Arquitetos buscam passado do Rádio e empresa patrocinará restauração da fachada
O projeto não quer só trazer a ideia dos tempos dourados de volta. É colocar no seu devido lugar o branco original que sempre cobriu o salão que sabia, como ninguém, dar uma festa. A surpresa para quem faz a fachada do Rádio Clube Cidade dentro da mostra de arquitetura “Morar mais por menos” foi saber pela própria estrutura, que o prédio sempre foi branco.
O arquiteto que assina o projeto, Ângelo Arruda, explica que com base na prospecção, trabalho da arquiteta Perla Larsen, que retira da fachada as camadas de tinta, foi possível encontrar a última, encoberta pelas reformas que a estrutura sofreu. As espátulas chegaram a 1942 e revelaram que a cor não mudou com o passar dos anos.
“Já conseguimos identificar, é branca mesmo. Foi alterada a tinta, hoje é um grafiato, mas vamos emassar a fachada com argamassa dos anos 50 para dar um acabamento mais rústico de um prédio que virou a identidade da cidade”. Para a restauração da fachada, a mostra conta com o apoio da Ibratim Tintas, o patrocínio, fechado na última sexta, será para toda pintura e devolver ao Rádio Clube à cara dos anos 40.
Quem passa na frente do clube, pela rua Padre João Crippa, ainda não viu andaimes e nem obras pela calçada. É que todo levantamento de identificação do processo histórico que sofreu a fachada está sendo feito na cabeça e nas mãos dos arquitetos, para então, ser posto em prática os reparos em um prédio de 70 anos.
“Não é um projeto de restauração completa, é parcial, porque tiveram muitas alterações. O jardim e o portão foram mudados com o tempo. Isso que a gente vê hoje é da reforma de 1996”, explica Ângelo.
Pela foto, tirada cerca de dois anos depois de o prédio ser inaugurado, em 1943, mostra que as mudanças não afetaram drasticamente o que os olhos de hoje veem. As janelas e aberturas da fachada foram alteradas, no entanto os ‘vãos’ que as guardavam continuam no mesmo lugar, em forma de arcos compondo cinco aberturas e uma certa simetria entre os dois lados.
Em estilo neocolonial, com o passar dos anos o prédio foi ampliado, cada hora para um lado. Primeiro a parte direita com o restaurante e a construção do bar, do outro, a criação da choperia do Rádio, chegando até a boate, que hoje está ao centro do Rádio.
Na fachada original, a arquitetura era mais simples, com uma mureta branca, os degraus compondo uma pequena escada e canos para onde a água pudesse correr. Em frente, uma vegetação simples encerrava o projeto. As duas arredondadas janelas, que permanecem até hoje, tinham um toldo que era puxado para driblar o sol. No contorno, peças de mármore davam o acabamento do neocolonialismo.
O projeto conta com a manutenção de elementos, como os azulejos azuis que 70 anos depois continuam à mostra e o que parece uma chaminé. Os frisos, no contorno do telhado, também continuam em cena.
“Esses frisos têm duas tonalidades, um parecido com saibro, como um caramelo claro e um pink suave”, reforça Ângelo. Com a identificação das cores, os arquitetos vão colorir os detalhes conforme o que apontou a prospecção.
“Minha intenção é que a gente consiga obter uma leitura mais ou menos completa de um clube que marcou seu tempo. Eu propus que a fachada frontal toda, inclusive restaurante e bistrô, ganhe a mesma tinta, acabamento e textura”, explica o arquiteto.
Na prática, o branco pode tomar conta da fachada que de uns anos para cá se viu resumida apenas à entrada do clube. Evidenciando as construções que vieram depois, como a ampliação do restaurante, choperia e boate.
Inspirado no livro “Nas Ondas do Rádio”, que marcou os 70 anos do clube, a fachada que destoa do conjunto, correspondente à choperia, vai ganhar um painel como cobertura da estrutura metálica. “Para o evento a gente vai bolar um painel com uma imagem significativa do Rádio, possivelmente um baile, um registro de um grande dia de festa”, explica o arquiteto Ângelo.
Os tempos de ouro do Rádio Clube marcaram décadas da cidade. Há quem se atreva a dizer, e com toda razão, que em partes a história dele se confunde com os capítulos do livro de 114 anos da Cidade Morena.
“Ele foi perdendo espaço na sociedade que o criou porque a tecnologia foi criando outros argumentos. O Rádio se manteve pelos esportes, pelas aulas, pela dança e congraçamento dos sócios, mas aquele clube era da cidade, ele cumpriu um papel perante a sociedade que se confunde um pouco com a história de Campo Grande”, avalia Ângelo.
Depois da constatação, ele mesmo balança a cabeça dizendo que sempre trabalha com coisas que o jogam para trás.
O arquiteto, junto da administração da mostra deve solicitar à prefeitura o uso da praça da calçada da praça do Rádio, na rua Padre João Crippa, onde hoje estão concretos redondos, para exposições de arte e cultura.
E para dar as boas-vindas a quem viveu os bailes, bingos e carnavais do Rádio Clube, durante a mostra um tapete vermelho será posto na rua. Os visitantes param, descem do carro e desfilam pelo tapete até as portas que receberam as melhores festas da cidade.
“Pensa uma senhora de 70 anos que namorava o marido nas festas do Rádio, descendo do carro e passando pelo tapete? A intenção da restauração é trazer de volta esse processo”, resume.
“Essa memória da cidade, ela não tem a ver com os sócios do rádio. Eles têm seus privilégios, mas a cidade ficou órfã deste espaço”, finaliza. E pela Arquitetura a melhor época do clube toma forma de novo.