A luta para se livrar do tabaco
A Organização Mundial da Saúde (OMS) lançou seu Relatório Global de Epidemia do Tabaco, de 2019, no qual o Brasil consta como o segundo país a realizar, com excelência, as políticas públicas ali sugeridas. O evento foi sediado no país como reconhecimento do êxito na redução do número de fumantes. Este resultado é um orgulho para a Fundação do Câncer, que, desde a sua gênese, em 1991, sob a liderança de seu fundador, doutor Marcos Moraes, encontra-se comprometida com o controle do tabaco, indutor de vários tipos de cânceres.
Nos últimos 13 anos, campanhas educativas junto à população e os embates contra corporações transnacionais de fumo levaram à queda de 40% deste hábito nocivo para a saúde. Em 2003, a prevalência de fumantes era de 22,4%, caindo, em 2006, para 15,6% dos brasileiros e, em 2008, para 9,3%. Desde 1996, o Brasil convive com leis que visam a combater o fumo com restrições ao uso e à propaganda dos chamados produtos fumígeros, como cigarro, charuto e o cachimbo.
Em 2011, passou a ser proibido fumar em ambientes coletivos fechados, e houve uma reforma na lei relacionada aos preços para consumo dos produtos do tabaco. Ao longo destes anos, a Fundação do Câncer participou de ações, como a de ambientes 100% livres de fumo, a de restrição de propagandas, inserção de imagens de advertência nas embalagens e o aumento de impostos sobre os produtos do tabaco, medida que restava para que o país atingisse todas as metas estabelecidas pela OMS.
O tabagismo é reconhecido como uma doença crônica, que causa forte dependência. Por ano, 23.762 pessoas morrem por câncer de pulmão; 17.972 mortes estão relacionadas ao tabagismo passivo e 26.651 mortes a outros cânceres relacionados ao tabaco.
O cigarro possui ao menos 70 substâncias cancerígenas — são mais de 4.700 componentes tóxicos, sendo responsável por 90% de todos os casos de câncer de pulmão (entre os 10% restantes, um terço é de fumantes passivos) e 30% das mortes decorrentes de outros tipos de câncer (de boca, laringe, faringe, esôfago, estômago, pâncreas, fígado, rim, bexiga, colo de útero, leucemia). Os produtos de tabaco que não produzem fumaça também são responsáveis pelo desenvolvimento do câncer de cabeça, de pescoço, esôfago e pâncreas.
Programas de controle do tabaco nem sempre foram rápidos e fáceis de adotar. A indústria tabagista vai propondo novas “caras” ao fumo, tendo sido lançadas 20 novas marcas de cigarros com sabor, entre 2008 e 2010. Recentemente, acrescentou-se uma modalidade disfarçada de tecnologia: os cigarros eletrônicos.
Os atuais vaporizadores atraem jovens que, futuramente, migrarão para os cigarros convencionais. Sabemos que o tabagismo tende a se estabelecer durante a adolescência. Quanto mais precoce a idade do início, maior a probabilidade de o indivíduo tornar-se dependente da nicotina e sofrer o risco de desenvolver algum tipo de câncer relacionado ao tabaco ainda na vida adulta produtiva.
Chegamos a 2019 com esta grande conquista para o Brasil. Há pouco tempo, era impossível imaginar que o cigarro seria banido de ambientes fechados, dos voos comerciais e que também sua propaganda seria proibida.
Todo este legado — que teve a marcante participação do fundador da nossa entidade, doutor Marcos Moraes, atual presidente emérito do Conselho de Curadores da Fundação do Câncer — tem sido fundamental para que as futuras gerações de brasileiros não sejam acometidas por mais de 13 tipos de cânceres decorrentes do tabagismo. É primordial que a luta continue, para que o país possa vir a se livrar totalmente do tabaco.
(*) Paulo Niemeyer Filho, neurocirurgião e presidente do conselho curador da Fundação do Câncer, através do jornal O Globo
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