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Meio Ambiente

Empresa é condenada a plantar 5,3 milhões de mudas por incêndio ocorrido em 2007

Maçarico usado em linha férrea seria a causa de fogo que consumiu 359,970 hectares, em Miranda

Por Silvia Frias | 23/10/2023 12:09
No processo, mapa mostra área da RPPN e, na parte mais escura, perímetro atingido no incêndio (Foto/Reprodução)
No processo, mapa mostra área da RPPN e, na parte mais escura, perímetro atingido no incêndio (Foto/Reprodução)

Decisão judicial determina que a Rumo Logística, companhia ferroviária que assumiu a ALL (América Latina Logística Malha Norte S/A), faça o plantio de 5.299.558 mudas de 1,50 m de altura na região da Bacia do Alto Paraguai em prazo de 5 anos. A medida é a penalidade imposta pela destruição de 359,970 hectares de área de RPPN (Reserva Particular do Patrimônio Natural), em Miranda, a 208 quilômetros de Campo Grande, em incêndio ocorrido há 16 anos.

A determinação judicial foi dada pela 1ª Vara de Miranda em março deste ano. Em abril, a assessoria jurídica da Rumo Logística entrou com embargo de declaração, em que questiona pontos da decisão que considerou obscuros. Em outubro, o juiz Alisson Kneip Duarte indeferiu o recurso, mantendo as obrigações listadas na sentença.

A RPPN fica a 10 km da área urbana, seguindo pela BR-262 e, paralelo à rodovia, é cortada pela estrada de ferro.

Segundo a denúncia do MPMS (Ministério Público de Mato Grosso do Sul), protocolada em 2008, o incêndio aconteceu no dia 6 de setembro de 2007, na RPPN Neivo Pires e também atingiu 160 hectares de pastagens nativas, na Fazenda Capão do Pires, em Miranda.

No círculo (alto do quadro) o local do início do incêndio, conforme perícia (Foto/Reprodução)
No círculo (alto do quadro) o local do início do incêndio, conforme perícia (Foto/Reprodução)

Perícia do Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) constatou que o incêndio foi causado pelo uso de maçarico de corte durante a manutenção da linha férrea. O equipamento lançou partículas incandescentes nas imediações, iniciando o fogo. A situação ainda se agravou por conta das condições climáticas, de calor e baixa umidade.

“O incêndio iniciou-se a nordeste da ferrovia, propagando-se contra o vento em direção a rodovia BR-262. As condições climáticas nos horários mencionados acima (...) corroboram as evidências de que as chamas foram impulsionadas para o outro lado da linha férrea onde encontrou combustíveis leves a pesados. Isso fez com que o incêndio se propagasse com velocidade, grande intensidade calórica e com alto poder destrutivo da vegetação (...)”.

Naquele período, o MPMS pediu, em caráter liminar, que a companhia construísse aceiros de, no mínimo, três metros de largura de cada lado, ao longo de toda linha férrea, sob pena de multa e que não use maçarico para o trabalho. No mérito, que a empresa fosse obrigada a recuperar os danos ambientais na área.

Em resposta à denúncia, a Rumo Logística alega que o incêndio não foi responsabilidade da empresa, por não ter sido causado pelo material utilizado na manutenção da ferrovia. Alegou que não há provas técnicas que comprovem a ligação entre a conduta da empresa e o fogo na região.

Além disso, relatórios do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) demonstram que havia diversos focos de incêndio na região de Miranda, em razão das temperaturas elevadas e a baixa umidade. A defesa anexou o testemunho de técnico, encarregado das manutenções, dizendo que atualmente não se usa geradores de faísca, como maçaricos, para o serviço na linha férrea. “(...) a tecnologia atual inclui técnicas de imediato resfriamento do local de manutenção, exatamente para evitar qualquer intercorrência como incêndios”.

Em decisão dada no dia 19 de setembro de 2008, a juíza Vânia de Paula Arantes atendeu os pedidos feitos em caráter liminar pelo MPMS, determinando a abertura de aceiros na Bacia do Alto Paraguai, incluindo Miranda, sob pena de multa de R$ 10 mil. Porém, indeferiu a substituição do maçarico por instrumento com disco poli-corte, já que que este também produziria grande quantidade de faísca e não resolveria a situação.

Em 2014, com a contestação da empresa, também foi realizada perícia judicial. Sem a materialidade do caso, 7 anos depois do ocorrido, a análise foi baseada em imagens de satélite, testemunhos e relatos de profissionais da área. “(...) os técnicos confirmaram, por meio de consulta a profissionais com anos de experiência no ramo, apresentando fotografias dos pedaços de trilhos cortados e mediante comparação com peças cortadas com disco poli-corte, que esses foram, de fato, cortados com auxílio de maçarico de corte”.

Em março de 2023, o juiz Alisson Knep Duarte julgou o mérito da ação. Se baseou nas perícias do Ibama e da Justiça sobre o uso do maçarico na manutenção da linha férrea e seus efeitos, além das condições climáticas, com alta temperatura e baixa umidade. Para isso, também usou a tabela de ventos para mostrar como a situação se agravou. “É certo que o juiz não está adstrito a prova técnica, contudo, é pouco razoável desprezar as conclusões periciais, quando não há qualquer outro elemento hábil a desqualificá-la”.

Passados 16 anos do incêndio, a área está em recomposição de forma natural. Porém, o juiz avaliou que mantém-se a responsabilidade da companhia férrea. “(...) não exime a requerida do seu dever de recuperar a área degradada no que ainda não foi recomposta. Segundo o magistrado, é preciso uma compensação ambiental, com objetivo de "minimizar os efeitos do passivo ambiental causado pelo dano e, ainda retornar à sociedade os serviços e funções ambientais suprimidos".

Pela decisão, a Rumo Logística será obrigada a fazer o replantio de 5.299.558 hectares de unidades de mudas de 1,50 metro de altura, com espécies nativas da região, com as mesmas características ecológica e na mesma bacia hidrográfica. A quantidade deve ser reposta em prazo de 5 anos, como forma de repor a biomassa perdida no incêndio. A multa em caso de descumprimento é de R$ 2 mil limitada a R$ 200 mil.

O pedido de indenização, porém, foi negado, já que a reparação do dano ambiental não implica em indenização pecuniária, se pode ser feita mediante recuperação de área degradada.

A reportagem do Campo Grande News entrou em contato com Rumo Logística. A informação é que a equipe jurídica está analisando o teor da decisão para adotar as medidas cabíveis.

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