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Comportamento

Gregório veio do Pantanal para fazer de Campo Grande um lugar mais animado

Aqui ele ficou conhecido como Goinha, quase um sinônimo do Carnaval que teima em resistir até hoje

Thailla Torres | 19/10/2019 07:43
Goinha durante restauração do Museu José Antônio Pereira. (Foto: Arquivo Pessoal)
Goinha durante restauração do Museu José Antônio Pereira. (Foto: Arquivo Pessoal)

Ele partiu em 2010 e até hoje é lembrado pelos mais antigos. Não há Carnaval em Campo Grande sem que a sua dedicação seja mencionada. Gregório Corrêa, famoso pelo apelido “Goinha”, virou personagem sul-mato-grossense importante. Ele foi o responsável por trazer a primeira escola de samba para a cidade.

Um dos filhos, o funcionário público Gregório Augusto Corrêa, de 57 anos, se emociona nos primeiros minutos de conversa ao contar a história do pai. Hoje, pastor de uma igreja evangélica na cidade e dedicado aos trabalhos sociais, ele não frequenta mais o Carnaval como fazia antes com o Goinha, mesmo assim, mantém viva a história dele com a folia e não deixa passar um só detalhe. “Hoje eu não faço mais parte do Carnaval, tenho uma outra vida, mas a folia está marcada na minha identidade e era a identidade do meu pai. Não falar dessa festa é como apagar o passado do meu pai. Carrego isso com muito orgulho no peito”.

Nesta semana, Gregório correu pela cidade em busca do último exemplar que possui do livro escrito pelo pai. “O sonho de um pantaneiro feliz!” traz em suas páginas o amor de Goinha por Mato Grosso do Sul, o Carnaval, seus personagens do Centro, famílias tradicionais, histórias com o Pantanal e até com a política. “Ele quis escrever esse livro porque tinha muito orgulho da sua história”.

Ele criou um trio em Campo Grande.  (Foto: Arquivo Pessoal)
Ele criou um trio em Campo Grande. (Foto: Arquivo Pessoal)
Família de Goinha.  (Foto: Arquivo Pessoal)
Família de Goinha. (Foto: Arquivo Pessoal)
Período que foi candidato.  (Foto: Arquivo Pessoal)
Período que foi candidato. (Foto: Arquivo Pessoal)

Goinha não era escritor, se considerava um caipira que nasceu no Pantanal. Tinha orgulho de ter nascido num lugar admirado por muitos pelas suas belezas naturais. Depois de perder o pai quando tinha 12 anos de idade e ver a mãe lutar para criar 10 filhos, Goinha saiu de Miranda na adolescência para tentar uma vida melhor à família em Campo Grande.

Chegou à Capital quando ela estava com 76 anos de história, em pleno desenvolvimento para cidade grande. Era a cidade das padarias antigas, do cafezinho, dos cinemas, comércio tradicional da 14 de Julho e encontros amigáveis pelo Centro. Goinha amava tudo isso.

Ainda na década de 50, Campo Grande não tinha uma escola de samba para chamar de sua. O Carnaval era na rua, feito com os blocos, entre eles, o Bem-Te-Vi, Bloco da Felicidade, Bloco Flor de Maio e Bloco dos Turíitas do Espaço, que nasceu no colégio Visconde de Cairú. Goinha participava de quase todos e era assíduo nos clubes que sediavam os bailes carnavalescos. “Ele brincava muito nesses clubes, passou a amar o Carnaval e os bailes assim”, lembra o filho.

Como sempre gostou de música, Goinha decidiu criar um grupo musical com nome “O Trio Diamante Negro”. Os integrantes eram ele, João Violão, Juarez e Silvinho. Um trio de família. Juarez era irmão, Silvinho primo. Apenas João era amigos. Os quatro cantaram juntos durante um tempo pela cidade, faziam abertura de shows nacionais por aqui e chegaram às rádios. O trio acabou quando Goinha foi chamado para o Exército.

Gregório Augusto Corrêa, filho de Goinha. (Foto: Paulo Francis)
Gregório Augusto Corrêa, filho de Goinha. (Foto: Paulo Francis)

Os tempos passaram e Goinha se tornou ainda mais conhecido por trazer uma escola de samba. Tudo começou após uma luta pela saúde do filho. “Quando pequeno, por casualidade do destino, eu tive paralisia infantil. Uma médica no Rio de Janeiro estava dando esperança aos pais no tratamento e lá foi meu pai me levar para a cidade carioca em busca de recuperação”.

Como Goinha tinha parentes de Miranda que viviam no Rio de Janeiro, ele começou a ir nas escolas de samba da região para assistir ensaios. “Foi quando ele teve a ideia de voltar para Campo Grande e fundar Acadêmicos do Samba, primeira escola carnavalesca de Campo Grande, no ano de 1972”.

Na época, não havia barracão e a extinta escola ensaiava no Belmar Fidalgo. Depois disso, Goinha ajudou na criação da Catedráticos do Samba e da Escola de Samba da Vila Carvalho. “Ele foi o grande incentivador do samba em Campo Grande. Muitas escolas surgiram depois através da escola dele e ele amava isso”.

Na década de 60, quando percebeu que muitas escolas já existiam, decidiu criar a primeira união de escolas de samba e o filho se tornou o presidente da escola de samba. “Ali eu fiquei por muito tempo e comandei a escola de acordo com o que meu pai me ensinou. Ele passou pra todos os filhos o respeito pelo Carnaval, por uma cultura que une a comunidade”.

Goinha na restauração do Museu José Antônio Pereira.
Goinha na restauração do Museu José Antônio Pereira.

O começo não foi fácil, mas Goinha fazia de tudo para ver a escola de samba brilhar. “Sem recursos na época, ele ia para Corumbá, onde o Carnaval tinha mais força e arrumava parcerias para produção de fantasias. Também trouxe familiares do Rio de Janeiro para ensinar como tocar os instrumentos da bateria. O Carnaval para ele também era um sinônimo de conhecimento e aprendizagem”.

Ainda hoje, em entrevistas e homenagens, o nome de Goinha é lembrado. Ao filho, resta orgulho. “Pra mim e para toda minha família. Meus irmãos também possuem muito orgulho do meu pai e preservam a história dele”.

Além de deixar marcas no Carnaval da cidade, Goinha era considerado um talentoso mestre de obras. Participou de duas restaurações no Museu José Antônio Pereira e se orgulhava disso. “Foram restaurados a casa principais, a cozinha e a garagem do carro de boi. Fiz também uma casa de madeira para o zelador, furei um poço para o consumo de água do museu e um sanitário para os visitantes”, citou em seu livro ““O sonho de um pantaneiro feliz!”.

Com os talentos e a fama que tinha pela cidade, Goinha foi um morador que respirou Campo Grande com todas as forças. “Ele era muito apaixonado pela cidade e pelo estado, só queria fazer o bem, torcia pelo seu crescimento, conhecia quase todo mundo”, lembra o filho.

Goinha curtiu muitos carnavais e descansou em 2010 depois de um longo tratamento contra o câncer. Apesar da saudade, o homem caipira não deixou tristeza. “A gente sente que meu pai fez tudo o que queria e isso nos conforta muito. Apesar da saudade, ver tudo o que ele fez e o quanto é lembrado com carinho faz a gente se sentir feliz pela vida que ele teve”, diz o filho.

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