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Capital

A coragem da mãe que tirou de uma tragédia o impulso para ajudar

Elverson Cardozo | 25/07/2012 20:41
Maria Amélia ao lado do retrato do filho. Quadro foi pintado pela irmã do adolescente, a advogada Ana Carolina Cunha de Figueiredo, que desenvolveu o lado artístico após a tragédia. (Foto: Elverson Cardozo)
Maria Amélia ao lado do retrato do filho. Quadro foi pintado pela irmã do adolescente, a advogada Ana Carolina Cunha de Figueiredo, que desenvolveu o lado artístico após a tragédia. (Foto: Elverson Cardozo)

O sorriso aberto denuncia, logo de cara, que na casa de Maria Amélia Cunha Figueiredo, de 58 anos, tristeza não tem vez. “Não posso parecer triste”, disse, ao posar para fotografia ao lado do retrato do filho, José Eduardo Cunha de Figueiredo, que morreu aos 16 anos, carbonizado, em um grave acidente de trânsito.

“Eu nunca estou triste”, garantiu a aposentada, após a entrevista em que relembrou o dia da tragédia. O motivo de tamanha felicidade está na religiosidade, na fé em Deus e na paixão pela vida. “O cemitério para mim é muito pequeno”, justifica

A perda do filho, declarou, já era esperada. Naquela madrugada, dentro do quarto de um retiro, onde estava com um grupo católico há 4 dias, foi ela mesma quem anunciou, de maneira inexeplicável, a morte do adolescente.

“Apareceu uma pessoa no quarto para me chamar, eu levantei da cama e pronunciei: Veio dar a notícia de que meu filho morreu”, contou. 'Eu já tinha sonhado que ele iria morrer no meio de desconhecidos", completou.

“Eu entrei dentro do quarto, me ajoelhei e falei: Senhor, entrego de todo o meu coração, de toda a minha alma, com todo o meu ser, o meu filho. Dai-me força para continuar vivendo”, relatou.

José Eduardo Cunha de Figueiredo faleceu no dia 28 de agosto de 1999. Era um dos passageiros de um Astra que colidiu contra um caminhão basculante Mercedez-Benz, na BR-262, saída para Três Lagoas, em Campo Grande.

No carro, além de José Eduardo, outros quatro jovens. Todos morreram após a explosão do veículo. Na época, o excesso de velocidade foi apontado como a principal causa do acidente.

Quarto do filho virou escritório, mas as fotos do garoto ainda permanecem no cômodo. (Foto: Elverson Cardozo)
Quarto do filho virou escritório, mas as fotos do garoto ainda permanecem no cômodo. (Foto: Elverson Cardozo)

E pensar que naquela sexta-feira José Eduardo só queria montar a cavalo, uma de suas paixões. Enquanto a mãe estava no retiro de silêncio na saída para São Paulo ele resolveu ir até o rancho, mas não chegou a ficar 30 minutos no local.

A filha do proprietário havia atolado o carro em um areial próximo. O adolescente resolveu ajudar e, no impulso, entrou no carro de desconhecidos. Na volta, a jovem que conduzia o veículo ultrapassou o limite de velocidade.

“A moça que dirigia correu a 180 km/h, bateu no meio-fio, colidiu contra um poste e acertou o caminhão basculante que estava na pista contrária”, relatou a mãe do jovem, acrescentando que, com o impacto, o carro explodiu.

Das cinco vítimas, três morreram carbonizados. Um deles era José Eduardo, que teve o caixão lacrado. Maria Amélia diz que não derramou “uma lágrima” durante o velório do filho, mas o coração sangrava incessantemente.

Embora tenha sido criticada, explicou, na época “algo sobrenatural” a confortou. “Não era eu que estava em mim”, disse. A força que recebeu naquele momento se intensificou nos dias que sucederam à morte do filho, mas a vida havia lhe reservado outra surpresa nada agradável.

Cinco meses depois do acidente que resultou na morte de José Eduardo, Maria Amélia perdeu a mãe. Marcolina de Souza Castro, de 62 anos, se afogou no Rio Formoso, durante um encontro da melhor idade realizado no município de Bonito. “Ela foi porque estava muito depressiva com a morte do único neto”, contou a filha.

José Eduardo morreu aos 16 anos. (Foto: Reprodução)
José Eduardo morreu aos 16 anos. (Foto: Reprodução)

Que as duas tragédias a abalaram, disso não restam dúvidas, mas foi justamente neste período que Maria Amélia diz ter se tornado ainda mais forte. Com o tempo, os trabalhos voluntários que fazia se tornaram a atividade principal.

Hoje é uma das voluntárias da Santa Casa e visita de 300 a 400 enfermos todos as semanas. O trabalho é puxado, começa às 14h e vai até às 18h, 19h, mas a satisfação fala mais alto.

“Se aparecer alguém meia noite eu vou lá”, afirmou. “Aprendi a viver mais para Deus e para o próximo”, completou.

A saudade do filho ainda bate à porta. A casa onde vive é tomada por fotos do garoto “tranquilo e caseiro” que se foi cedo demais, antes mesmo de cursar as “três universidades” que pretendia.

Não sabia quais os cursos que queria fazer, mas tinha certeza de que eram todos na área rural. “Era um garoto muito sonhador”, revela a mãe. “Até hoje meu filho é um lindo sonho de amor que passou pela terra e vai se realizar no céu”, finaliza.

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