Reforma em escola rendeu propina de R$ 60 mil a prefeito de Terenos, diz MPMS
Investigação aponta que empreiteiros fizeram dois repasses de R$ 30 mil, em dinheiro, no acordo fraudulento
“Você viu lá que eu mandei os trinta do homi, né?” Esse é um dos diálogos interceptados na investigação que apura esquema de fraude em licitações e contratos da Prefeitura de Terenos. O “homi”, segundo apurado pelo MPMS (Ministério Público de Mato Grosso do Sul), é o chefe do Executivo daquele município, Henrique Wancura Budke (PSDB), que, somente em um dos esquemas, teria recebido R$ 60 mil em propina.
RESUMO
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A Operação Spotless, deflagrada pelo Ministério Público de Mato Grosso do Sul, investiga um esquema de fraude em licitações e contratos da Prefeitura de Terenos, envolvendo o prefeito Henrique Wancura Budke. O esquema, que soma R$ 15 milhões, inclui propinas pagas por empresas vencedoras de licitações, como a Angico Construtora, que obteve contrato de R$ 1,1 milhão para reformar uma escola. Interceptações telefônicas revelaram diálogos entre o prefeito, empresários e funcionários públicos, detalhando o pagamento de R$ 60 mil em propinas. A operação resultou em 19 mandados de prisão e 59 de busca e apreensão, com 16 investigados presos, incluindo o prefeito e empresários envolvidos. As provas coletadas serão compartilhadas com órgãos de controle para aprofundar as investigações.
A apuração do Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado) e do Gecoc (Grupo Especial de Combate à Corrupção) desencadeou a Operação Spotless, com expedição de 19 mandados de prisão e 59 de busca e apreensão em Campo Grande e Terenos. O MPMS investiga esquema de fraude em contratos que somam R$ 15 milhões.
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Segundo a investigação, o pagamento da propina refere-se à reforma e ampliação da Escola Municipal Rosa Idalina Braga Barboza, com licitação aberta em dezembro de 2021. O certame foi vencido pela empresa Angico Construtora e Prestadora de Serviços Ltda., de propriedade de Sandro José Bortoloto, que fechou contrato de R$ 1.123.417,39.
Mas para que se chegasse a este resultado, o grupo agiu para fraudar a licitação. De acordo com o Gaeco, o esquema foi montado antes mesmo da abertura do certame, com a participação do prefeito, do então chefe de gabinete Tiago Lopes de Oliveira e do então secretário municipal de Obras, Isaac Cardoso Bisneto. Mensagens de WhatsApp capturadas com autorização judicial mostram que Bortoloto foi responsável por elaborar os projetos arquitetônico, estrutural, elétrico e hidrossanitário da obra, além do memorial descritivo e da planilha orçamentária, semanas antes do edital ser publicado.
Nessas conversas, Tiago teria orientado o empresário a preparar a documentação da licitação, que só depois seria oficialmente lançada. Sandro chegou a visitar a escola, fotografar o local e repassar instruções à engenheira Fernanda Fidelis de Souza, contratada por ele antes da publicação do edital.
Além da Angico, figuravam no certame a Bonanza Comércio e Serviços, de Cleberson José Chavoni Silva, apontado como sócio oculto de Sandro, e a Tecnika Construção e Locação de Equipamentos Ltda., de Rinaldo Cordoba de Oliveira, que teria recebido R$ 15 mil para apresentar proposta de cobertura, sem disputar de fato a obra.
As interceptações apontam, ainda, que Bortoloto discutiu em mensagens com Tiago Lopes e Isaac Bisneto, sugerindo R$ 2 milhões. Dias depois, o chefe de gabinete, em contato direto com o prefeito, teria ajustado o valor para cerca de R$ 1 milhão, como, de fato, foi publicado no edital.
Consegue 3? – Após a vitória da Angico, o Gaeco identificou pagamentos de propina ao prefeito. Em 14 de março de 2022, depois de a prefeitura quitar R$ 82.884,41 à empresa Angico pela obra na escola, o prefeito passou a enviar mensagens pedindo um encontro com o empreiteiro. “Hein, volta sexta? Consegue 3? Daí pego com você”. Apesar de cifrada, a mensagem indicaria o pedido de pagamento da propina.
No dia 16 de março, a empresa recebeu mais R$ 56.321,66 em pagamento pela obra. No dia seguinte, de acordo com o MPMS, por conta da insistência do prefeito, Bortoloto foi até Terenos e fez três saques de R$ 10 mil em agência bancária da cidade. Naquela tarde, em mensagem a Cleberson José Chavoni Silva, que seria sócio do empreiteiro nas negociatas, confirmou o repasse ao prefeito: “Você viu lá que eu mandei os trinta do homi, né?”
Outro repasse, também de R$ 30 mil, teria ocorrido em julho de 2022. No dia 5, Chavoni mandou mensagem ao prefeito perguntando sobre a nota fiscal no valor de R$ 231.590,96 à Angico. Henrique Budke respondeu que o pagamento seria feito no dia seguinte.
No dia 6, a investigação interceptou diálogo entre Chavoni e Bortoloto. “Falou com o 01?”, o primeiro questiona. Em seguida, o dono da Angico fala com o prefeito, que responde: “No jeito”. Chavoni teria se encontrado com Budke no mesmo dia em que foi efetuado o pagamento de R$ 231.590,00 em favor da construtora.
Após a confirmação do pagamento, Bortoloto fez um Pix para o comparsa, no valor de R$ 63 mil. Chavoni sacou R$ 30 mil, dinheiro que teria sido pago pessoalmente ao prefeito, de acordo com a investigação.
Coleta de provas – A decisão do desembargador Jairo Roberto de Quadros, do TJMS (Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul), levou em conta os indícios detalhados pelo MPMS para determinar a prisão de 16 investigados e os mandados de busca e apreensão.
Os mandados de prisão foram expedidos contra Henrique Wancura Budke, Arnaldo Santiago, Cleberson José Chavoni Silva, Eduardo Schoier, Fábio André Hoffmeister Ramires, Fernando Seiji Alves Kurose, Genilton da Silva Moreira, Hander Luiz Correa Grote Chaves, Isaac Cardoso Bisneto, Leandro Cícero Almeida de Brito, Nádia Mendonça Lopes, Orlei Figueiredo Lopes, Sandro José Bortoloto, Sansão Inácio Rezende, Tiago Lopes de Oliveira e Valdecir Batista Alves.
Os mandados de busca e apreensão e de acesso aos telefones celulares e aos dispositivos informáticos foram expedidos para endereços residenciais e profissionais dos que tiveram a prisão decretada e de outros investigados: Henrique Wancura Budke, Arnaldo Santiago, Cleberson José Chavoni Silva, Eduardo Schoier, Fábio André Hoffmeister Ramires, Fernando Seiji Alves Kurose, Genilton da Silva Moreira, Hander Luiz Correa Grote Chaves, Isaac Cardoso Bisneto, Leandro Cícero Almeida de Brito, Nádia Mendonça Lopes, Orlei Figueiredo Lopes, Sandro José Bortoloto, Sansão Inácio Rezende, Tiago Lopes de Oliveira, Valdecir Batista Alves, Alexandre Oliveira Pinheiro, Arnaldo Godoy Cardoso Glagau, Celso Ricardo Gazola, Daniel Matias Queiroz, Edneia Rodrigues Vicente, Felipe Braga Martins, Fernanda Fidelis de Souza, Fernando Gomes Camargo, Jucélia Maria de Oliveira, Luziano dos Santos Neto, Maicon Bezerra Nonato, Marcos do Nascimento Galitzki, Rinaldo Cordoba de Oliveira, Rogério Luiz Ribeiro, Stenia Sousa da Silva e Vanuza Cândida Jardim.
As ordens foram expedidas com o fim específico de coletar provas relativas à prática de crimes em apuração na investigação. O desembargador ainda autorizou o compartilhamento de provas com a Polícia Civil, Polícia Federal, TCE (Tribunal de Contas do Estado) e demais órgãos de controle.
Custódia - Os presos passaram por audiência de custódia esta manhã e, como o mandado de prisão foi expedido pelo TJMS, o juiz não tem competência para conceder liberdade, apenas atestar as condições do preso.
No caso de Arnaldo Santiago, foi expedido alvará de soltura no flagrante por porte de munições, mas ele continuará detido por conta da operação, conforme informou o advogado, William Maksoud Machado. O advogado Murilo Marques, que representa Fernando Seiji Alves Kurose, disse que ainda analisa o caso para pedir a revogação da prisão.
O advogado Cauê Siqueira, que representa Hander Luiz Correa Grote Chaves, Orlei Figueiredo Lopes e Eduardo Schoier, disse que ainda não teve acesso integral aos autos. "A princípio não existe contemporaneidade dos fatos para que seja decretada a prisão preventiva. De toda forma, estaremos atentos e aguardando o acesso integral do processo para entender melhor a situação", informou. A reportagem não conseguiu contato com outras defesas.
Os presos serão transferidos para o Centro de Triagem.
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