Donos querem de volta 'tesouros' de MS levados até para a Rússia
Líderes do povo guató se reuniram para pedir repatriação; preocupação é estratégia para guardar as raridades
Portugal, Itália, Rússia, Alemanha, Argentina e Estados Unidos guardam tesouros do povo guató: artefatos que não são mais produzidos e foram levados por pesquisadores há mais de 100 anos. Agora, assim como o manto tupinambá foi repatriado, o Conselho de Lideranças do Povo Guató no Guadakan/Pantanal MT e MS quer ver sua história de volta ao solo brasileiro.
O ponto é que há uma série de questões envolvendo a discussão para trazer de volta urnas funerárias, mosquiteiros de tucum, lâminas de machado e uma série de outros objetos. Entre elas, talvez a mais essencial, é pensar que caso esses itens retornem, onde irão ficar?
Cacique da aldeia Barra do São Lourenço, localizada na Serra do Amolar, Denir Marques da Silva explica que a iniciativa surgiu após conversas com lideranças guató. No conselho, além dele, há o cacique da Aldeia Uberaba, Osvaldo Correia da Costa, e Henrique Alves de Arruda, da aldeia Aterradinho (MT).
Segundo Denir, o assunto começou a ser movimentado neste ano. Agora, aguarda os procedimentos governamentais para dar sequência.
Nós sabemos que temos muitos artefatos nossos fora do Brasil. Conversando, tivemos essa ideia com nossas lideranças e foi acordado fazer o documento. Mas, além de trazer esses objetos, temos que pensar em outras coisas importantes como o transporte e o local em que vão ser guardados”, diz o cacique.
Para o cacique, a repatriação dos artefatos é importante para que tanto os povos indígenas quanto a população em geral conheça a história guató. Justamente por isso, esse processo é bastante delicado.
Citando alguns itens, ele comenta o caso de mosquiteiros feitos com palha. “Essa palha é frágil, ainda mais depois de tanto tempo. São coisas que precisamos pensar bem para proteger. Temos a ideia de trazer, mas como será guardado? Não adianta trazer para estragar”.
Outra questão levantada pelo conselho é tentar visitar os objetos para entender a situação em que estão. Tudo para criar estratégias.
Sobre a importância de todo esse material, o cacique comenta que os itens mostram a história brasileira e a forma com que o povo guató se desenvolveu, além de como influenciou e influencia a cultura de Mato Grosso do Sul.
Em agosto, uma carta foi enviada ao Centro Nacional de Arqueologia. Agora, a demanda foi enviada ao Iphan para que todo o processo seja discutido e regulamentado para análise das possibilidades.
Já definidos como extintos e quase extintos historicamente, a etnia segue enfrentando dificuldades para ser reconhecida. Denir cita o exemplo de como são constantemente chamados de ribeirinhos e não guatós.
“Até ONGs fazem isso, chamando a gente de ribeirinho. No passado, o povo guató usou como estratégia se apresentar como ribeirinho e não indígena para fugir dos fazendeiros, mas precisam entender o motivo disso”, diz.
Ele argumenta que muitos indígenas eram usados por fazendeiros e negar a questão indígena foi necessário. “Foi uma estratégia de sobrevivência, mas hoje estamos mais fortes, temos leis que nos amparam. Naquela época, a gente não conhecia nossos direitos, não sabíamos escrever. Até meu pai foi pressionado por fazendeiro dentro da nossa própria casa”, argumenta o cacique.
É também para recuperar a força da identidade que os objetos são importantes, como diz Denir. Esse será um modo de conectar indígenas mais jovens com toda sua ancestralidade.
E, além dos objetos, Denir cita que ainda há a luta para sobreviver aos incêndios. Passando por dificuldades, ele apela para as autoridades e organizações que possam ajudar (caso haja interesse, seu contato é (67) 99219-4256.
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