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Comportamento

Tem jeito mais fácil de fazer, mas ele prefere a receita de tijolos do pai

Hoje, o que faz ele ficar no ramo não é lucro nem demanda, é o apego emocional à história da família

Por Natália Olliver | 29/05/2025 07:17
Tem jeito mais fácil de fazer, mas ele prefere a receita de tijolos do pai
Há 21 anos Anderson mantém "receita" dos tijolos do pai (Foto: Henrique Kawaminami)

Por trás do vapor quente que sobe dos fornos da olaria de Anhanduí, há mais do que argila endurecida pelo fogo, há uma vida inteira dedicada a um ofício aprendido com suor e diversão. Aos 49 anos, Anderson Mortari cresceu junto com o negócio da família, no lugar onde o pai, Jayr Mortari, dedicou décadas de trabalho.

Hoje, o que o mantém ali não é lucro nem demanda, é o apego emocional à história que viu ser construída e à “receita” dos tijolos que aprendeu desde os 8 anos. O ingrediente é a vontade de fazer dar certo. Ali, o que vale vai além da técnica: é a memória e a tradição. Há 21 anos ele e o irmão estão à frente da olaria.

Oportunidades para seguir outros caminhos não faltaram, mas era fazendo os tijolos que ele se realizava. Em uma visita rápida e inesperada ao local, Anderson mostra alguns dos processos da olaria. A história do pai já foi contada pelo Lado B, mas o que ficou depois que ele se aposentou, não.

Anderson Mortari lembra bem como os tijolos eram feitos antigamente e quando chegaram as primeiras máquinas que facilitaram o trabalho no lugar. É hora do almoço e a olaria está focada em tirar os moldes dos tijolos da máquina de argila e colocá-los para secar.

Tem jeito mais fácil de fazer, mas ele prefere a receita de tijolos do pai
Máquina de tijolos facilitou a vida de quem só fazia de forma manual (Foto: Henrique Kawaminami)

“Na época, meu pai fazia na mão, um por um. Eu era pequeno, lembro que o trabalho era feito por um boi que rodava na pioia e o barro soltava ali. As máquinas chegaram nos anos 80. Desde que mudou para elas, continuou assim, mas tem formas mais tecnológicas hoje de fazer. Eu gosto demais. Insisto em ficar no antigo pelo apego, mas estou pensando em mudar de área futuramente.”

De lá pra cá, muita coisa mudou, inclusive o jeito de fazer tijolos. A herança da receita do pai ainda é mais forte que a tecnologia. Devido a mudanças na área da construção civil, a olaria já não vive os tempos áureos. Na verdade, já não vive isso há muito tempo. Antes, o lugar chegava a fazer 30 mil tijolos por mês; na época do pai, o número era ainda maior. 'Agora, a quantidade caiu pela metade, 15 mil.

Em 2004 Jayr precisou se afastar para cuidar da saúde, teve câncer no estômago, logo em seguida se aposentou e os filhos assumiram. Um mais na parte administrativa e finanças e outro na cerâmica".

Tem jeito mais fácil de fazer, mas ele prefere a receita de tijolos do pai
Tem jeito mais fácil de fazer, mas ele prefere a receita de tijolos do pai
Tijolos precisma secar por 15 dias e ser queimados por 4 dias (Foto: Henrique Kawaminami)

“A receita era de uma pessoa que amava isso e a gente continuou assim. Antigamente, a gente ganhava muito dinheiro com isso, hoje em dia, é só por amor mesmo. Existem maneiras mais modernas de fazer. Por exemplo, hoje você não entra mais dentro de onde queima os tijolos. Tem uma máquina que ele sai queimado já. O modo de fazer do meu pai vem desde meados de 1982.”

Anderson explica que, antigamente, os tijolos eram feitos de forma totalmente artesanal. Tudo começava com a extração da argila, que era misturada com água e pisada manualmente ou com a ajuda de bois presos a uma pioia.

Depois, o barro era moldado em formas de madeira, uma a uma, e os tijolos eram deixados para secar ao sol por cerca de 15 dias. Após a secagem, eles iam para o forno, onde ficavam até cinco dias queimando com fogo à lenha. Por fim, era preciso esperar o resfriamento antes de retirar os tijolos prontos. O processo exige tempo e esforço.

Tem jeito mais fácil de fazer, mas ele prefere a receita de tijolos do pai
Anderson no local onde os tijolos são queimados por 4 dias inteiros (Foto: Henrique Kawaminami)

Hoje, Anderson faz quase o mesmo processo, mas usa a máquina para fazer os tijolos. A parte de secagem continua com 15 dias e a de queima é feita em 4 dias. “Segredo de um bom tijolo é a matéria-prima”, completa.

Jayr Mortari veio de São Paulo direto para o bairro Caiçara, em Campo Grande. Depois, a família mudou a produção para Anhanduí, onde o barro continuava farto e a tradição era viva. A família passou a arrendar três olarias e acompanhou de perto o ritmo acelerado de crescimento da cidade.

Com grandes planos em mente, Jayr sonhava alto: queria ter um negócio só dele. “Meu sonho era montar uma olaria grande, algo meu”, contou Jayr à reportagem em 2024. Antes da tecnologia, Jayr relatou como fazia para trabalhar na época em que começou.

“Era uma pobreza. Eu andava de bicicleta,  amarrava tijolo na garupa da bicicleta, em 1968. Saía do Lageado e ia para a Coronel Antonino, Bandeirantes, vender tijolo. Não era difícil de vender, mas na hora de receber, era.”

Enquanto a mudança de ramo não acontece para Anderson, ele continua ali, no meio da fumaça, do cheiro de barro molhado e da saudade dos tempos em que fazia tudo com o pai.

Tem jeito mais fácil de fazer, mas ele prefere a receita de tijolos do pai
Olaria no distrito de Campo Grande existe desde meados da década de 1960 (Foto: Henrique Kawaminami)

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