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Devaneios: por que criamos paranoias com coisas que nunca vão acontecer

Por Cristiane Lang (*) | 05/01/2025 08:31

Você está em casa, tranquilo, e, de repente, sua mente começa a desenhar cenários improváveis: “E se eu perder meu emprego?”, “E se algo de ruim acontecer à minha família?”, “E se aquela decisão que tomei há anos arruinar tudo agora?”. Antes que perceba, você está preso em um labirinto mental, explorando possibilidades catastróficas que, na maioria das vezes, nunca se concretizam. Mas por que fazemos isso? Por que a mente insiste em criar paranoias com coisas que dificilmente irão acontecer?

A mente como um contador de histórias

O cérebro humano é uma máquina de narrativas. Ele busca constantemente dar sentido ao que vivemos, mesmo quando não há explicações claras. Quando enfrentamos incertezas, nossa mente tenta preencher as lacunas, muitas vezes inventando cenários negativos como uma forma de “preparação” para o pior.

Esse mecanismo evolutivo, que um dia nos protegeu de predadores e perigos reais, agora se volta contra nós em uma sociedade onde os perigos são mais abstratos. Em vez de fugir de animais selvagens, nos preocupamos com questões como fracasso, rejeição ou mudanças inesperadas.

O “e se?”: o combustível das paranoias

A pergunta “e se?” é a faísca inicial que alimenta nossos devaneios mais sombrios. Ela surge como uma forma de antecipar o que pode dar errado, mas, muitas vezes, se transforma em um ciclo incontrolável de pensamentos irracionais.

    •    “E se eu nunca for bom o suficiente?”

    •    “E se aquele pequeno erro que cometi tiver consequências desastrosas?”

Esses cenários, embora improváveis, parecem reais porque nosso cérebro não distingue facilmente o imaginado do vivido. Quanto mais pensamos nesses “e se?”, mais reais eles se tornam para nós.

Por que nossa mente exagera?

A tendência de criar paranoias está enraizada em fatores psicológicos e emocionais:

    1.    Medo do desconhecido: O incerto nos assusta. Quando não temos controle sobre algo, criamos histórias para nos preparar, mesmo que elas nunca se concretizem.

    2.    Ansiedade: Pessoas ansiosas têm uma predisposição maior a criar cenários negativos, pois estão constantemente em alerta para possíveis ameaças.

    3.    Experiências passadas: Traumas ou fracassos anteriores podem moldar nossos pensamentos. Se algo deu errado no passado, projetamos essa experiência no futuro, mesmo que a situação seja completamente diferente.

    4.    Busca de controle: Paradoxalmente, imaginar o pior nos dá uma falsa sensação de controle. É como se estivéssemos tentando nos antecipar ao problema antes mesmo de ele existir.

O custo das paranoias

Viver preso em devaneios negativos tem um preço alto. Além de consumir energia mental, essas paranoias podem nos paralisar. Passamos tanto tempo temendo o que poderia acontecer que deixamos de viver plenamente o que está acontecendo.

Além disso, nossas preocupações infundadas podem nos afastar de decisões importantes ou oportunidades, já que o medo de um cenário negativo (mesmo improvável) acaba nos impedindo de agir.

Como lidar com os devaneios paranoicos

Embora não seja possível controlar completamente os pensamentos, existem estratégias para reduzir seu impacto:

    1.    Reconheça o padrão: Quando perceber que está criando um cenário catastrófico, pare e pergunte a si mesmo: “Isso é realmente provável ou é apenas minha mente imaginando o pior?”

    2.    Questione a lógica: Liste evidências reais que sustentam sua preocupação. Muitas vezes, você perceberá que a paranoia não tem base sólida.

    3.    Traga-se para o presente: Práticas como meditação ou mindfulness ajudam a ancorar a mente no momento presente, reduzindo o poder dos pensamentos sobre o futuro.

    4.    Defina um limite para os “e se”: Reserve um tempo específico para explorar cenários e encontre soluções. Depois disso, comprometa-se a deixar a preocupação de lado.

    5.    Busque apoio: Compartilhar seus pensamentos com alguém de confiança ou um terapeuta pode ajudar a trazer perspectiva e aliviar o peso das paranoias.

O que realmente importa

No final das contas, as paranoias que criamos raramente se tornam realidade. Gastamos tanto tempo nos preocupando com possibilidades improváveis que deixamos de apreciar a simplicidade do agora. Os devaneios negativos fazem parte de nossa condição humana, mas não precisam nos definir.

Lembre-se: a maior parte das tempestades que imaginamos existe apenas dentro da nossa mente. Enquanto estamos ocupados criando histórias que nunca vão acontecer, a vida real segue — e merece nossa atenção. Encare os “e se” com curiosidade, mas não se perca neles. Afinal, a verdadeira magia da vida está em lidar com o que é real, não com o que poderia ser.

(*) Cristiane Lang é psicóloga clínica, especialista em Oncologia pelo Instituto de Ensino Albert Einstein de São Paulo.

 

Os artigos publicados com assinatura não traduzem necessariamente a opinião do portal. A publicação tem como propósito estimular o debate e provocar a reflexão sobre os problemas brasileiros.

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