Ídolos dos tempos de glória do futebol em MS são demitidos pela Prefeitura
Ídolos de times como Palmeiras e Vasco perderam salário, plano de saúde e sobrevivem com dificuldade
Mestre Gonçalves, Copeu, Pastoril e Paulinho Rezende fazem parte da história do futebol sul-mato-grossense e se destacaram jogando em vários times dentro e fora do Estado. São ídolos de um tempo que há muito não se vê pelos campos locais.
Tamanha experiência um dia foi valorizada pelo Executivo Municipal, que convocou o timaço de ex-craques para voltar à ativa, repassando o que sabiam aos meninos do projeto Escola Pública de Futebol, onde estavam, até a demissão no mês passado. Perderam o salário de cerca de R$ 1,3 mil, plano de saúde e orgulho que só o reconhecimento assegura na aposentaria.
A escolinha de futebol criada pela Funesp (Fundação Municipal de Esporte e Lazer) trabalha com crianças de 11 a 13 anos. O principal objetivo é recreação dos jovens em bairros periféricos de Campo Grande.
Mas não adiantou fazer história no futebol de MS. Os ex-atletas das antigas foram exonerados pela atual gestão de Adriane Lopes (Patri) e substituídos por "gente nova".
Mestre Gonça - Com 82 anos, o ex-jogador Gonçalves chegou a jogar com o Rei do Futebol, Edson Arantes do Nascimento, o Pelé, na Seleção Brasileira Militar. Ele vive na Vila Bandeirantes e tinha a função de treinador no projeto da prefeitura, responsável pela região da Vila Taveirópolis.
"O projeto é muito bacana, que tira a criançada da internet. Molecada hoje é diferente. A gente fica triste de ter saído, porque gostava muito de trabalhar com a gurizada", relata Gonçalves.
O ex-voltante conta que a Funesp informou sobre a demissão neste mês de janeiro. "Eles falaram para nós, ex-jogadores, que a gente pode voltar em outro momento. Porém, os caras começaram a colocar os deles. Quando a prefeita assumiu, a maioria dos antigos que tinha vínculo foram tirados".
Enquanto lamenta a perda do emprego no projeto que, como ele disse, gostava muito de trabalhar, Mestre Gonça lembra dos tempos de jogador profissional. O ex-volante esteve com Pelé em algumas oportunidades e chegou a vencer o maior jogador da história do Brasil. No ano de 1973, pelo Campeonato Brasileiro, o Comercial, de Campo Grande, saiu vitorioso em cima do Santos do Rei.
Em outra oportunidade, os dois jogaram juntos na Seleção Brasileira Militar. “Pelé já era campeão mundial.
"O Exército estava atrás de jogadores com idade igual a nossa e então nos convocou. Ganhamos da Argentina por 1 a 0”, lembra Mestre Gonça.
Nascido em São Caetano do Sul, em São Paulo, ele iniciou a carreira no futebol paulista. Jogou no Nacional, Corinthians, São Bento e Juventus. Também jogou na Argentina pelo San Lorenzo, de Buenos Aires. Em 1973, veio para o Comercial e jogou por cinco anos.
"Negócio é o seguinte, quando eu vim para cá, eu já era um jogador de cancha, com bastante anos de profissão, no auge do futebol daqui. Hoje, a gente fica triste quando se reúne com ex-atletas para falar do cenário daqui", explica Gonçalves.
Paulinho Rezende - O ex-zagueiro de 53 anos também relata que a demissão do projeto da prefeitura aconteceu inesperadamente. "Praticamente 90% dos ex-atletas já saíram. A minha função era como professor na Escola Pública de Futebol no Belmar Fidalgo, há seis anos".
Atualmente, ele tem outro projeto que também trabalha com crianças e jovens de 10 a 17 anos em dois núcleos, no Taquaral Bosque e na Mata do Jacinto. "Eu tenho um projeto meu, é uma criação minha. É um projeto social que dou treino para meninos de 10 a 17 anos", conta.
O ex-zagueiro ficou triste com a saída do projeto da prefeitura por deixar de trabalhar com os meninos: "A gente via a evolução deles no dia a dia. Praticamente 90% deles conheciam a minha história e eu explicava para quem não sabia. Foi muito legal falar com eles".
Paulinho é nascido em Campo Grande e teve o começo de carreira no futebol sul-mato-grossense. O primeiro clube profissional foi o Comercial no ano de 1982. Ainda no Estado, ele jogou no Operário e Cene.
O atleta jogou em outros Estados também. Em Pernambuco, jogou pelo Náutico e foi campeão com o treinador Muricy Ramalho. No Amazonas, foi jogador do São Raimundo. Outras equipes que estão no currículo são o Ceará, Sampaio Corrêa, do Maranhão, e Francana, de São Paulo.
Copeu - Aos 80 anos, Carlos Cidreira foi outro jogador que fez nome no Esporte Clube Comercial, nos anos entre 1973 e 1975. Baiano, veio para Campo Grande passar três meses e se aposentou por aqui, agora à espera da exoneração oficial. "Demitiram a gente, mas eu não tô entendendo nada. Falaram que isso nunca ia acontecer. Ninguém falou nada, mas a gente tá fora do projeto. É uma injustiça", reclama.
É notório que fez fama no Palmeiras de Dudu e Ademir da Guia, por 122 jogos e com 69 vitórias. Reverenciado pela técnica, também ficou 1 ano no Santos ao lado de Pelé. Mesmo assim, foi mais um a perder o emprego este ano no projeto da prefeitura.
O ex-ponta, que estreou em 1964 no futebol, revela que no ano passado chegou a pedir um aumento, já que ele e os colegas recebiam menos de um salário mínimo. Mas os cerca de R$ 1.300 não são a única perda irreparável nessa altura do campeonato. "Bloquearam até o plano de saúde. Fui fazer exames e não autorizaram nenhum".
Copeu também reclama da saída de Paulinho, "porque nunca ninguém vai conseguir fazer o que ele fazia pela criançada. Ele levava colete pra lavar em casa, fez os meninos gostarem de jogar bola. Quando ele não vai, a gurizada fica até preocupada, sente falta. Não tem como substituir".
Pastoril - Em 1969, a categoria de base do Vasco ganhou Pastoril, mineiro de Governador Valadares, depois foi para o time principal, junto de Roberto Dinamite, maior ídolo da história vascaína.
Conquistou reconhecimento como meia canhoto habilidoso, de alta técnica, com lançamentos precisos e herói na cobrança de faltas.
A história lembra que, em 1971, Pastoril foi disputado por Flamengo e Botafogo. Do Fla, o Vasco teve a proposta de trocá-lo pelo estreante Zico, o que não aconteceu, e o "Galinho de Quintino" acabou como maior nome do Rubro-Negro.
Alberto José dos Santos, hoje com 69 anos, defendeu também o Operário e Comercial, se aposentou por aqui, trabalhando como gerente de tapeçaria e depois no projeto de futebol com os antigos colegas. Infelizmente não atendeu as nossas ligações.
Resposta da Funesp - Em nota, a fundação informou que o projeto atende mais de 1,5 mil crianças de 8 a 15 anos com 15 escolinhas e 12 professores. Em relação às demissões, a Funesp apenas informa que o projeto está em plena continuidade com novo quadro profissional de professores.