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Capital

Após soltar e prender, juiz diz que não “voltou atrás” e recorre a Jesus

Segundo o magistrado, insistem em querer que a Justiça julgue como Pôncio Pilatos

Aline dos Santos | 05/01/2017 09:52
Na decisão, juiz rebate críticas da obra e justifica ida e volta nas decisões. (Foto: Reprodução/internet)
Na decisão, juiz rebate críticas da obra e justifica ida e volta nas decisões. (Foto: Reprodução/internet)
Ricardo dentro da viatura da PM no dia do crime. (Foto: Simão Nogueira)
Ricardo dentro da viatura da PM no dia do crime. (Foto: Simão Nogueira)

O juiz José Andrade Neto, que nos últimos quatro dias mandou soltar e prender o policial rodoviário federal que matou um empresário a tiros após briga de trânsito, afirma no processo que “não voltou atrás”, critica sem citar nomes a OAB/MS (Ordem dos Advogados do Brasil) e lembra o julgamento de Jesus Cristo.

Conforme a decisão, o magistrado não está “voltando atrás” e revendo o que já restou afirmado na decisão que concedeu a liberdade.

“O que está havendo e que é plenamente normal ocorrer durante uma investigação, é que, agora, com a representação feita pelo Ministério Público com a apresentação de novas provas e elementos objetivos, este juízo verificou a necessidade de ser decretada a prisão preventiva do indiciado”, informa o juiz.

No último sábado (31), o policial rodoviário federal Ricardo Hyun Su Moon, 47 anos, matou o empresário Adriano Correia do Nascimento, 33 anos, após briga no trânsito, na avenida Ernesto Geisel, em Campo Grande.

Na ocasião, o policial chegou a ser preso, mas foi solto no dia seguinte (1º de janeiro) pelo juiz José Andrade Neto. Agora, o mesmo juiz aceitou o pedido do MPE (Ministério Público do Estado) para decretar a preventiva. Conforme a decisão, a prisão é para a conveniência da instrução criminal.

“Em especial, para evitar que, solto, o representado possa influenciar na apuração dos fatos, como aparentemente vem ocorrendo desde a sua prisão, de acordo com os elementos objetivos ora trazidos ao conhecimento do juízo”, diz o magistrado na decisão.

Segundo o MPE, apesar do registro informar que Ricardo foi conduzido pela PM (Polícia Militar), ele compareceu à delegacia de forma espontânea, onde recebeu a voz de prisão em flagrante. Também é destacado que o crime foi às 5h40 e o depoimento do policial foi encerrado às 12h55. Para a promotoria, “indício de que houve atuação irregular” em favor de Ricardo.

Outro fato é de que nos vídeos e fotos, o policial aparece de camiseta listrada e a calça da farda. Mas na delegacia, trajava a farda completa. Ainda segundo o MPE, o preso deu versões fantasiosas. O pedido de prisão preventiva foi assinado pelos promotores João Meneghini Girelli, Bolivar Luis da Costa Vieira e Allan Thiago Barbosa Arakaki. 

Caminhonete bateu em poste na Ernesto Geisel. (Foto: Simão Nogueira)
Caminhonete bateu em poste na Ernesto Geisel. (Foto: Simão Nogueira)
O empresário Adriano foi morto por policial
O empresário Adriano foi morto por policial

“É que, há forte indícios de que o requerido, por si só e também com o auxílio de outrem inovou artificiosamente o estado de coisa e pessoa, a fim de induzir os órgãos de segurança a erro, bem como obteve tratamento privilegiado pelo Poder Público”, alegou o MPE ao pedir a prisão preventiva. O policial alegou legítima defesa.

Aula de processo – Na decisão, o juiz detalhou passo a passo as obrigações de um magistrado ao receber o comunicado de prisão em flagrante. Sem citar a OAB, que anunciou que iria fazer representação ao CNJ (Conselho Nacional de Justiça) devido à decisão de libertar Ricardo, o magistrado afirma que a sua decisão causou aparente indignação em uma entidade de classe estadual, que divulgou nota qualificando o crime como bárbaro e doloso.

“Seria cômico, se não fosse trágico o fato de a aludida nota ter sido emitida justamente pela entidade que mais deveria se preocupar com o respeito às garantias fundamentais dos cidadãos, especialmente com o direito à defesa e ao contraditório”, diz o juiz na decisão.

Fato histórico – O juiz José Andrade Neto recorre ao julgamento de Jesus Cristo para justificar porque o clamor público e sede de Justiça do povo não podem ser levados em conta para a decretação de uma prisão.

Segundo ele, no julgamento de um singelo carpinteiro nascido em Belém, o governador do Império Romano, aos invés de analisar o crime, preferiu lavar as mãos e seguir a vontade popular. Segundo o magistrado, insistem em querer que a Justiça julgue como Pôncio Pilatos.

Perícia enumerou quantidade de cápsulas caídas na avenida Ernesto Geisel. (Foto: Alcides Neto)
Perícia enumerou quantidade de cápsulas caídas na avenida Ernesto Geisel. (Foto: Alcides Neto)

Não contribui – Presidente da Amamsul (Associação dos Magistrados de Mato Grosso do Sul), Fernando Cury afirma que a nova decisão continua a não aceitar o clamor público como motivo de prisão. “O Ministério Público apresentou novas provas e novos fatos, com indício de que o policial estaria tentando interferir na coleta de provas e cenário”, diz.

O presidente da OAB/MS, Mansour Karmouche afirma que o juiz quis se justificar e que as considerações sobre a entidade não contribuíram em nada. “O importante é o resultado prático de nossa ação, duvido que tivesse restabelecido a ordem jurídica. Não tenho dúvidas que isso não teria acontecido sem a OAB”, salienta.

Caso - O policial conduzia uma Mitsubishi Pajero e efetuou disparos contra uma Hilux. O condutor da caminhonete foi atingido, perdeu o controle da direção e o veículo atingiu um poste de iluminação pública.

Duas pessoas que estavam na caminhonete com a vítima ficaram feridas e foram socorridas. Segundo relato de uma mulher que chegou ao local logo após os disparos e acidentes, o policial desceu com a arma em punho e discutiu com o rapaz baleado. 

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