostos, Avança Brasil e Escola Sem Partido. Representante do Chega de Impostos, Miriam Gimenes aponta que a adesão ainda é fraca e calcula que o protesto reúna apenas 20 pessoas nesta quinta-feira.

Por meio de nota, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, lamenta o resultado da votação. “As 10 Medidas contra a Corrupção não existem mais. O Ministério Público brasileiro não apoia o texto que restou, uma pálida sombra das propostas que nos aproximariam de boas práticas mundiais. O MP seguirá sua trajetória de serviço ao povo, na perspectiva de luta contra o desvio de dinheiro público e o roubo das esperanças de um país melhor para todos nós”, afirma. A reportagem solicitou posicionamento do MPF em Mato Grosso do Sul e aguarda retorno.

Medidas suprimidas – Os deputados rejeitaram o ponto que tornava crime o enriquecimento ilícito de funcionários públicos, a proposta que previa acordos de leniência entre empresas envolvidas em crimes, as mudanças em relação ao tempo de prescrição de penas e a criação do confisco alargado, que permitiria o recolhimento de patrimônio da pessoa condenada pela prática de crimes graves.

Conforme a Agência Brasil, também foram suprimidas as medidas que previam estímulo à denúncia de crimes de corrupção, além da proposta de acordos entre defesa e acusação para simplificar processos e o ponto que previa a responsabilização dos partidos e a suspensão do registro da legenda em caso de crimes graves.

Caixa 2 - Os deputados aprovaram a criminalização da prática de utilização de recursos não contabilizados formalmente em campanhas eleitorais, o chamado caixa dois. Pela proposta, o candidato, o administrador financeiro que incorrer na prática poderá sofrer uma pena de dois a cinco anos de prisão, e multa.

As penas serão aumentadas de um terço se os recursos forem provenientes de fontes vedadas pela legislação eleitoral ou partidária. O projeto prevê prevê casos de responsabilização de juízes e de membros do Ministério Público por crimes de abuso de autoridade.

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