Caos no Paraguai deixa PCC surfar livre no crime e driblar autoridades
Ministro do interior no Paraguai declarou que fuga, na verdade, poder ter sido “uma libertação”
Uma libertação, não uma fuga. Foi assim que definiu o ministro do interior no Paraguai, Euclides Acevedo, sobre a evasão em massa de 73 presos do PCC (Primeiro Comando da Capital) da Penitenciária de Pedro Juan Caballero -que faz fronteira seca com Ponta Porã, em Mato Grosso do Sul-, na madrugada de domingo (19). A investigação que já afastou e prendeu, aproximadamente, 30 agentes penitenciários e diretores do sistema prisional paraguaio, aponta que o túnel escavado pelos presos foi, na verdade, uma ilusão engenhosa para dar apenas imagem de fuga ao esquema.
Conforme noticiou o jornal paraguaio ABC Color, a fuga foi descoberta há mais de 1 ano pelas autoridades paraguaias -informação repassada à secretaria de Justiça de Mato Grosso do Sul-, que chegaram a citar plano, da facção paulista, de pagar cerca de 80 mil dólares a quem ajudasse na evasão.
“Obviamente, nem todos saíram pelo túnel. O túnel, por assim dizer, é uma armação para o que se chama de liberação de presos. Eles haviam saído pela porta principal ou em algumas das vans que entram no presídio”, disse o ministro ao jornal paraguaio. “E mais, creio que alguns presos saíram durante a semana”, emendou ele.
Caos – A chegada do PCC ao Paraguai nos últimos anos é possivelmente um dos acontecimentos mais significativos para a organização, que expandiu suas atividades internacionais, inseriu lideranças no país com função específica de recrutar e se relacionar com organizações locais e tenta, ao menos desde 2016, ser a única liderança do tráfico na fronteira.
Credita-se ao PCC a morte do rei do tráfico na linha de fronteira entre Brasil e Paraguai, em Pedro Juan Caballero, Jorge Rafaat, naquele ano, em execução cinematográfica com uso de munição com calibre forte o suficiente para derrubar aeronave.
No Paraguai, o prato é cheio. Desestrutura das instituições e presídios lotados, moeda desvalorizada, ausência de uma organização criminosa com poderio similar e rede complexa de corrupção são ingredientes que promoveram o sucesso da facção paulista para além da fronteira brasileira.
Corrupção e erros – Durante quase todo o dia, no domingo (19), as autoridades paraguaias divulgaram lista com 75 nomes foragidos do Presídio em Pedro Juan. Durante a noite, disseram que o número estava errado. Isto porque dois deles sequer estavam presos.
Alberto Ariel Cristaldo Valiente e Enrique Duarte Ramírez denunciaram que seus nomes foram incluídos na lista por um erro. As famílias relataram preocupação “temendo que o nome fique manchado e que sejam detidos pela polícia”.
A equipe de relações públicas da polícia paraguaia, em entrevista ao ABC, pediu desculpas pelo caso, disse que a lista divulgada ontem não era oficial e que algum “erro” incluiu o nome dos dois entre os foragidos.
Além disso, outro caso veio à tona nesta manhã. Conforme apurou o Campo Grande News com autoridades em Ponta Porã, o primeiro recapturado, natural de Imperatriz, no Maranhão, foi preso, condenado e permaneceu detido durante 4 anos com nome falso. Na lista, aparece como Eduardo Alves da Cunha, mas a polícia desconfia que o nome verdadeiro do brasileiro de 30 anos seja Luis Alves da Cruz.
Ainda conforme o jornal ABC Color, militares que realizavam a segurança na Penitenciária de Pedro Juan estavam em posto distante somente 100 metros do túnel onde saíram, ao que se acredita, parte dos presos.
Reportagem do Campo Grande News de julho de 2017 já mostrava como a instalação do PCC nos presídios paraguaios alarmou as autoridades. A administração dos presídios identificou aumento dos batismos para adesão de presos à facção. Casos isolados tornaram-se nova realidade, afirmaram autoridades ao jornal Última Hora, um dos principais do Paraguai.
A corrupção vai dos agentes penitenciários ao alto escalão da polícia. Em 2018, o governo do Paraguai anunciou que o segundo oficial da Polícia Nacional, Carlos Alfredo Mendoza, 27, então acusado de ser segurança do brasileiro Eduardo Aparecido de Almeida, 39, o “Pisca”, seria processado por ligação com o tráfico de drogas
Em junho do ano passado, nove presos morreram e pelo menos oito ficaram feridos em confronto do PCC com facção rival na penitenciária de San Pedro, cidade paraguaia próxima a Paranhos, no Mato Grosso do Sul.
Em setembro de 2019, o presidente do Paraguai, Mario Abdo Benítez, demitiu o ministro da Justiça, Julio Rios, e o comandante da Polícia Nacional, Walter Vázquez, após a fuga do narcotraficante Teófilo Samudio, o Samura, líder da facção carioca Comando Vermelho, rival do PCC.
Por último, do lado brasileiro, quem também perdeu a briga para a facção foi o MPF (Ministério Público Federal). A Procuradoria da República em Ponta Porã encerrou as atividades, em prédio agora fantasma, temendo a violência extrema da região.