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Artes

Guerreiro de mural na 13 de Maio foi primeiro de MS a discursar na ONU

Artista visual, Kelton Medeiros levou Marçal De Souza em formato de lambe-lambe para muro no Centro

Aletheya Alves | 18/01/2023 06:17
Mural com Marçal de Souza chama atenção para história de Marçal de Souza. (Foto: Henrique Kawaminami)
Mural com Marçal de Souza chama atenção para história de Marçal de Souza. (Foto: Henrique Kawaminami)

Nascido Rincão de Júlio, região de Ponta Porã, Tupã-Y foi o primeiro sul-mato-grossense a discursar na ONU (Organização das Nações Unidas) e, 39 anos depois de seu assassinato, a luta do guerreiro precisa ser relembrada periodicamente. No Centro de Campo Grande, garantindo que quem ainda não saiba de sua história tenha esse contato, o homem mais conhecido como Marçal de Souza encara quem passa pela 13 de Maio através de um lambe-lambe. E você, sabe quem é Tupã-Y?

“O mestre Marçal é histórico!”, resume o artista visual e produtor audiovisual, Kelton Medeiros. Responsável pelo mural do líder indígena, ele explica que desde 2020 vinha pensando sobre como criar uma arte que levasse essa luta para as ruas.

Tupã-Y, que significa “pequeno Deus”, nasceu em 1920 e, em 1980, discursou até mesmo para o papa, então João Paulo II. “Queremos dizer a Vossa Santidade a nossa miséria, a nossa tristeza pela morte de nossos líderes assassinados friamente por aqueles que tomam nosso chão, aquilo que para nós representa a própria vida e nossa sobrevivência neste grande Brasil, chamado um país cristão”, disse Marçal em sua fala.

Pouco tempo depois, Marçal foi assassinado com cinco tiros em Antônio João, na porta de casa. “Veja que ele foi assassinado covardemente em 1983 e até hoje seu legado de resistência aparece para lembrar das milhares de vozes dos povos originários”, diz Kelton.

Desde a década de 1940, o homem que se tornou símbolo começou a conhecer mais profundamente as aldeias da região de Dourados como um pregador cristão. Com isso, se aprofundou sobre os sofrimentos do povo guarani.

No caminho, Marçal relatou que conheceu o antropólogo Darcy Ribeiro e em meio à sua própria trajetória, decidiu batalhar pela cultura, a crença e a riqueza de seu povo, como contou em seminário de estudos indigenistas de 1980.

Homenagem foi feita com a frase "Questione. Salve, Marçal de Souza". (Foto: Aniela Paes)
Homenagem foi feita com a frase "Questione. Salve, Marçal de Souza". (Foto: Aniela Paes)

Depois de se tornar auxiliar de enfermagem, o homem foi eleito capitão da reserva indígena de Dourados e, em meados da década de 1960, começou a estimular desde a produção própria das lavouras até o retorno de indígenas que não compunham nenhuma aldeia, além da retomada das crenças e das terras.

Tomando repercussão internacional, em março de 1981, durante uma conferência promovida pela ONU em Boston nos Estados Unidos, Marçal relatou sobre a atuação de mineradoras em terras indígenas. E, com a amplificação de sua voz, o perigo com sua própria vida cresceu.

Assim como perseguições seguem ocorrendo hoje com outros líderes indígenas, Tupã-Y passou a ser ameaçado e agredido devido à sua atuação. O aumento das violências cometidas contra a liderança seguiram e, em 1983, assumiu que era “uma pessoa marcada para morrer”, mas que “por uma causa justa a gente morre. Alguém tem que perder a vida por uma causa”, durante um debate no Rio de Janeiro.

Confirmando a escalada da violência, Marçal foi assassinado por dois homem com cinco tiros, incluindo um na boca.

“Eu adoro ouvir histórias e a do Marçal é aquelas que ouvimos e nunca conseguimos esquecer. Eu já tinha a ideia de fazer algo, vinha ensaiando desde 2020 e não tinha uma visão inteira sobre a luta dos povos originários. Através do meu amigo de infância Leosmar Terena, que é um ativista ambiental e estudamos juntos em um internato na região de Miranda nos anos 90, consegui aprofundar um pouco mais e surgiu Marçal”, conta Kelton sobre o mural em Campo Grande.

Além da foto do líder indígena, o artista inseriu a frase “Questione. Salve, Marçal de Souza”. Sobre o impacto dos lambe-lambe espalhados pela cidade e o movimento de rua, Kelton detalha que o início de uma reflexão já integra o caminho.

“Penso que se gerar uma reflexão e um olhar em uma pessoa, já é uma semente de questionamento que ela teve. O fato dela parar ali e tirar uma foto ou querer entender ou saber quem é, isso já faz ela ir atrás daquela história e me deixa bem contente. Outros artistas de lambe como o Léo Mareco, Thalita Nogueira e a galera dos stickers também tem um trabalho visual bem questionador e direto. É um gerador de reflexões, não é só arte por arte”, completa Medeiros.

Colagem desperta o contato direto com a figura. (Foto: Aniela Paes)
Colagem desperta o contato direto com a figura. (Foto: Aniela Paes)

Leia e assista sobre Marçal

E, como Kelton relata, procurar sobre as histórias é um dos caminhos possíveis. Especificamente sobre Marçal há uma variedade de produções que contam sobre sua trajetória, indo desde artigos científicos até documentários.

Publicado pela revista do programa de pós-graduação em Sociologia da UFGD (Universidade Federal da Grande Dourados), o texto “‘Temos o dever sagrado de defender o que é nosso’: a trajetória e a luta política de Marçal de Souza Tupã’I” pode ser consultado aqui.

Produzido pelo Cimi (Conselho Indigenista Missionário), um texto mais breve também pode ajudar no conhecimento sobre Tupã-Y (veja aqui) e, em 2020, a Revista Badaró publicou uma narrativa em quadrinhos sobre sua vida e morte (confira aqui).

Já no âmbito audiovisual, Natalia Moraes e Carol Caco produziram o documentário “À procura de Marçal”, que pode ser visto neste link. Outra alternativa é um documentário produzido por alunos da Uniderp Dourados (veja aqui).

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