MS está entre os Estados mais beneficiados com emendas tidas como “desiguais”
Com indicadores sociais mais elevados, MS recebe recursos per capita que superam os de Estados vulneráveis

Entre 2020 e 2024, o Governo Federal pagou R$ 51,7 bilhões em emendas parlamentares, distribuídas de forma igualitária entre os Estados, sem considerar fatores como a população, a vulnerabilidade social ou a arrecadação de cada unidade da federação. Este modelo de distribuição tem gerado críticas por suas distorções, e Mato Grosso do Sul está entre os Estados que mais receberam recursos por habitante, apesar de ter índices de vulnerabilidade social superior a outros Estados mais populosos e com maiores necessidades.
RESUMO
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Entre 2020 e 2024, o Governo Federal distribuiu R$ 51,7 bilhões em emendas parlamentares de forma igualitária entre os Estados, sem considerar fatores como população ou vulnerabilidade social. Mato Grosso do Sul (MS) está entre os mais beneficiados, recebendo R$ 432 por habitante, superando Estados mais populosos e com maiores necessidades, como Bahia e Pará. O modelo atual, criticado por sua falta de critérios técnicos, favorece Estados como Roraima, que recebeu R$ 1.899 por habitante, enquanto São Paulo recebeu apenas R$ 38. Especialistas apontam que a distribuição não beneficia necessariamente os Estados mais pobres.
O levantamento realizado pelo Estadão, em parceria com a Central das Emendas, levou em conta duas categorias de repasses: as emendas de bancada, assinadas por parlamentares da mesma unidade da federação e com um teto anual de cerca de R$ 300 milhões por Estado; e as emendas individuais de senadores, que também seguem um valor fixo, independentemente do tamanho da população. Como cada Estado possui três senadores, todos recebem três cotas iguais, de aproximadamente R$ 44 milhões por ano.
As emendas individuais de deputados federais ficaram de fora do estudo, já que sua distribuição leva em conta o número de cadeiras por Estado e apresenta, ainda que parcialmente, uma proporcionalidade com a população.
Com base nestes critérios, os dados apontam que Mato Grosso do Sul foi beneficiado com R$ 432 por habitante entre 2020 e 2024. Esse valor coloca o Estado entre os mais favorecidos no país, superando unidades federativas como a Bahia, que tem mais de 14 milhões de habitantes, e o Pará, com grandes demandas sociais, mas que receberam valores per capita bem inferiores (R$ 89 e R$ 159, respectivamente).
No entanto, a grande discrepância ocorre quando se observa a situação de Estados como Roraima, que recebeu R$ 1.899 por habitante, enquanto São Paulo, o mais populoso do país, recebeu apenas R$ 38.
Valor per capita das emendas de bancada por Estado (2020–2024)
Estado | Valor Empenhado (R$) | População | Valor Per Capita (R$) |
---|---|---|---|
Roraima | 1.209.608.574,01 | 636.707 | 1.899,79 |
Amapá | 1.269.640.485,09 | 733.759 | 1.730,32 |
Acre | 1.220.757.057,80 | 830.018 | 1.470,76 |
Tocantins | 1.294.850.059,48 | 1.511.460 | 856,69 |
Rondônia | 1.041.332.239,61 | 1.581.196 | 658,57 |
Sergipe | 1.178.195.231,84 | 2.210.004 | 533,12 |
Mato Grosso do Sul | 1.192.560.435,62 | 2.757.013 | 432,56 |
Distrito Federal | 1.199.676.523,66 | 2.817.381 | 425,81 |
Piauí | 1.322.004.909,15 | 3.271.199 | 404,13 |
Alagoas | 1.254.724.616,20 | 3.127.683 | 401,17 |
Rio Grande do Norte | 1.263.630.446,99 | 3.302.729 | 382,60 |
Espírito Santo | 1.397.226.749,22 | 3.833.712 | 364,46 |
Mato Grosso | 1.245.550.051,10 | 3.658.649 | 340,44 |
Amazonas | 1.269.774.419,34 | 3.941.613 | 322,15 |
Paraíba | 1.230.011.090,20 | 3.974.687 | 309,46 |
Maranhão | 1.320.300.996,83 | 6.775.805 | 194,86 |
Goiás | 1.271.827.573,14 | 7.056.495 | 180,24 |
Santa Catarina | 1.245.858.617,30 | 7.610.361 | 163,71 |
Pará | 1.294.275.671,85 | 8.121.025 | 159,37 |
Ceará | 1.287.160.312,38 | 8.794.957 | 146,35 |
Pernambuco | 1.239.022.473,13 | 9.058.931 | 136,77 |
Rio Grande do Sul | 1.272.206.009,58 | 10.882.965 | 116,90 |
Paraná | 1.265.962.520,31 | 11.444.380 | 110,62 |
Bahia | 1.264.109.904,23 | 14.141.626 | 89,39 |
Rio de Janeiro | 1.215.817.693,89 | 16.055.174 | 75,73 |
Minas Gerais | 1.220.614.373,82 | 20.539.989 | 59,43 |
São Paulo | 1.695.262.033,67 | 44.411.238 | 38,17 |
Fonte: Estadão, em parceria com a Central das Emendas
Segundo Bruno Bondarovsky, pesquisador da PUC-Rio na área de gestão pública e responsável pela criação da Central das Emendas, o modelo atual passa a impressão equivocada de justiça ao distribuir valores iguais para Estados com contextos sociais, econômicos e demográficos muito diferentes. O principal problema, segundo ele, é a ausência de critérios técnicos, como o nível de desigualdade social e a capacidade de arrecadação.
“Há uma ideia comum de que esse modelo beneficia os Estados mais pobres por destinar mais recursos a eles. Mas isso não é verdade”, afirma Bondarovsky. “Quem mais precisa não recebe mais, e quem recebe mais nem sempre está em pior situação”, disse em entrevista ao Estadão.
O modelo de emendas foi alterado em 2015, quando as emendas individuais de senadores passaram a ser obrigatórias. Em 2019, as emendas de bancada também passaram a seguir a mesma lógica de distribuição fixa. A falta de critérios técnicos, como desigualdade social ou capacidade de arrecadação, leva a uma concentração de recursos em Estados que, como MS, têm condições econômicas e sociais mais favoráveis.
A senadora Soraya Thronicke (Podemos), líder da bancada de Mato Grosso do Sul no Congresso, foi procurada para comentar sobre a distribuição das emendas parlamentares e o modelo adotado para a distribuição dos valores, mas até a publicação da matéria não houve retorno. O espaço segue aberto.