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Pensamentos intrusivos: quando a mente não obedece e a saúde mental sofre

Por Cristiane Lang (*) | 15/08/2025 08:30

Você está lavando a louça, dirigindo, brincando com seus filhos ou prestes a dormir. De repente, surge um pensamento que não faz sentido, é estranho, desconfortável ou até perturbador. Ele aparece do nada, indesejado, e quanto mais você tenta afastá-lo, mais ele insiste em voltar. Isso é um pensamento intrusivo.

Pensamentos intrusivos são ideias, imagens ou impulsos que irrompem na mente de forma involuntária. Costumam ser rápidos, mas intensos, e geralmente causam angústia por serem contrários aos valores ou desejos da pessoa. O simples fato de pensar algo tão absurdo, agressivo ou assustador pode levar a um sofrimento imenso — mesmo que esses pensamentos não sejam reflexo de quem a pessoa realmente é.

O que são pensamentos intrusivos?

Pensamentos intrusivos são conteúdos mentais não desejados, muitas vezes repetitivos, que invadem a consciência sem aviso prévio. Eles podem se manifestar de diversas formas:

  • Imagens mentais violentas ou agressivas;
  • Medo de perder o controle e machucar alguém;
  • Dúvidas constantes sobre decisões simples;
  • Pensamentos sexuais inapropriados;
  • Ideias obsessivas sobre contaminação, limpeza ou simetria;
  • Medo de cometer erros irreversíveis ou de que algo ruim aconteça.

É importante dizer: ter pensamentos intrusivos não significa que a pessoa é perigosa, imoral ou má. Na grande maioria dos casos, eles são apenas ruídos mentais. O problema surge quando esses pensamentos ganham espaço e começam a interferir na vida da pessoa.

Como eles afetam a saúde mental?

Os pensamentos intrusivos afetam a saúde mental principalmente quando são recorrentes e acompanhados de culpa, vergonha e medo. Isso pode desencadear ou agravar quadros como:

Ansiedade generalizada

A mente passa a operar em estado de alerta constante, com a tentativa de controlar ou evitar pensamentos considerados perigosos. Esse esforço de controle é exaustivo e inútil — afinal, pensamentos não seguem regras. O resultado é um aumento significativo da ansiedade.

Transtorno obsessivo-compulsivo (TOC)

O TOC é uma das condições mais associadas a pensamentos intrusivos. A pessoa tem obsessões (pensamentos indesejados e repetitivos) seguidas de compulsões (rituais ou comportamentos que busca fazer para neutralizar ou aliviar a angústia gerada). O ciclo se repete, reforçando o sofrimento.

Depressão

Quando pensamentos intrusivos são negativos, autodepreciativos ou cruéis, a autoestima pode ser corroída pouco a pouco. Isso pode alimentar quadros depressivos, com sentimentos de inadequação, inutilidade e desespero.

Distúrbios do sono

A mente hiperestimulada e preocupada com o controle dos pensamentos tem dificuldade em desligar. Muitas pessoas relatam que os pensamentos intrusivos aumentam à noite, quando há menos distrações. Isso compromete o sono e, por consequência, a saúde mental como um todo.

Por que esses pensamentos surgem?

Todos os seres humanos têm pensamentos aleatórios. O cérebro está constantemente processando informações, buscando conexões e simulando cenários — mesmo sem nossa permissão consciente. Pensamentos intrusivos podem surgir por:

  • Estresse crônico;
  • Trauma psicológico;
  • Fadiga mental;
  • Quadros de ansiedade e depressão;
  • Necessidade de controle e perfeccionismo;
  • Condicionamentos cognitivos.

O problema não é o pensamento em si, mas a maneira como reagimos a ele. Quando damos atenção exagerada, tentamos neutralizá-lo ou evitá-lo a qualquer custo, acabamos fortalecendo sua presença.

Como lidar com pensamentos intrusivos?

Reconheça sem julgar: O primeiro passo é reconhecer que esses pensamentos existem — e que são comuns. O julgamento severo só alimenta o ciclo. Lembre-se: pensar algo não significa querer ou ser aquilo.

Não lute contra o pensamento: Quanto mais você tenta expulsar um pensamento, mais ele volta. É o chamado “efeito rebote”. A mente não lida bem com proibições. Em vez de lutar, aceite a presença do pensamento e observe-o com distância.

Pratique mindfulness: A atenção plena ajuda a criar espaço entre o pensamento e a reação. Em vez de embarcar no conteúdo do pensamento, você aprende a observá-lo como algo passageiro — como uma nuvem no céu.

Exposição e prevenção de resposta: É uma técnica usada no tratamento do TOC que envolve expor a pessoa aos pensamentos ou situações temidas sem permitir que ela execute rituais para se acalmar. Com o tempo, a ansiedade diminui.

Psicoterapia em geral: A psicoterapia, independentemente da abordagem, oferece um espaço seguro para explorar os pensamentos, entender suas raízes emocionais e desenvolver uma relação mais compassiva consigo mesmo.

Medicamentos, quando necessário: Em casos mais graves ou persistentes, o acompanhamento psiquiátrico pode ser necessário. Medicamentos ansiolíticos ou antidepressivos podem ajudar a reduzir a frequência e a intensidade dos pensamentos intrusivos.

Pensamentos intrusivos fazem parte da experiência humana. O que determina seu impacto é a forma como lidamos com eles. Quando aceitamos que a mente é caótica por natureza e aprendemos a não nos fundir com cada pensamento que surge, ganhamos liberdade.

Buscar ajuda não é sinal de fraqueza, mas de coragem. Cuidar da saúde mental significa cuidar da qualidade dos nossos dias — e isso começa por reconhecer que nem tudo que a mente produz merece ser levado tão a sério.

Se você sofre com pensamentos intrusivos, saiba: você não está sozinho, não está louco e há tratamento. Há um caminho possível entre o barulho da mente e o silêncio interior. E ele começa quando paramos de fugir dos pensamentos — e passamos a nos aproximar de nós mesmos com mais gentileza.

(*) Cristiane Lang, psicóloga clínica especializada em oncologia

 

Os artigos publicados com assinatura não traduzem necessariamente a opinião do portal. A publicação tem como propósito estimular o debate e provocar a reflexão sobre os problemas brasileiros.