Jamilzinho "cai atirando" e garante que ajudou delegado a calar testemunha
Ele teria convencido Paulo Xavier a não entregar envolvimento de ex-diretor da DGPC em esquema de jogatina
Em novas audiências da operação Omertà, Jamil Name Filho usou o pouco tempo de fala diante do juiz da 1ª Vara Criminal de Campo Grande para acusar policiais e rebater acusações de que a família liderou a "maior e mais antiga" organização criminosa do Estado. Ele "caiu atirando". Revelou ter ajudado o delegado aposentado Marcelo Vargas a “omitir” sua participação em esquemas de jogatina e assim, chegar ao cargo de delegado-geral da Polícia Civil e Mato Grosso do Sul.
O discurso ao juiz Roberto Ferreira Filho, responsável por onze processos envolvendo os investigados pela Omertà, começou com um pedido de desculpas pelo tom usado em audiências passadas, mas sem se prolongar muito, entrou no ponto do qual se tratava a audiência: as supostas ameaças de atentado ao delegado do Garras (Delegacia Especializada de Repressão a Roubos a Banco, Assaltos e Sequestros), Fábio Peró.
Contando nos dedos, Jamilzinho afirma que já foram denunciados quatro supostos atentados ao delegado e para rebater as acusações que julga terem sido feitas por Peró, passou a narrar uma relação íntima entre a família Name e integrantes da segurança pública de Mato Grosso do Sul.
Jamil cita vários nomes que estiveram em cargos de chefia dentro da polícia aos longos dos anos no Estado até chegar ao que ele diz ser “novidade”: uma visita do delegado Marcelo Vargas a sua casa. “O doutor Renê Siufi com o diretor-geral, até então só delegado Marcelo Vargas, foram até a minha casa, lá no fundo, onde meu pai fica sentado, para falar com o tal Xavier”, diz sobre Paulo Xavier que, na época, trabalhava para a família, e anos depois, teve o filho executado pelo bando em atentado que era para ele.
Na versão de Jamilzinho, o pai explicou que o capitão Paulo Roberto Xavier era contratado pelo filho e, por isso, era com ele que o advogado deveria falar. Foi o que aconteceu. Recebeu o defensor e o delegado e logo foi surpreendido pelo pedido de ajuda. “Tô aqui com o Marcelo, vai ter uma audiência aí no Gaeco da operação Las Vegas e esse rapaz que está aí trabalhando para você, o Paulo Xavier, vai depor e vai acabar com a vida do Marcelo e o Marcelo não vai poder assumir a diretoria-geral. Você tem como fazer ele não falar o nome do Marcelo?”, teria falado Siufi, segundo Jamilzinho.
Em 2009, a operação Las Vegas levou 19 pessoas para a prisão por envolvimento com caça-níqueis e outros jogos de azar em Campo Grande e Corumbá, entre elas, o próprio Paulo Xavier. Anos depois, o nome de Marcelo Vargas apareceu em denúncia como “facilitador” do esquema de máquinas em Mato Grosso do Sul após a prisão de Clayton Batista, em São Paulo.
Na época, Marcelo era presidente da Adepol-MS (Associação dos Delegados de Mato Grosso do Sul) e foi investigado pela Corregedoria da Polícia Civil, mas foi inocentado. Já neste período, era forte candidato ao cargo de delegado-geral de Mato Grosso do Sul e, por isso, se preocupava com o nome ligado aos escândalos das máquinas caça-níqueis.
Durante a audiência, Jamilzinho lembrou que Marcelo pediu para que Xavier nem sequer fosse ao Gaeco. “O Marcelo chegou mais perto e falou: Renê, será que não tem como pedir para ele não ir na audiência", narrou.
Jamil Name então se comprometeu a tentar, esperou os dois homens saírem da casa e ligou para Xavier, conta o filho. A conversa, diz Jamilzinho, foi tranquila. Sob pretexto de que Paulo ganharia muito mais calado, então, os dois “firmaram” o acordo. Juntos, ligaram para Renê Siufi para dar a notícia, afirma. “Está garantido, o rapaz não vai depor no Gaeco. Pode avisar ao Marcelo Vargas que se depender disso, ele vai ser o próximo diretor-geral”, repetiu Jamilzinho ao juiz.
Por “vontade própria”, afirma, Jamil tirou R$ 5 mil do bolso e entregou a Xavier, uma forma de agradecer “a fidelidade”.
“Como é que um delegado fala que essa organização, que ele fala organização, é a maior organização criminosa e a mais antiga, se o próprio delegado diretor-geral, chefe dele, vai lá pede isso. Só assumiu esse cargo, porque eu consegui isso”, garante Jamilzinho.
Jamilzinho citou convivência com outros superiores, como delegado Pedro Espíndola de Camargo, que já foi diretor do departamento de polícia especializada.
“Depois do assassinato do filho do seu Paulo Xavier, dez dias depois, o seu Marcelo Vargas bateu lá em casa. Sabe para quê? Foi ele e o doutor Pedro Espíndola, chefe da delegacia especializada, de todas as delegacias especializadas, para pedir apoio do meu pai”. Neste exato momento, Jamil é interrompido pela defesa e a audiência encerrada sem o desfecho da história.
Consultado, o advogado Renê Siufi, que a vida toda trabalhou como defensor da família Name, negou todas as acusações e se defendeu dizendo que Jamilzinho "está louco". Já Marcelo Vargas e Pedro Espíndola de Camargo não foram localizados via celular.
Escândalo e corrupção – A Omertà revelou uma relação estreita entre integrantes da organização criminosa, acusados de liderar um grupo de extermínio no Estado e policiais civis. Além de prisões dentro das próprias delegacias, a força-tarefa montada para investigar o esquema também denunciou pressão da diretoria para dificultar as ações.
Em audiência, o delegado Carlos Delano, atual titular da DEH (Delegacia Especializada de Repressão aos Crimes de Homicídio), detalhou os episódios que o levou a ser removido do comando das investigações dos homicídios apurados pela operação Omertà, em 2019.
Segundo ele, o motivo foi abordagem a Flávio Correia Jamil Georges, o "Flavinho", filho de Fahd Jamil e a prisão de uma testemunha essencial do assassinato de Matheus Coutinho Xavier.
Ele também afirmou ao juiz ter sofrido “assédio” do diretor do departamento de polícia especializada, Pedro Espíndola de Camargo, para deixar o cargo na época. Logo que denúncias do envolvimento do diretor vieram à tona, ele foi removido do cargo. Após a troca, no entanto, a Polícia Civil emitiu nota alegando que as alterações eram corriqueiras.