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Economia

MPF considera que compra da Eldorado por estrangeiros “é nula de pleno direito”

Manifestação em processo que tramita em Três Lagoas é mais um capítulo na disputa pela empresa

Por Maristela Brunetto | 10/02/2024 07:29
Disputa entre sócias da Eldorado se arrasta há anos e recentemente veio à tona a falta de autorização para a compra por estrangeira (Foto: Arquivo/ Divulgação)
Disputa entre sócias da Eldorado se arrasta há anos e recentemente veio à tona a falta de autorização para a compra por estrangeira (Foto: Arquivo/ Divulgação)

Uma nova manifestação do MPF (Ministério Público Federal) em ação civil pública sobre a venda da Eldorado Celulose S.A pela J&F Investimentos S.A à empresa CA Investiment Brazil S.A afirma que a transação é nula de pleno direito (sem dúvidas) e deve ser desfeita, não cabendo a convalidação do negócio. O procurador que assina o documento, Marcelo José da Silva, pontua que mesmo o grupo tendo criado uma pessoa jurídica no Brasil, segue sendo uma empresa de capital estrangeiro e, portanto, deveria ter obtido autorização do Incra e do Congresso Nacional para a concretização do negócio.

A CA está inscrita na Junta Comercial de São Paulo e tem como acionistas uma empresa holandesa e uma da Malásia. Além de defender a nulidade, ele pede que o Congresso seja informado sobre a existência da demanda em Três Lagoas para que avalie quais providências pretende adotar.

A manifestação, anexada esta semana ao processo, é feita após as duas empresas envolvidas terem apresentado contestação. Ambas foram denunciadas pela Fetagri (Federação dos Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras Familiares do Estado de Mato Grosso do Sul), que depois foi sucedida pelo MPF na ação, que tramita na 1ª Vara Federal de Três Lagoas, onde está instalada a Eldorado.

O procurador aponta que a própria CA trouxe informações de que a Eldorado detém terras em seis cidades da região para o cultivo de florestas, sendo Três Lagoas, Inocência, Aparecida do Taboado, Inocência, Selvíria e Andradina, esta, em São Paulo.

Além disso, pontou que a matéria-prima para a produção da celulose é “proveniente de 279 mil hectares de florestas de eucalipto plantadas, dos quais apenas 14 mil hectares (4%) estão em imóveis de sua propriedade, sendo os outros 96% localizados em imóveis sob regime de arrendamento e parceria agrícola”. Ele destacou que não é somente a compra, mas também o arrendamento que deve se submeter à aprovação das instâncias federais, prevista na Lei Nº 5.709/71, que trata da aquisição de terras por estrangeiros. O representante do MPF argumentou que a lei não faculta salvar o negócio que foi realizado em desacordo com a norma.

A CA vem sustentando que não se tratou de mera aquisição de propriedades no país, mas de um complexo industrial na área urbana e que a compra da Eldorado “atende plenamente a legislação brasileira, uma vez que a operação não compreende aquisição de terras rurais”. A empresa também pontuou que o entendimento pela nulidade prejudicaria investimentos bilionários e traria insegurança jurídica para a entrada de capital no país.

Sobre esse aspecto, o procurador apontou que não se trata de impedimento, mas somente um rigor adicional que precisava ter sido respeitado. “Tanto é assim que, caso a CA INVESTMENT (BRAZIL) S.A. tivesse obtido todas as autorizações necessárias, nem sequer haveria interesse de agir no presente processo”. Prossegue considerando que “o enquadramento de tais empresas nas limitações para aquisição de terras rurais prestigia os princípios da soberania e da segurança nacional, fundamentos da República Federativa do Brasil e princípios da ordem econômica”.

O MPF ingressou na ação em setembro do ano passado, houve uma audiência de tentativa de conciliação em outubro, conduzida pelo juiz Roberto Polini. Incra, MPF e as três empresas participaram, sem possibilidade de negociação. Agora, com as manifestações o magistrado deve definir os próximos passos para o processo.

Vários rounds – A transação referente à venda da Eldorado se tornou uma disputa judicial entre as sócias que se arrasta desde que a J&F desistiu de vender a outra metade da empresa, em uma transação que envolveu a quantia de R$ 15 bilhões. Ela continua sócia majoritária e, após surgir a discussão sobre a nulidade diante da falta de autorização do Incra e Congresso, defendeu devolver o dinheiro recebido da CA para retomar a empresa.

A venda foi feita em 2017, com a entrega de quase 50% das ações e promessa de conclusão na sequência. Com a desistência, o caso foi parar numa câmara de arbitragem, que foi favorável à sócia estrangeira. A J&F judicializou o caso, alegando que houve irregularidade no juízo arbitral, briga que se espraiou em várias esferas da Justiça.

Em 1º Grau, a CA obteve decisão favorável na Justiça comum em São Paulo e o caso já estava sendo julgado por turma do TJSP, quando, este ano, a J&F obteve liminar no STJ (Superior Tribunal de Justiça) para suspender esse julgamento, alegando que havia uma nulidade ainda a ser analisada, de que a sentença foi proferida quando havia determinação judicial suspendendo o andamento da ação.

Além disso, uma ação popular pedindo a anulação da transação, pela falta de autorização do Incra e Congresso, apresentada por um político, Luciano Buligon, foi julgada procedente. Ela foi apresentada à Justiça Federal em Chapecó (SC). A CA se manifestou dizendo que a ação foi apresentada com documentos que somente a J&F e Eldorado poderiam ter apresentado.

Em outro capítulo recente da disputa, após divulgar manifestação do Incra sobre a ausência de autorização para a empresa de origem estrangeira, a J&F chegou a marcar uma reunião para apresentar o pedido de recompra, mas a CA não compareceu.

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