História de sargento contada aos netos é transformada em filme
Sargento Cézar Glauco dos Santos Braga liderou operação secreta contra acampamento guerrilheiro
Durante 17 minutos, o sargento Cézar Glauco dos Santos Braga, aos 90 anos, estrela um filme em que o foco realmente é ele mesmo na vida real. Tendo na mente desde a infância a história de como o avô recebeu uma honraria por liderar uma operação secreta, o diretor Renan Braga decidiu transformar as palavras do militar em audiovisual como uma forma de resgate e homenagem.
Nas cenas, Amarilis, filha de Renan, conversa com Cézar, seu bisavô. Algo parecido com o que já aconteceu antes, com o diretor do filme. “Tenho a impressão de que escuto essa história do meu avô desde que eu era criança - desde que eu tinha a idade da minha filha. Acho que me causava uma certa hipnose na cadência como ele contava suas histórias, eu tinha esse fascínio de querer ficar ouvindo mesmo que não compreendesse totalmente o que ele narrava”.
Em 2016, quando havia concluído o primeiro ano na Escola de Cinema de Cuba, as gravações do avô contando histórias começaram. Renan explica que estava, de certa forma, obcecado em documentar através do audiovisual.
Após ouvir novamente sobre a medalha, começou a mergulhar nas bibliografias. Formado em direção de cinema pela Escuela Internacional de Cine y Televisión de Cuba, Renan pesquisou documentos oficiais que sustentassem os relatos do avô.
“Para minha surpresa, esses mesmos documentos haviam sido redigitalizados e colocados à disposição pelo Superior Tribunal Militar numa seção de processos históricos julgados. Durante essa pesquisa, também me correspondi com historiadores paraguaios cujos artigos confirmavam os relatos do meu avô. Esses historiadores foram muito gentis comigo e me ligaram a outras fontes. A partir disso, só cresceu meu desejo por contar essa história”.
Confira a sinopse:
O filme, de 17 minutos de duração, se desenrola em uma tarde aparentemente comum, quando uma queda de energia leva uma menina de oito anos a explorar fotos antigas na casa do bisavô. Entre retratos envelhecidos, ela encontra uma imagem em preto e branco de um jovem de olhar sério, vestindo uma farda. "Sou eu, é o vô Braguinha", responde o bisavô, o Sargento da Reserva Cézar Glauco dos Santos Braga, hoje com 90 anos. A curiosidade da garota logo se transforma em uma jornada pelas memórias do militar aposentado, culminando na descoberta de uma medalha militar e da história real por trás dela.
No filme, a Medalha do Pacificador com Palma é apresentada, algo concedido a militares por atos de bravura. A partir desse item, a história de Cézar toma força, partindo de 1965.
O homem havia liderado uma operação secreta que desfez um acampamento guerrilheiro às margens do Rio Paraguai. “O local servia como um campo de treinamento onde os paraguaios comunistas planejavam uma insurreição contra a ditadura de Alfredo Stroessner. O próprio Cézar foi responsável pela captura do tenente-coronel Lorenzo Abel Arrúa, dissidente do Exército Paraguaio e um dos principais articuladores da resistência armada ao regime stroessnerista”, descreve Renan.
Em relação às gravações, o diretor brinca que foi o set mais divertido que participou, isso porque tudo foi feito em família.
“Minha esposa, Mariana, além de escrever o roteiro comigo, fez a captação de som. Eu mesmo fiz a direção de fotografia e operei a câmera. E repetíamos muito os planos, acho que chegamos a fazer 12 tomadas em algumas cenas. Era um processo de encontrar a melhor forma de narrar através de tentativa e erro. Isso só é possível quando se tem muita confiança e quando se leva o trabalho como uma brincadeira, um passatempo – o que não quer dizer que não levemos com muita seriedade também”.
Ao mesmo tempo, narrar a história sobre a medalha não foi algo fácil. Aos olhos de Renan, são questões “caras à nossa identidade social”, uma vez que palavras como ditadura, comunismo, guerrilheiro e serviço secreto trazem sentimentos fortes sobre um passado com o qual não foi bem lidado.
“Eu sentia que o filme precisava de um ponto de vista infantil para poder ser contado. Como realizador, eu precisava voltar a ser criança para escutar essa mesma história do meu avô – nem que fosse só pela cadência de ouvi-lo narrar. E a Amarilis possui esse olhar ao mesmo tempo curioso e ingênuo que nós adultos fomos ensinados a reprimir”.
E, entre os pontos principais da produção, o diretor cita que a crise identitária é algo profundo e que pode gerar discussões partindo do filme. Mas, para além de tudo, pensar nas histórias dos mais velhos talvez seja o grande foco.
“Essa ideia de nos voltarmos para nossos anciões para escutá-los é algo que pode ser um remédio para essa nossa crise de identidade. São bibliotecas vivas que estão aqui do nosso lado. É quase como um manifesto, sabe? A gente precisa jogar conversa fora com nossos velhos nesse mundo cada vez mais acelerado e utilitarista. O ponto principal da produção é o meu avô: Cézar Glauco dos Santos Braga”
Com o curta produzido, o próximo passo é investir em um longa-metragem intitulado Operação Guerrilha, a ser filmado no Paraguai e no Brasil.
“Além de investigar com mais profundidade os acontecimentos de 1965, o filme vai reconstituir de forma cinematográfica os episódios que levaram à prisão dos guerrilheiros paraguaios”.
Lançamento do filme
Para quem quiser acompanhar a estreia do curta, o evento será aberto ao público nesta segunda-feira (24), às 18h, no MIS (Museu da Imagem e do Som). O espaço fica localizado na Avenida Fernando Corrêa da Costa, 559.
Além do filme de Renan, outras ações serão realizadas, uma vez que o lançamento integra o Pantanal Film Fest.
Acompanhe o Lado B no Instagram @ladobcgoficial, Facebook e Twitter. Tem pauta para sugerir? Mande nas redes sociais ou no Direto das Ruas através do WhatsApp (67) 99669-9563 (chame aqui).
Receba as principais notícias do Estado pelo Whats. Clique aqui para entrar na lista VIP do Campo Grande News.