Mãe relata falta de acolhimento após sofrer aborto espontâneo
Em março, foi sancionada uma lei que prevê atendimento separado para mulheres que perderam bebê

Em agosto de 2024, a empreendedora Avelina Corrêa, de 29 anos, sofreu um aborto espontâneo e afirma que não recebeu o atendimento adequado por parte dos hospitais. Meses após o ocorrido, engravidou novamente, mas, neste mês, recebeu a confirmação de uma nova perda gestacional e teme, mais uma vez, não contar com a assistência necessária.
RESUMO
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Mãe de uma criança de seis anos, Avelina havia planejado a segunda gestação. Em julho do ano passado, descobriu que estava grávida, mas, em agosto, apresentou sinais de que poderia estar sofrendo um aborto. Segundo relata, um exame de ultrassom confirmou a suspeita: o embrião havia parado de se desenvolver.
Ela procurou atendimento na maternidade do HU (Hospital Universitário) da UFMS (Universidade Federal de Mato Grosso do Sul) e, após a triagem, foi atendida por residentes, que confirmaram a perda e informaram as opções disponíveis: esperar em casa, realizar AMIU (Aspiração Manual Intrauterina) ou passar por curetagem.
No entanto, abalada emocionalmente, pediu ao marido que a levasse para casa. No dia seguinte, buscou atendimento na Maternidade Cândido Mariano, onde afirma ter tido uma “melhor conversa” com a médica de plantão. A profissional orientou que ela ficasse em jejum e retornasse no dia seguinte para o procedimento.
Ao voltar à unidade, conforme instrução, Avelina foi informada por outra médica, que havia assumido o plantão, de que o local estava lotado, com muitas emergências, e que havia apenas um profissional disponível para realizar o procedimento, o que, segundo ela, não seria possível naquele momento.
Em busca de atendimento, ela recorreu à Santa Casa. Lá, a médica que avaliou o caso explicou que, por se tratar do primeiro aborto, sem intercorrências anteriores, o mais indicado seria aguardar a expulsão natural do embrião em casa.
“E assim fiz, passando os piores dias da minha vida. Não fui encaminhada ao serviço de psicologia em nenhum momento, nem acolhida de forma adequada. Após todo o processo, procurei a UBS mais próxima para investigar minha perda e pedir ajuda psicológica”, relembra.
Legislação – Em março deste ano, foi sancionada a Lei Municipal nº 7.387/2024, que determina a separação, nos hospitais e maternidades da Capital, entre mulheres que tiveram filhos e aquelas que sofreram perda gestacional.
A medida complementa a Lei Estadual nº 6.143/2023, que garante o direito à acomodação separada e ao apoio psicológico para mulheres que enfrentam a perda de um bebê. A separação em quartos ou alas distintas visa preservar o bem-estar emocional das mães em luto.
Para Avelina, que enfrenta uma nova perda, esse acolhimento é fundamental e deveria ser o primeiro passo do atendimento. “Uma mãe que está perdendo um filho não quer ouvir estatísticas dizendo que uma em cada quatro mulheres terá um aborto. Nunca imaginamos que passaríamos por isso”, desabafa.
Ela considera essencial o setor separado. “Não há dor maior. Além de estar esperando atendimento por horas, você está ao lado de mães que vão ter seus filhos, enquanto o seu colo está vazio, ouvindo perguntas como ‘como aconteceu?’, ‘por que aconteceu?’, sendo que nem os profissionais da saúde têm essas respostas”, destaca.
Política nacional – No âmbito federal, o Senado aprovou a Política Nacional de Humanização do Luto Materno e Parental (PL nº 1.640/2022), que estabelece protocolos de atendimento para mães de bebês que nascem mortos ou falecem logo após o parto, em hospitais públicos e privados.
A reportagem entrou em contato com os hospitais citados para saber sobre os procedimentos adotados. A Maternidade Cândido Mariano informou que o pronto atendimento é aberto a todos, que os dados do prontuário são protegidos pela LGPD (Lei Geral de Proteção de Dados) e que, com mais informações da paciente, é possível apurar o caso. “O hospital dispõe de um protocolo de abortamento”, limitou-se a responder.
O HU/UFMS esclareceu que, em casos de aborto espontâneo, segue protocolos clínicos baseados em evidências científicas e alinhados às diretrizes do Ministério da Saúde. “Quando confirmada a interrupção gestacional, a paciente é informada sobre as opções de manejo”, diz a nota.
Ainda segundo o hospital, “a decisão sobre a conduta a ser adotada é sempre compartilhada entre a equipe médica e a paciente, respeitando a autonomia da mulher, as boas práticas e a segurança do cuidado”.
Sobre casos como o relatado pela reportagem, a unidade acredita que a paciente foi orientada sobre as opções de tratamento, mas, diante do impacto emocional da notícia, pode não ter dado continuidade ao atendimento no momento. “Nesses casos, a equipe permanece à disposição para acolher e conduzir o cuidado sempre que a paciente desejar ou necessitar.”
Até a publicação desta matéria, a Santa Casa não havia respondido aos questionamentos da reportagem.
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