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Solitário na paisagem, Bioparque é cartão-postal com entrada que decepciona

Arquiteto diz que o plano diretor do Parque das Nações previa o complexo em outra área

Por Cassia Modena | 18/08/2025 16:35
Solitário na paisagem, Bioparque é cartão-postal com entrada que decepciona
Rústico e quase sem sombra: calçadão que dá acesso à plataforma de entrada do Bioparque Pantanal (Foto: Henrique Kawaminami)

Apesar do formato achatado, o prédio do Bioparque Pantanal é um gigante. Ele pode ser visto a quilômetros de distância da parte alta de Campo Grande e não passa despercebido por quem percorre a avenida mais importante da cidade. Mas um pouco dessa imponência cai por terra quando o visitante chega e caminha até a entrada que levará à contemplação gratuita de 453 espécies de peixes e outros animais presentes no bioma que o local carrega no nome.

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O imponente Bioparque Pantanal, localizado na principal avenida de Campo Grande, destoa da paisagem urbana com sua arquitetura futurista. Contudo, a entrada, com trailers de lanches, vendedores ambulantes e calçada de brita, decepciona e contrasta com a grandiosidade da obra. O projeto original do arquiteto Ruy Ohtake previa rotatória, estacionamento e uma plataforma de acesso mais elaborada, diferente da execução atual. A ausência de um projeto paisagístico na área externa, com vegetação típica do Pantanal e do Cerrado, compromete a integração do Bioparque com o Parque das Nações Indígenas. A falta de arborização adequada intensifica o calor na região. Especialistas defendem melhorias que priorizem o pedestre e a inclusão de elementos que valorizem o entorno, como previsto em projeto paisagístico não aproveitado pelo governo estadual.

À direita e à esquerda ficam trailers de lanche e bebidas, sem qualquer padronização, além de vendedores ambulantes. Um calçadão feito de brita antecede a caminhada até uma cerca simplória e, aí sim, uma rampa revestida com granito. A arborização é rala e nenhum outro elemento vira ponto de partida para a imersão na experiência, nem mesmo um espelho d'água que simulasse um corixo pantaneiro.

O conjunto rústico faz contraste com o ar contemporâneo da cápsula metálica com hastes vermelhas que abriu as portas como complexo turístico e de pesquisa há mais de três anos e teve um custo total de aproximadamente R$ 230 milhões.

A arquitetura é assinada pelo brasileiro Ruy Ohtake (1938-2021). O detalhe é que uma das imagens do projeto disponibilizadas no site do escritório do arquiteto, que está localizado na Avenida Faria Lima, em São Paulo (SP), mostra uma entrada um pouco diferente da que foi executada.

Solitário na paisagem, Bioparque é cartão-postal com entrada que decepciona
Entrada do Bioparque no projeto de arquiteto incluía rotatória e estacionamento (Imagem: Reprodução/Ruy Ohtake)

Haveria rotatória e estacionamento localizados após a Avenida Afonso Pena e antes da plataforma de acesso, segundo o projeto original. A rampa elevada em relação à calçada permaneceu. Na imagem, o Bioparque já se destacava como um solitário na paisagem.

Pensar no pedestre - Eliane Guaraldo é professora do curso de Arquitetura e Urbanismo da UFMS (Universidade Federal de Mato Grosso do Sul) e fez parte da equipe que criou um projeto paisagístico não para a parte da frente, mas para o jardim descoberto que encerra o tour no Bioparque. Especialistas em flora aquática atuaram junto.

A professora conta que foram dois anos de trabalho sem remuneração prestados a convite do Governo de Mato Grosso do Sul que acabaram não sendo aproveitados. Ela e os demais envolvidos foram informados que não seria possível executar o projeto diante das paralisações da obra cercadas por polêmicas sobre desperdício de dinheiro público e investigações sobre possíveis desvios. Embora descartada, a proposta acabou até premiada em seminário internacional realizado na USP (Universidade de São Paulo) e recebeu destaque este ano em publicação segmentada da arquitetura.

Solitário na paisagem, Bioparque é cartão-postal com entrada que decepciona
Professora  Eliane Guaraldo avalia o que poderia melhorar na entrada (Foto: Henrique Kawaminami)

Na opinião da professora, a parte externa ao Bioparque também merecia um projeto paisagístico com espécies do Pantanal ou do Cerrado que o deixasse integrado ao Parque das Nações Indígenas. A arborização criaria um microclima para aliviar o calor nos dias mais quentes.

Ela sente falta, principalmente, de uma estrutura que coloque o pedestre no centro de tudo.

"Por que a gente não poderia tratar com um pouco mais de respeito todo esse pessoal que vai a pé? Priorizar o pedestre é uma tendência mundial", começa a professora.

Poderíamos sombrear mais a calçada e fazer um projeto de programação visual para trabalhar essa entrada, dirigindo o pedestre ao edifício, não com sinal de trânsito, mas por totens ali fora. A sinalização não deveria estar na recepção poluindo o prédio, deveria estar lá fora, porque a entrada do Bioparque é a rampa, não é o edifício. É como se a rampa não pertencesse, foi só um meio de acesso e uma solução estética no meu ponto de vista. Fica de fora do conjunto", avalia.

Solitário na paisagem, Bioparque é cartão-postal com entrada que decepciona
Em volta, piso quebrado e não há qualquer paisagismo à altura de um dos maiores cartões-postais da cidade (Foto: Paulo Francis)

Eliane, que já esteve nos aquários artificiais de Chicago (EUA) e Santos (SP), elogia outros pontos do projeto que foi executado no Bioparque.

"O de Chicago é bem interativo e o de Santos é uma concepção mais antiga. O nosso aquário tem um projeto muito bom em termos de suporte à vida, água e em termos de cenografia para representar os ambientes aquáticos. O túnel do Rio Paraguai do Bioparque é maravilhoso, você vê os peixes em cima de você. Nisso, é um projeto muito feliz, equipes muito competentes trabalharam nesse projeto", finaliza.

Local previsto era outro - Arquiteto que coordenou o plano diretor do Parque das Nações Indígenas, onde o Bioparque Pantanal está localizado, Bosco Delvizio explica que um aquário estava previsto como atração e centro de pesquisa em meio ao espaço verde desde a década de 1990.

A proposta seria construí-lo numa área mais "vazia", próxima à Rua Antônio Maria Coelho, mas completamente inserida dentro do Parque das Nações. Para entrar em um, seria preciso estar em outro.

Solitário na paisagem, Bioparque é cartão-postal com entrada que decepciona
Arquiteto Bosco Delvizio coordenou o plano diretor do Parque das Nações Indígenas, onde o Bioparque está (Foto: Cassia Modena)

"Tinha proximidade com um conjunto lacustre para dar vida a esse setor do parque. Seria numa região superbonita, que tem pequenos bosques, onde hoje falta um oxigênio, falta vida", diz.

Um dos acessos previstos para o aquário na época do plano diretor ainda existe na Avenida Mato Grosso, mas não é utilizado, segundo Bosco. Inclusive, ele estaria mais relacionado à proposta da atração.

"No meio do caminho, o local foi alterado. Eu não sei a justificativa, não conheço. A escolha foi a área da Avenida Afonso Pena onde seria, a princípio, só uma área de estacionamentos", relembra.

O arquiteto concorda que a entrada atual deixa a desejar e vê problema no complexo ficar oposto, de certa forma, ao Parque das Nações, apesar de ocupar sua área. Ele propõe que seja feita uma conexão.

Solitário na paisagem, Bioparque é cartão-postal com entrada que decepciona
Ambulantes colocam tendas na calçada, mesa e cadeiras sem qualquer padronização. (Foto: Henrique Kawaminami)

"Tem que sofrer uma nova urbanização, precisa de um novo desenho levando em consideração a integração do Bioparque, o calçadão da Avenida Afonso Pena e o Parque das Nações Indígenas. Eu não abriria mão disso. Hoje, ele 'está de costas' para o parque", afirma.

Bosco também sugere melhorias pensadas para o pedestre. "Precisa ter definições de fluxo, de caminhos para as pessoas. Uma previsão de quiosques para vendas de forma organizada, que não interfiram visualmente nem causem nenhuma obstrução", inclui.

Opinião de quem teve a experiência - O autônomo Luciano Antônio de Oliveira, 61, visitou o Bioparque Pantanal pela primeira vez na última sexta-feira (15) com a esposa e o filho adolescente. Antes de entrar, afirmou ter ficado impressionado com a beleza do prédio e admitiu que não reparou no entorno.

Solitário na paisagem, Bioparque é cartão-postal com entrada que decepciona
Família de Bodoquena fala sobre o que achou da entrada (Foto: Henrique Kawaminami)

De Bodoquena, a família parou para analisar o espaço da frente e concluiu que faltava algo. "Ficou muito 'limpo' aqui nessa rampa", disse a dona de casa Leila de Jesus, 49, esposa de Luciano. "Poderia ficar mais caprichado e aconchegante. Quem sabe uns peixes para mostrar para os turistas de outros estados o que temos aqui", completou o autônomo.

O casal Marley Victor, 51, e Marcelina Vaz, 47, veio de Fortaleza (CE) para visitar o Pantanal sul-mato-grossense e passou no Bioparque no mesmo dia que a família de Luciano.

Bancária, Marcelina Vaz afirma que já esteve no aquário de Lisboa, em Portugal, e se encantou, mas a experiência não se comparava à de visitar uma atração de seu país. "É diferente quando é na terra da gente", fala.

Comerciante, Marley Victor sugeriu que o Bioparque oferecesse uma praça de alimentação interna para atender o visitante que finalizasse a visita. Porém, ele afirmou que já ficou satisfeito com a estrutura atual. "A experiência principal foi conhecer a biodiversidade", frisou.

Solitário na paisagem, Bioparque é cartão-postal com entrada que decepciona
Cones velhos e portão simplório são única segurança no acesso à rampa do Bioparque (Foto: Paulo Francis)

Previsão de projeto - O Campo Grande News questionou o Imasul (Instituto do Meio Ambiente de Mato Grosso do Sul), do Governo do Estado, se há previsão de novos projetos para a entrada do Bioparque Pantanal e também perguntou como está sendo administrada a presença dos trailers e de ambulantes no entorno. A assessoria do órgão afirmou que estava consultando sua gerência interna, mas não enviou resposta até a publicação da matéria.

A Prefeitura de Campo Grande também foi questionada sobre sinalização e uso da calçada da Avenida Afonso Pena. Por e-mail, informou que o Imasul cuida de todo o complexo.

A gestão do Bioparque Pantanal se manifestou em nota, esclarecendo que não prevê lançamentos de novos projetos e que está focada em ESG (Environmental, Social and Governance) neste momento.

"Neste ano, o Bioparque Pantanal está intensificando de forma estratégica suas ações alinhadas aos princípios ESG, reafirmando nosso compromisso com a sustentabilidade ambiental, a responsabilidade social e a governança ética. Ampliamos iniciativas voltadas à redução dos impactos ambientais, à conservação da biodiversidade e ao fortalecimento de programas inclusivos e de educação ambiental. Essas ações integram uma visão integrada e inovadora, que busca conciliar preservação ambiental com desenvolvimento social. Nosso objetivo é consolidar o Bioparque Pantanal como uma referência nacional na promoção de práticas sustentáveis, demonstrando que é possível unir inovação, preservação e inclusão para gerar impactos positivos tanto para o meio ambiente quanto para a sociedade", pontuou.

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