O fiofó do rei ou o nascimento da profissão de cirurgião
Os franceses acreditavam que o Rei Sol estava morrendo pois sofre de um mal dos fundilhos. Os médicos, todos impotentes para curá-lo, são obrigados a dar lugar a Félix, o barbeiro. Félix cura o rei graças a uma operação que ainda hoje é chamada de “a cirurgia real” e lhe pede como recompensa instituir a cirurgia como profissão. Essa é a história que brevemente será contada.
Enquanto caçava sentia uma quentura nas nádegas.
Era fevereiro de 1.686. O rei da França caçava. Seguindo a matilha bem de perto, acabara se distanciando dos demais caçadores. Parou um instante. Estava banhado de suor, embora o ar matinal estivesse glacial. Luis sentia uma quentura nas nádegas, que o incomodava desde o inicio da caçada. Ele se massageou um pouco sob a calça. O resto dos caçadores já o alcançavam. O rei se empertigou nos dois estribos. Fingindo nada sentir, gritou: “Vamos pegar aquela raposa”. Luis XV era apaixonado pela caça. Depois das mulheres, encurralar um animal era sua maior paixão.
Dor cada vez mais intensa.
De volta à realidade cotidiana, o rei começava a se preocupar com a dor em suas nádegas. No início, não parecia grave. Mas foi ficando cada vez mais intensa. Passara a mão sob a calça e sentira um inchaço dolorido no meio das nádegas. Talvez fosse apenas a fricção conta a sela do cavalo. As últimas caçadas tinham sido longas….
Purgantes receitados.
Aquin e Fagon eram seus médicos. Eles lhes deram purgantes para eliminar os humores maléficos de seu corpo. “Ora Majestade, excesso de assados, galinhas, aves temperadas e muitos vinhos, é preciso se conter para clarear o sangue”, disseram eles. Dizer isso era fácil para aquele dois médicos “pele e osso”. Não apreciavam as comidas e nem as mulheres. Luis era um glutão. Os médicos preferiam a água aos vinhos de Borgonha. Foi então que Aquin examinou pela primeira vez o abcesso glúteo do rei e entendeu que era devido às cavalgadas traumatizante, aos excessos alimentares e de vinhos. Ninguém lhe chamou a atenção para sua higiene deplorável. Fedia. Luis estava convencido de que se lavar não era bom para a saúde. Só lavava o rosto rapidamente pelas manhãs. Teve febre. Foi para a cama, algo estranho para ele. Tudo que os médicos tentaram não deram resultado.
Apenas uma solução: a cirurgia feita por um barbeiro.
É preciso abrir tudo. Abrir o abcesso para a drenagem, e obrigar a cicatrização. Apesar de suas reticências, tiveram de chamar Félix, o barbeiro. Precisava usar sua lanceta para abrir o abcesso, determinaram os médicos. Mas Félix era experiente e sabia que não daria certo. Ele sabia que seria necessário aplainar totalmente a fístula, uma “grande operação”. Requeria um corte longo e profundo. Os médicos eram contrários. Preferiam pomadas e unguentos, além de curativos com estopa e sangrias. No final, já em novembro, venceu o barbeiro. E teve sucesso. Pediu ao rei que reconhecesse a profissão de cirurgião, que ele era exímio por ter estudado muito e praticado em soldados nas guerras. O rei concordou. Nascia a profissão de cirurgião.
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