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Educação e Tecnologia

Das minorias sociais à pandemia, como o Enem aborda temas atuais?

Professores explicam como Inep usa mudanças sociais e culturais do País para elaborar questões

Por Jéssica Fernandes | 01/11/2024 12:58


Professor de redação, Cadu Silva comenta característica do exame. (Foto: Marcos Maluf)
Professor de redação, Cadu Silva comenta característica do exame. (Foto: Marcos Maluf)

RESUMO

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O Enem, exame que avalia o ensino médio no Brasil, tem se adaptado às mudanças culturais e sociais do país, interligando fatos históricos a temas contemporâneos por meio da música, literatura e novas linguagens. A prova, que antes priorizava a contextualização, passou por um período mais conteudista, mas atualmente busca um equilíbrio entre os dois aspectos, cobrando a aplicação de conhecimentos do ensino médio em situações reais. Temas como movimentos sociais, minorias, direitos civis e cultura popular são explorados, com foco em conectar o passado ao presente. A prova utiliza obras de autores clássicos como Castro Alves e autores contemporâneos como Racionais MC's para ilustrar conceitos e estimular a análise crítica dos alunos. Aspectos históricos como a Constituição de 1934, o golpe militar de 1964 e a pandemia de Covid-19 também são abordados, incentivando reflexões sobre o contexto social e político do Brasil.

Interligando fatos históricos a temas recentes através da música, literatura e novas linguagens, o Enem (Exame Nacional do Ensino Médio) se mantém em constante atualização sem perder o ritmo. Mas, como as mudanças culturais e sociais do País são apresentadas na prova? Professores de Campo Grande falam sobre as principais modificações e como elas podem aparecer no exame, que terá a primeira fase aplicada no domingo (3).

Elaborado pelo Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas), o exame tinha um perfil contextualizador com foco em cobrar dos alunos a capacidade de entendimento de cada um e também sobre o mundo em que estavam inseridos.

Essa constatação é do professor de redação do Colégio Nota 10, Cadu Silva, que comenta como essa característica marcante mudou desde o início de 2000. A alteração, segundo ele, partiu de uma pressão dos vestibulares para que o Enem ficasse mais próximo do modelo aplicado na época.

“A prova começa a ser mais conteudista, passa a cobrar conceitos, abrindo mão lentamente da capacidade de entender o mundo que te rodeia para passar a ser uma prova baseada em formalismos e conceituações. Esse processo durou quase 10 anos”, explica.

Já nos últimos seis anos, a prova alcança o meio-termo entre ser contextualizada e conteudista. “É uma prova que é capaz de medir o quanto os conteúdos dados no Ensino Médio conseguem ser aplicados no mundo real. [...] Ao longo do processo a prova foi construindo sua identidade com a participação da sociedade”, completa.

Exemplo disso é a redação que nas últimas edições trouxe temas diversos, como "Desafios para a formação educacional de surdos no Brasil", “Democratização do acesso ao cinema no Brasil", “Invisibilidade e registro civil: garantia de acesso à cidadania no Brasil” e “Desafios para o enfrentamento da invisibilidade do trabalho de cuidado realizado pela mulher no Brasil".

Textos de apoio da redação de 2023 sobre o trabalho de cuidado realizado pelas mulheres. (Foto: Divulgação)
Textos de apoio da redação de 2023 sobre o trabalho de cuidado realizado pelas mulheres. (Foto: Divulgação)

Segundo o professor, a ascensão de movimentos sociais são sempre aproveitados em uma ou mais questões. Normalmente, elas unem sociologia, história e atualidades. Ou seja, a prova pode ligar o “Diretas Já” de 1983 aos protestos de 2013 que começaram devido ao aumento de 20 centavos da passagem de ônibus.

“[O Enem] tem trazido a ideia desses movimentos para mostrar como o perfil da sociedade tem mudado. A jogada é comparar como era ontem e como é hoje. Os movimentos sociais antes eram caracterizados por pautas gerais, mas de 2013 para cá passamos a ter pautas específicas”, fala.

Minorias sociais, preconceitos e ideias de liberdade que integram o eixo temático de cultura e liberdade também têm sido bem aproveitados pelo Inep desde 2010.

Rossini Benício fala sobre questões atuais do Enem na literatura. (Foto: Jéssica Fernandes)
Rossini Benício fala sobre questões atuais do Enem na literatura. (Foto: Jéssica Fernandes)

Castro Alves e Racionais - Professor de língua portuguesa e literatura do Colégio Nota 10, Rossini Benício conta como o Enem não se prende mais à “literatura pela literatura”. Prova disso é que as questões não focam somente em escritores ou poetas que marcaram movimentos literários, como Machado de Assis no realismo brasileiro.

“O Enem pega um rock brasileiro e explora como ele tem influência de um escritor conceituado. [...] Por exemplo, pega um texto clássico do Alves Castro sobre escravidão e um texto moderno dos ‘Racionais’. O aluno que só decora não vai entender, mas o que contextualiza sim. O exame não necessariamente vai pegar Camões, ele quer trazer a literatura como algo do dia a dia”, ressalta.

Como mencionado anteriormente, as minorias sociais são pautas aproveitadas pelo Inep. Rossini cita alguns dos grupos que servem para contextualizar assuntos apresentados no Enem. “A população inviabilizada tem mais protagonismo. A comunnidade LGBTQIA+, negros, quilombolas, ribeirinhos. Ano passado caiu o Brôs MC’s, slam. [...] Essa população invisibilizada, o Enem dá voz a eles”, diz.

Grupo de rap indígena de Dourados, Brô MCs inspirou questão do Enem de 2023. 
Grupo de rap indígena de Dourados, Brô MCs inspirou questão do Enem de 2023.

Com a visão de que o Inep tem mais liberdade para transitar entre temas que são considerados “polêmicos” por muitos, como intolerância religiosa e até a população travesti, o professor procura fazer a ponte entre os assuntos passados e atuais seguindo o exemplo da prova.

“Hoje a minha aula foi sobre isso, passei músicas sobre o tropicalismo, bossa nova, Clube de Esquina, mas também passei pelo Charlie Brown Jr porque é cultura de rua, fez a cabeça de muita gente. Eu vou passando músicas e tentando cooptar com as músicas de hoje”, esclarece.

Em relação à área de códigos e linguagens, é a área de conhecimento aplicada no domingo, o professor aborda alguns dos assuntos que podem cair. “Eles não cobram gramática, cobram figuras de linguagens, tipos de linguagem, figuras de linguagem. Eles gostam desse tipo de texto, se é editorial, se é notícia”, completa.

Charges e tirinhas também podem aparecer para os vestibulandos no domingo. Mafalda, Turma da Mônica e até Calvin e Haroldo podem ser usados para que o aluno tenha que interpretar determinado tema.

Professor de história do colégio Nota 10, Henry Guimarães é mais um que fala sobre os assuntos atuais abordados pela banca. Um dos assuntos cotados para essa edição, conforme o professor, é a Constituição de 1934 que completou 90 anos de criação.

“O Enem gosta de pegar essas datas fechadas para provocar discussões. A Constituição de 1934 é a que menos durou na história do Brasil, mas traz uma coisa importante porque ratifica o direito das mulheres ao voto. Uma questão que o Enem pode pegar é sobre o voto feminino e sobre a baixa participação delas na política”, relata.

Os 60 anos do golpe militar, que deu início ao regime de ditadura no País, é mais um cotado. De acordo com o professor, o Inep pode trazer esse fato para falar sobre a democracia. “Como isso pode ser colocado hoje? Como é viver em um País sem democracia?”, indaga.

Acontecimentos atuais não demoram muito para aparecer entre uma edição e outra. Prova disso é que o instituto trouxe a pandemia, que começou em março de 2020, em questão.

“Um paralelo muito bacana é entender o que foi a Revolta da Vacina e o que é hoje o movimento antivacina, que são coisas totalmente diferentes. Naquela época a população sem instrução foi obrigada a se vacinar forçadamente sem explicar os benefícios. Hoje em dia a gente sabe os benefícios que a vacinação traz, mas mesmo assim o movimento é por causa de fake news”, destaca.

Em Mato Grosso do Sul,  51.199 realizam no domingo (03) a primeira etapa do Enem. No dia, os vestibulandos encaram 45 questões de linguagens, 45 questões de ciências humanas e redação. Já no dia 10 de novembro é a vez das ciências exatas e ciências da natureza.

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