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48 anos de "Mato Grosso do Sul"

Por Carlos Magno Amarilha (*) | 11/10/2025 08:30

A celebração do aniversário de Mato Grosso “do Sul”, cuja criação foi oficializada em 11 de outubro de 1977, remete a um período de intensa articulação política e debates fervorosos que culminaram na escolha de seu nome, que teve seu nome oficial como "Estado de Campo Grande". Quando o então presidente Ernesto Geisel anunciou em 03 de maio de 1977 o desmembramento do antigo Mato Grosso, o “nome” de Campo Grande, desagradou profundamente às lideranças e à população do interior. Longe de ser uma oposição à separação em si, a controvérsia residia em batizar o novo estado com o nome de sua capital. Intelectuais, políticos e a imprensa de cidades como Dourados, Corumbá, Cuiabá, Brasília, mobilizaram-se, argumentando que a denominação era exclusivista e negligenciava a vasta e diversa geografia e história da porção meridional do estado.

Em Dourados, este debate ganhou contornos práticos. Divulgado nos jornais e nas rádios locais, a indignação do nome. O professor Wilson Valentim Biasotto publicou um artigo no Jornal O Progresso, em que as sugestões mais comentadas eram "Estado de Campo Grande", "Estado de Maracaju" e, com menos entusiasmo, "Entre-Rios". A opção "Entre-Rios" foi rapidamente descartada, pois, apesar de o território ser uma mesopotâmia, o nome já havia sido usado sem sucesso em uma cidade (que se tornaria Rio Brilhante).

A sugestão de estender o nome da capital para todo o estado, "Estado de Campo Grande", era vista com ressalvas. O professor Biasotto ponderava que, embora a capital abarcasse uma realidade de vastos campos, estender essa denominação para o estado inteiro daria um estímulo excessivo ao que era percebido, à época, como um forte bairrismo campo-grandense. A alternativa "Maracaju", que remetia à importante serra e planalto, também não parecia ideal, pois significaria repetir o nome de um relevo e de uma cidade, além de não representar a totalidade do novo território.

O consenso que emergiu da sociedade civil e das articulações políticas foi o nome Mato Grosso do Sul. A decisão se fundamentava em manter um elo com o passado histórico e cultural. A separação, argumentava-se, era de caráter político e territorial, mas os laços com o antigo Mato Grosso deveriam ser preservados. A escolha, além de unificar as diversas regiões do sul do estado, resguardaria as lembranças e a tradição dos mais velhos.

A SERIEMA COMO PANO DE FUNDO DA POLÊMICA

A discussão sobre o nome ganhou um toque pitoresco e cultural que demonstrou a força do anseio popular. O jornalista Valfrido Silva, inspirado por uma conversa com o professor Biasotto, publicou um artigo que gerou grande repercussão, intitulado: "Pra quem fica a Seriema?". A ave, símbolo da região e imortalizada em uma famosa canção sertaneja — "ó Seriema de Mato Grosso, teu canto triste me faz lembrar..."- se tornou o centro de um debate metafórico.

O questionamento era simples: se o novo estado se chamasse "Estado de Campo Grande" e a canção fizesse referência a cidades como Maracaju e Ponta Porã, que estariam na nova unidade, seria justo que a Seriema fosse para o Mato Grosso? A sugestão de alterar a letra da música para "Seriema de Campo Grande" era vista como inviável, e a ideia de transferir o símbolo para o Norte parecia um despropósito cultural.

Essa mobilização, centrada em um ícone popular, reforçou a ideia de que a mudança de nome não era apenas um capricho político, mas uma demanda que ressoava na alma da população.

A VITÓRIA DA HISTÓRIA E DA REPRESENTATIVIDADE

A pressão política surtiu efeito. O projeto de lei complementar de criação do novo estado, que havia sido enviado ao Congresso em 24 de agosto de 1977, foi alterado o nome para "Mato Grosso do Sul”. A capital, sim, foi estabelecida de forma "lacônica e contundente" em Campo Grande, mas o estado herdou o nome que carregava a tradição e a representatividade de todas as suas regiões: Mato Grosso do Sul.

A opção por esse nome contemplou dois aspectos fundamentais: garantiu que todos os mato-grossenses do sul estivessem representados, e não apenas a capital, e honrou o passado comum, as "origens histórico-culturais comuns" que ligavam sul e norte. Assim, a história foi o elemento decisivo, embora a decisão do presidente, que inicialmente tentou batizar a unidade sem uma consulta popular, tenha sido um ato que "prescindiu de participação democrática". No entanto, o anseio da classe política do interior e dos intelectuais (jornalistas e professores) falou mais alto, e em 11 de outubro de 1977, nascia oficialmente o estado com os políticos, intelectuais, debateram na época.

(*) Texto de Carlos Magno Amarilha In: Os intelectuais e o poder. Grupo Literário Arandu. 2022  

 

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